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Encontramos Pá e Ester em um restaurante chique, ou pelo menos eu achava isso. Sentados ao lado de uma janela enorme, podíamos vê-los através do vidro.

Entramos e tudo lá dentro era ainda mais bonito, três lustres de cristal pendiam do teto, o do meio simplesmente enorme. As mesas eram de madeira talhada com diversos animais, além de serem pintadas em tons pastéis, minha família estava sentada em uma azul. Pequenos arranjos de flores ficavam no centro de cada mesa, em um lindo vasinho de cristal. Tudo parecia caro, nunca teria condições de comer ali.

-Isso aqui à noite fica lindo.

-Para mim já está lindo agora.

-Você tem razão, fica ainda mais lindo à noite, com todas as velas para iluminar.

O sorriso deslumbrado da Senhora Lint demonstrava que seu dinheiro não a tinha impedido de banalizar as coisas belas. A cada hora eu admirava mais aquela mulher fascinada por rosa.

-Olá.

-Oi, filha, Belinda.

Sentamos, eu ao lado da senhora Lint, e Pá à minha frente. Minha irmã não parecia incomodada com a distância, mas também não era muito grande.

Eles dois tomavam algum tipo de suco, provavelmente nos esperando para pedir a comida. O garçom chegou em um instante e perguntou nossos pedidos.

Olhei o cardápio e pedi uma espécie de peixe com legumes e queijo. Não comíamos muito pescado na vila porque não chegava fresco e o máximo era o de água doce. Ester pediu ostras e Pá camarão. Pelo visto todos queriam aproveitar a oportunidade de comer coisas do mar.  A senhora Lint foi a única que pediu massa.

-Como foram as compras?_ Perguntou Pá.

-Foram boas, tantas coisa bonitas. Obrigada pelo enxoval, Pá.

-Não é nada, vocês duas merecem. Além disso, são família para mim, apenas iremos oficializar.

Pude ver a emoção no olhar de Ester, ser reconhecida como parte da família de Pá sempre foi um desejo seu. Era um avanço do querida.

-É impressionante como a Ellie gosta de roupas coloridas, me vejo bastante nela nesse sentido. Apesar de que os tons que você gosta serem mais vibrantes.

Sorri encabulada. Quando a comida chegou ninguém falou mais nada, até porque estava deliciosa demais para que alguém prestasse atenção em outra coisa. Foi a melhor experiência culinária da minha vida e eu já considerava a cozinha da dona Gema espetacular.

Nosso passeio pela tarde foi tranquilo e divertido, passamos por uma praça em que casais dançavam ao som de músicos independentes, que deixavam seus chapéus ali para ganharem seus trocados. Por uma rua em que toda a parede era pintada com diversas imagens e passamos pela casa do conde, ou melhor, seu palácio. Era a estrutura mais incrível que eu já havia visto, com abóbodas de vidro, estátuas em tamanho natural espalhadas pela grama e uma linda fonte, as paredes eram pintadas de rosa e não havia muro, apenas uma grade branca, provavelmente para que todos pudessem apreciar a bela moradia do aristocrata. Eram muitos guardas uniformizados espalhados pelo gramado, só havia grama e algumas flores rasteiras, novamente nada de árvores. Cheguei a conclusão de que aquele povo tinha uma precaução exagerada, já que os fae poderiam fazer o que quisessem mesmo. Poderiam, não é?

Ao longo do dia vimos muitas mulheres e crianças de Právia, algumas sendo acompanhadas por homens locais, o que me pareceu estranho. Todas tinham um olhar triste ou resignado, mas não podia esperar outra coisa.

Chegamos na casa dos Lint no fim da tarde, estava exausta. Bolinho apareceu assim que coloquei os pés para dentro, então o peguei no colo. Não sabia onde se encontrou durante todo o dia, mas podia sentir que sua presença por perto. Isso era assustador.

-Hoje vi mais Pravianas acompanhadas de homens daqui._ falou a senhora Lint para o marido.

-São as viúvas, estão sendo muito assediadas desde o decreto do rei. Ele estipulou um dote bem grande para cada uma delas. Aliás as únicas cartas que chegam de Právia são as que avisam os nomes dos mortos. Essas mulheres vão para o mural da praça do conde uma vez por semana ler a lista e ver se alguém da sua família está ali.

-Então o rei está incentivando o casamento com viúvas pravianas.

-O problema é que isso está sendo feito com o dinheiro dos nossos impostos.

-Me pergunto o que ele quer com isso.

-Miau.
(O que ele quer é uma desculpa para anexar um território arrasado depois que a guerra acabar. Vai dizer que os países já estão unidos pelo casamento e que como este é um país mais rico, seria melhor que Právia fosse integrada. Típico. É por isso que a entrada dos homens foi proibida e por isso ele não mandou nenhum recurso para ajudar os pravianos. Claro que isso deve ter sido ideia do filho dele, o rei não tem muita condição de raciocínio atualmente.)

Arregalei os olhos para Bolinho, ele sabia de tudo. Eu me sentia uma parva perto dele, tinha até parado de prestar atenção na conversa dos outros humanos ao meu redor para escutar a explicação de Riwty.

Nesse momento o mordomo apareceu e entregou uma carta para Pá, que logo abriu. Seu rosto ficou cada vez mais pálido conforme ele lia, até que caiu sentado em uma das cadeiras da sala rosa.

Todos corremos até ele, sua testa suava e as mãos tremiam. Ester tomou a carta da mão dele, soltou uma exclamação estrangulada e começou a chorar. Foi minha vez de tomar o papel e nada teria me preparado para a notícia.

"Pai,
Houve um grande incêndio na fazenda do meu irmão. Ocorreu no meio da noite então nada foi percebido até que fosse tarde demais. Toda a casa foi queimada, a plantação e os animais também, só sobrou o terreno. Meu irmão sobreviveu, mas teve uma perna muito queimada e não sabemos se será necessário amputar, além disso seus pulmões estão muito fracos, por isso não está fora de perigo. Volte para casa assim que receber a notícia.
Pablo."

Olhei para o responsável por aquilo tudo, que olhava do chão com malícia visível.

AceitoOnde histórias criam vida. Descubra agora