Capítulo 11 - Vestiário

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Estava prestes a anoitecer quando o treino terminou, e esse foi com toda certeza do mundo um dos piores dias da minha vida.

Primeiro, o treinador aceitou que eu ficasse na arquibancada como reserva assistindo para entender e examinar como os garotos jogavam, até aí estava tudo bem, mas nada fica bem por muito tempo para mim.
Tive que jogar, e foram incontáveis as vezes em que eu tropecei nos meus próprios pés ou que pisei na bola sem querer. Henri não estava nem um pouco a fim de aliviar por hoje, fez questão de esbarrar comigo todas as vezes em que nos encontrávamos na quadra, mesmo sendo do mesmo time.
Não tinha como dar certo. Alguém que nunca jogou na vida ser praticamente enfiado em um treino para jogar com os garotos do time oficial do colégio, acho (tenho quase certeza) que o treinador quer ferrar com a minha vida.

Claramente não fiz muita coisa, só devo estar com uns dez hematomas por causa das vezes que um certo indivíduo esbarrou comigo. Um dos garotos que eu não conheço tentou até me ajudar no intervalo do primeiro jogo, mas o Henri ficou puto com ele. Quer dizer, eu não sei exatamente, ele começou a agir estranho, e o seu olhar também deixava claro. Ele deve achar que vou "contagiar" os seus amigos ou algo assim.

Entretanto, eu sobrevivi, mesmo ouvindo algumas piadas homofóbicas e alguns risos desnecessários. Mas o que eu ainda não tinha me preparado psicologicamente antes ainda estava por vir: o vestiário.

Eu insisti que iria para casa e tentei evitar a todo o custo, mas o treinador não aceitou as minhas desculpas. Disse que fazia parte da minha "tour" conhecer como o time funcionava antes de talvez entrar (o que eu acho bem difícil), logo depois descobri que ele foi embora.
No momento, permaneço escondido na última cabine de banho do vestiário. Com o chuveiro obviamente desligado, ainda de roupas, esperando todo mundo vazar para eu finalmente sair sem ser percebido. Eu não sei o que seria de mim.

-Cara, o que merda deu na cabeça do treinador? Ele tá ficando bem velho e maluco pra colocar aquele...-Ouço um dos garotos dizer, não conheço sua voz, então obviamente não o conheço. Eu já estava esperando ser o assunto daquelas fofocas constantes em meio a garotas que eles comeriam ou não e festas as quais iriam ou não, qualquer ofensa que for dita neste momento não me afetará.-...aquele carinha lá pra jogar no nosso treino. Não entendi porcaria de nada!

Ouço alguns deles concordarem e outros rirem.

-Tá faltando pouco para mudarem a cor do uniforme para rosa.-Outro diz. Me pergunto o que isso tem a ver com sexualidade e chego até a rir do quanto isso foi ridículo.-Acho que o treinador tá entrando para outro "time".

Mais risos. Agora eu quero sumir para não ser contagiado por tanta ignorância.
E então, finalmente percebo que o número de frases como "valeu, cara, até a próxima" aumentam a cada vez mais, isso deve significar despedida. Me alegro um pouco de certa forma, já devem ser umas sete horas e continuo trancado aqui. Durante todo esse tempo, não ouvi a voz de um certo perseguidor que me odeia, e isso é bom. Ele já deve ter ido embora.
O silêncio predominava quando finalmente levo a minha mão até o fecho da porta da cabine.

-E aí, Henri, quando vai rolar outra festa daquela?-Alguém diz. Merda! Ele ainda está aqui. Sinto um breve frio na barriga.

-Sei lá, cara.

A segunda pessoa deve estar indo embora, pois enquanto murmura algo sobre ter bebido pra caramba, sua voz parece cada vez mais distante. A única pessoa que eu não podia encontrar, provavelmente ainda está aqui e eu estou correndo sérios riscos de vida estando sozinho nesse vestiário enorme com alguém que claramente me odeia.
Controlo até a minha respiração para que ele não ouça. Quando finalmente ouço o barulho da porta do seu armário fechar, sinto um pouco de alívio. Mas como é a minha vida, algo que tinha dar errado.
Meu celular começa a tocar e vibrar. É o Seth, eu tinha combinado de falar com ele.

-Tá escondido porquê?-Ele diz, antes mesmo que eu pudesse recusar a ligação, e bem, agora meio que não adianta mais.-Pode sair. Não vou te bater por ter jogado mal... pelo menos não por isso.

Respiro fundo, ofegante, enquanto ouço os seus passos e penso em fazer um buraco na parede para escapar por não ter janela aqui dentro. O frio na barriga continua enquanto ele continua caminhando.

-Você não tá aqui por acaso. Veio para tentar ver algum pau, né? Talvez algum em específico...

Não respondo, é capaz que o meu coração escape pela boca se eu a abrir. A tensão aumenta quando vejo os seus pés por baixo da porta. Estou literalmente a alguns minutos de morrer.

-Responde, porra! Eu sei que você quer apanhar, me dá mais um motivo!-Ele deve ter socado a porta, pois o barulho quase me fez infartar. Chego a derrubar o celular, e para o meu azar este desliza ao cair e vai parar do outro lado devido a fenda em baixo da porta. Abaixo imediatamente para pegar, mas ele foi mais rápido.-Olha! O namoradinho está ligando, sabia?

Reviro os meus olhos quase automaticamente. Eu posso muito bem sentir medo e impaciência, que inclusive é tudo o que Henri me causa.

-Porra...-Sussurro.

-Ele sabe o que você veio fazer aqui?

Me recuso a responder mais uma vez, estando preocupado, ele pode atender a ligação e falar alguma besteira.

-Me devolve!-Finalmente me ocorre de deixar as palavras escaparem.

-Vem pegar.

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