A confusão era certa, Pá estava passando mal, Ester não parava de chorar e eu simplesmente não sabia o que fazer. O senhor Lint deitou Pá no sofá e sua esposa trouxe água com açúcar para minha irmã.
Quinze minutos passaram e meu futuro sogro não melhorou, estávamos entrando em desespero. Sua boca ficou roxa e sua pele pálida, a respiração estava arfante.
Um médico apareceu na porta, não sabia quem tinha chamado. Ele examinou Pá e seu rosto ficou sombrio.
-É um mau súbito, não posso fazer nada. Só esperar que passe e torcer para que viva, mesmo assim pode ficar alguma sequela.
-Como não pode fazer nada? Você é um médico ou não?_ Ester gritava.
-Posso dar um sedativo para ele, mas isso não garante nada, seria só um paliativo, mas pelo menos não sentiria dor.
-Faça isso doutor._ Falou a senhora Lint apertando as mãos e com lágrimas nos olhos.
O médico abriu a maleta e retirou um vidrinho com um líquido esbranquiçado e uma seringa. Porém, enquanto ele enchia a ampola Pá soltou um grito.
Corremos para ele e o doutor colocou a mão sobre seu peito, o olhar de piedade me falou tudo o que eu precisava saber.
-O coração parou.
Peguei Bolinho no colo em meio à choradeira de Belinda e Ester além dos xingamentos do senhor Lint e sussurrei em sua orelha.
-Salve-o, eu ainda tenho meu pedido, salve-o e deixe que ele fique normal, sem sequelas.
-Miau.
(São dois pedidos aí, mas farei o segundo como um favor.)-Aceito._ Sussurrei com raiva.
O aperto no meu peito veio ao mesmo tempo que o gemido de Pá. Por algum motivo a raiva que eu sentia diminuiu um pouco. Não sentia mais aquele ódio profundo por Riwty, ele não tinha como prever o ataque de Pá. Olhei para o gato desconfiada, sentia que ele me manipulava de alguma forma.
Todos estavam ao redor de Pá, soltei Bolinho e fui até eles. O médico parecia confuso, Ester sorria, esquecida por um momento que seu noivo corria risco de vida. A senhora Lint estava sentada se abanando, emocionalmente cansada e seu marido tentava tirar minha irmã de cima do futuro sogro, dizendo que ele precisava de espaço.
Pá parecia completamente normal, um pouco cansado, talvez. Seu olhar ainda estava triste, o que era normal. Dessa vez as lágrimas caíram dos meus olhos, o alívio tomava conta de mim.
-Pá, você está bem.
-Precisamos ir para casa.
-Você não pode viajar hoje, seu coração parou de bater por algum tempo, não sabemos como seu corpo vai reagir._ Falou o médico.
-Não interessa, preciso ver meu filho, ele pode morrer.
-George, espere até amanhã de manhã. Só descanse essa noite aqui.
Pá tentou negar, mas começamos a falar ao mesmo tempo, tentando convencê-lo.
-Tudo bem, mas amanhã às 6 estaremos na carruagem alugada.
-Com certeza não, você levará a nossa e o nosso cocheiro. Assim teremos certeza de que chegará bem depois do seu mal estar._ Falou Hiroshi.
-Precisamos levá-lo para o quarto. Meu amor, você e o doutor conseguem carrega-lo escada acima?
-Eu não preciso disso, não sou um inválido.
-Fique quieto George, você já vai ser pesado o suficiente sem se debater._ Atalhou o senhor Lint.
Pá foi carregado pela escada sob protestos, mas não conseguiu evitar. Ele foi deitado em seu quarto, a lareira acesa, a cortina fechada e Eu quis ficar com ele pelas primeiras horas, depois seria Ester a enfermeira improvisada.
Todos fomos instruídos a evitar que ele se alterasse, caso começasse a se agitar daríamos uma bebida sedativa. O médico disse que era fundamental a calma para que seu coração se recuperasse. Eu precisei fazer uso do remédio, já que ele começou a chorar. Minha raiva voltou com isso, misturada com culpa. Se eu não tivesse aceitado o favor de Riwty nada disso teria acontecido, só ocorreu pelo meu egoísmo. Chorei calada enquanto Pá dormia, não sabia onde Bolinho estava nesse momento, não me interessava também.
Minha irmã veio trocar de turno comigo, seu rosto inchado mostrava que havia chorado. Eu a abracei, se ela soubesse me odiaria para sempre. Começava a entender o porquê das pessoas escolhidas pelos fae ficarem loucas.
Riwty estava deitado na minha cama, o fato de ele estar em sua forma fae com o risco de alguém entrar a qualquer momento me aterrorizou. Ele olhou para mim e sorriu, senti vontade de estapeá-lo e me socar depois.
-Por que fez isso?
-Fiz apenas o que queria.
-Queria adiar o casamento, não que quase matasse o noivo da minha irmã.
-Se ele tivesse morrido seria um bônus.
-Desgraçado, ele é o filho de Pá. Mesmo que eu não goste dele não posso querer mal a ele. Fora que minha irmã o ama.
-Ela será infeliz ao lado dele.
-Você não tem como saber.
-É obvio.
-Ela será feliz. Preciso que tire a vida dele do perigo.
-Não.
-Não pode me negar isso.
-Claro que posso, eu escolho os favores que farei e você já gastou seu pedido.
-Não interessa, você me deve isso por quase ter matado meu pai de criação.
-Eu o salvei.
-Se ele quase morreu foi por sua causa.
-A culpa que sinto emanar de você mostra que não está sendo totalmente sincera.
Comecei a chorar, me deixei cair no chão, desesperada. Meu coração estava dilacerado, se ele morresse eu nunca me perdoaria.
-Por favor, só o tire do perigo de vida, nada mais._ Falei entre os soluços.
-Tudo bem.
A voz de Riwty saiu áspera.
-Você aceita que eu salve a vida daquele inútil?
-Aceito.
Dessa vez a sensação de aperto tomou todo o meu ar e me fez dobrar o corpo. Não sei quanto da minha alma já havia perdido, pois parecia ser isso mesmo, mas com certeza era grande parte.
Consegui sentir Riwty sair do quarto, sentia conforme ele se afastava da casa e da cidade. Era como um membro sendo alongado e quanto mais longe ele ia, mais doloroso o estiramento.
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Aceito
FantasyOs fae são criaturas da floresta, lá eles vivem e predam. Porém, quando escolhem um humano a vida do mortal muda para sempre, pois ganhará todos os favores que quer do fundo do coração. Porém, a lenda também diz que esses favores têm um preço, a alm...