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A viagem de volta foi tensa, Bolinho não falou comigo nenhuma vez e nem veio deitado no meu colo, parecia irritado com meu último pedido. Ester chorava de vez em quando, sentada com as pernas encolhidas no banco da carruagem, que era extremamente confortável. Pá ficou o tempo todo olhando para a janela, a expressão deprimida.

A culpa já não me corroía tanto pois sabia que John ficaria bem. Claro que a fazenda precisaria ser replantada e a casa reconstruída, mas isso era muito menos importante que a vida dele. Por que Riwty não destruiu apenas os bens materiais? Seria o suficiente para atrasar o casamento. Lembrei então de John chutando Bolinho e fiquei triste, aquela vingança tinha sido muito acima do nível da ofensa.

Foram dois dias insuportáveis, paramos apenas para dormir, o silêncio corroía o ambiente e as lágrimas de Ester tornavam tudo ainda mais pesado. Eu não sabia o que dizer, como consolar aqueles dois, pois deveria ser uma dor terrível, ainda mais sem saber se ele ficaria vivo.

Minha irmã não comia praticamente nada e eu estava enjoada, um mês de grávida, não restava nenhuma dúvida. Um mês que Riwty havia entrado em minha vida. Um dos meses mais intensos que já tinha passado.

Chegamos na noite do segundo dia, como era uma carruagem mais rápida e quase não tivemos pausas, eram 19 horas. Pá e Ester correram escada acima da taverna e eu fiquei para trás com o gato e o cocheiro. Como não tinha ninguém disposto a me ajudar por ali, eu e ele carregamos as malas para meu quarto no segundo andar, era muito peso para irmos até o terceiro.

Mariane e Elise vieram me encontrar pouco depois. Bolinho estava deitado na cama e chiou para minha irmã quando ela tentou acariciá-lo. Ela se afastou antes que levasse uma mordida.

-Oi.

-Oi, meninas.

-Sinto muito pela viagem ter sido interrompida.

-Isso é o de menos, Elise. Como ele está?

-Teve uma melhora surpreendente de ontem para hoje, está fora de perigo. Agora resta saber se as queimaduras vão afetar sua caminhada ou outras atividades.

-Esse médico daqui é impressionante, ele me salvou quando eu estava além da ajuda e agora fez o mesmo com John.

-Miau.
(É, foi o médico sim.)

Revirei os olhos para o comentário de Bolinho.

-Fico feliz que ele esteja fora de perigo. John está consciente?

-Nesse momento, não. Ele ainda sente dores então estamos dando sedativos quando fica insuportável._Falou Elise.

A culpa atingiu meu coração mais uma vez.

-Essas dores vão passar com o tempo?

-O doutor disse que sempre fica alguma coisa, principalmente se o sol atingir a região queimada, mas ele está animado com a recuperação de John.

Assenti com a cabeça. Riwty não faria mais nada por John, era visível por sua atitude, teria que torcer para que sua recuperação fosse a melhor possível.

-Posso vê-lo?

-Creio que sim, mas ele está dormindo._ Respondeu Mariane.

Era justamente por isso que eu queria ir agora, não ia irritar John com a minha presença.

-Tudo bem.

Saí do quarto e andei até o terceiro andar, fui até o quarto do meu futuro cunhado e vi Ester sentada em uma cadeira segurando sua mão e Pá abraçado a ela. O rosto dos dois apesar de triste mostrava alívio.

John tinha a perna e o braço esquerdos enfaixados e uma queimadura na bochecha.

-O médico disse que o que quase o matou foi a fumaça, as queimaduras não foram tão graves quanto poderiam ter sido. Por sorte o fogo não atingiu as articulações do braço e da perna, então ele acha que John vai conseguir andar normalmente._ Falou minha irmã sem tirar os olhos do noivo.

-Quanto tempo vai demorar a recuperação?

-Não sabemos, mas o doutor disse que se ele mantiver esse ritmo em três meses estará bem, cobrindo as partes queimadas para que não tomem sol.

Eu tinha ganhado três meses de adiamento em troca da saúde do meu cunhado, que tipo de pessoa isso me tornava?

AceitoOnde histórias criam vida. Descubra agora