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Beto estava pálido apoiado no balcão. Ia andar até ele, mas a tontura da viagem me prendeu no lugar. Bolinho se esfregou nas minhas pernas, ele tinha um olhar do gato que comeu um canário.

"Nunca vi um canário de penas vermelhas."

Revirei os olhos. Você nunca vai deixar isso pra lá? Foi sexo. Todo mundo faz sexo, é uma coisa normal. Vai ficar falando sobre isso por quanto tempo.?

O gato se afastou das minhas pernas e sua voz estava diferente em minha cabeça.

"Preciso te ensinar a usar essa comunicação."

Concordava com aquilo, não queria que ele soubesse todos os meus pensamentos.

-Vocês precisam tomar cuidado, aquele homem é assustador.

Riwty apareceu ao meu lado e Beto deu um pulo. Aquilo fez o fae sorrir.

-Assim que eu tiver uma oportunidade vou me livrar dele.

Tentei não parecer horrorizada, Beto não conseguiu. Riwty virou a cabeça e fechou a expressão.

-Preciso sair, vejo você depois.

Ele se transformou em um passarinho e voou para longe. O padeiro ficou visivelmente mais calmo.

O resto do dia foi tranquilo, sem nenhum sinal de Riwty. Então fui para casa com um pacote de tortinhas de amora que não podiam ficar mais tempi na padaria e seriam meu lanche da noite vom uma caneca de chocolate do Pá.

Todos estavam descobrindo sobre o fae. Se eu não tomasse cuidado não veria meu aniversário de 17 anos. A perspectiva de morrer era assustadora, principalmente amarrada no meio da Praça e tendo a cabeça arrancada para todos verem. Não consigo imaginar o trauma que seria para minhas irmãs. Toquei meu pescoço como para garantir que minha cabeça ainda estava no lugar.

A taverna estava quase vazia e Ester tocava uma música alegre no piano velho. Fazia muito tempo que não a ouvia tocar. Parei atrás do balcão e enchi uma caneca de cerveja para mim. Hoje era um bom dia para beber.

Fui até a cozinha e encontrei Pá cortando carne de porco.

-Oi, Pá.

-Oi, filha. Fiz empadão, quer? É a receita da sua mãe.

Balancei a cabeça e sentei em um dos bancos de madeira. Pá viu a caneca em minha mão e franziu o cenho, eu não tinha o costume de tomar cerveja.

Ele pegou um prato e colocou um bom pedaço de empadão que eu comi completamente focada. As vezes eu me esquecia de quão perigoso era manter um fae. Não podia me iludir completamente e esquecer quem eu era e qual era minha posição.

Depois de comer subi para o meu quarto e fui até meu baú em busca das minhas coisas de costura. Eu precisava manter minha mente focada em ter minha cabeça sobre o pescoço. Pelo menos até Riwty dar um jeito no pai de Felipe. Deveria ficar chocada com a perspectiva dele matar mais uma pessoa, mas com tudo o que Gregório já fez e o que o fae me contou que sua igreja fazia, não conseguia sentir simpatia pelo homem.

Finalmente achei o que procurava, uma fita vermelha. Amarrei em meu pescoço como uma gargantilha. Assim, toda a vez que passasse o dedo por ela me lembraria de ser cuidadosa.

Só esperava que no final não se tornasse uma piada de mau gosto. Podia imaginar o carrasco usando a fita para marcar onde o Machado deveria cair.

Engoli em seco e tentei afastar a cena da minha mente enquanto arrumava o baú e fechava a tampa. Quando me levantei Elise estava parada na porta. Seus olhos estavam tristes e desesperançados. Aquilo me assustou profundamente.

-Elise, o que foi? Entre.

A menina correu para os meus braços e chorou. Longos soluços que me deixaram em choque. Bolinho tinha pulado para o chão e fechou a porta com magia.

-Eu preciso de ajuda. Estou com medo.

-O que aconteceu?

-Eu sou uma transviada.

AceitoOnde histórias criam vida. Descubra agora