Choque

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Alicia

Outra noite mal dormida, povoada por sonhos confusos e angustiantes.
A situação recorrente em todos, que me aflige, é o momento em que a imagem de Lucca se desfaz...
Sei que a apreensão com o estado de saúde dele, tem monopolizado meus pensamentos e isso por si só, justifica os sonhos.
Mas sinto que, talvez, haja algo mais...

Com muito esforço, afasto os pensamentos aflitivos que me torturam e saio do banho.
Me pego orando mais uma vez, para que hoje seja o dia em que Lucca irá acordar e tudo o que os médicos tem dito, não passe de um engano.

Lentamente, me troco, enquanto lembranças de vários momentos felizes povoam minha mente.
Nós dois patinando e rindo a cada tombo que tomei... a forma como nossos corpos se encaixam perfeitamente quando dançamos...
Imagens do passado invadem minha mente, trazendo saudade e colocando um sorriso nostálgico em meu rosto, mesmo que apenas por um instante.

Sou trazida à realidade pelo toque insistente do celular. Ao reconher o som de Bon Jovi cantando Have Nice day, sinto meu coração falhar uma batida, pois sei que é o Fábio e, temo por más notícias.
Trêmula, mal consigo dizer alô...
- Allie, ele acordou! - seu tom era uma mistura de alegria, com outro sentimento que não consegui identificar.
- Ah, graças a Deus! Eu estou indo pra aí...- mal balbuciei essas palavras e caí num choro de alívio.
- Allie, se acalme. Ele está realizando alguns exames, então pode vir com calma, devagar.- a apreensão no tom dele me causou um arrepio- Provavelmente, esses exames vão demorar e...
- Fábio, o que está havendo?! O que você está me escondendo?!- contive o choro e questionei aflita.
- Não está acontecendo nada, Alicia! Não estou escondendo nada! Só estou explicando que o médico aproveitou para fazer novos exames, agora que ele está consciente e...
- Você não esconderia algo de mim, não é?!- mesmo notando certa irritação na voz dele, insisti.
- Claro que não esconderia nada de você! Pelo amor de Deus!- sua negativa incisiva aliviou minha desconfiança.
- Certo, eu acredito em você.- afirmei suavemente- Me desculpe, é que estou tão ansiosa, nervosa... Desculpe, Fá!
- Ei baixinha, está tudo bem. Vou desligar, porque preciso ligar para o Robert, Sam e a Jane e, dar a boa notícia. Venha com cuidado, ok?
- Ok. Até daqui a pouco... Ah, e Fábio, baixinha é sua avó!

Desliguei ouvindo a gargalhada dele e rindo também, depois de tantos dias.

Mais que depressa, terminei de me arrumar e entrei em contato com a Universidade, avisando que não irei trabalhar.
Deixei um bilhete para minha avó avisando sobre a novidade, já que para variar o celular dela estava desligado. Quanto a meu avô, preferi não comentar nada.

Durante o percurso até o hospital, meu coração pareceu que a qualquer instante poderia pular do meu peito, tão acelerado estava.
Nunca o trajeto me pareceu tão longo...

Finalmente no hospital, me dirigi o mais rápido que pude ao andar em que ele estava internado. Nem preciso dizer, que meu coração estava acelerado e eu tremia como folha ao vento.
Ansiedade me define nesse momento.

Meus sogros e Sam conversavam à um canto da sala de espera, me aproximei sorrindo ao reconhecer a alegria estampada nos semblantes deles.
- Allie, ele voltou para nós!- a primeira a perceber minha presença e demonstrar sua alegria foi dona Marina.
Com as lágrimas transbordando, a abracei em silêncio e logo meu sogro e Sam se juntaram ao abraço repleto de alívio e alegria.

- Eu posso vê- lo?- disse assim que nos separamos.
- Ele ainda está realizando a ressonância, a enfermeira acabou de nos informar.- respondeu o pai dele- Mas ela disse que em meia hora no máximo, ele estará de volta.

Assenti silenciosamente, me acomodando ao lado de Sam em um dos sofás da sala de espera.
Meus sogros permaneceram em pé e abraçados, conversando baixinho.
Admirei mais uma vez o carinho e a cumplicidade que tinham. E mais uma vez, fui tomada por recordações dos nossos momentos e desejei ardentemente, que eu e Lucca, também pudéssemos ter esse companheirismo.

- Allie, como você está?- a voz terna e preocupada de Sam, me fez voltar à realidade.
- Bem... ansiosa!- respondi o encarando e tentando sorrir.
Eu que não sou de chorar, não tenho me reconhecido nessa pessoa totalmente emotiva.
- Ah, todos nós estamos ansiosos, nervosos, preocupados. Inevitável, não é?- ele respondeu sorrindo e segurando minha mão num gesto carinhoso.
Imediatamente, uma sensação de paz me invadiu.
Sam tem esse dom, de ser calmaria em meio às tempestades.

- É, inevitável.- concordei, finalmente conseguindo sorrir.
- Porém, precisamos nos controlar por nós e por Lucca. Ele precisa saber que estamos com ele, não importa o que venha a acontecer.- o olhar firme dele me tranquilizou.
- Como sempre, você tem razão Sam. Mas e você, como está? Mal nos falamos durante esses dias.
- Estou bem, tentando me manter forte e equilibrado. Retomei o trabalho e tenho tentado me aproximar do cabeça-dura do Robert, mas está difícil.- respondeu calmo.
- Ah, eu queria ter essa sua serenidade... Mas eu tento confiar que o melhor vai acontecer e entregar nas mãos de Deus, porém nesse processo, acabo surtando.

Sam não se contém e ri gostoso.
- Allie, você é demais!
- Sou, totalmente doida.- rimos juntos com a minha afirmação- E quanto ao Robert, a Jane tem estado direto com ele e me disse que está tentando não deixar que ele se afogue de vez no sentimento de culpa. Mas...
- Ele é teimoso como uma mula.
- Sim. Contudo, agora que o Lucca acordou, ele tem mais uma razão para sair desse limbo.
- Verdade...
- Allie, você pode entrar.- meu sogro interrompeu Sam.
- Ah, obrigada.- eu tinha me distraído conversando com o Sam, que nem me dei conta do tempo passando.

De imediato, me coloquei em pé e senti o coração disparar novamente.
Sam me incentivou com um sorriso e sem mais hesitar, praticamente corri para o quarto dele.

Entrei e fiquei observando-o por alguns instantes. As pernas imobilizadas, o rosto ferido e ainda assim, tão lindo.
Me aproximei da cama e como se pressentisse minha presença, ele abriu os olhos.
Encarei aquela imensidão azul e me perdi de amor.

Encarei aquela imensidão azul e me perdi de amor

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- Oi, meu amor...- falei baixinho sentindo o choro se avolumar no meu peito.
- Oi, princesa...
- Que susto você nos deu.- continuei sem saber como agir. Com medo de abraçar e acabar por machucá-lo ainda mais, verdadeiramente desconfortável.
- É... Eu sinto muito por isso.- disse sorrindo levemente- Mas o castigo está sendo duro.
- Lucca...
- Eu sei que a lataria está bem danificada, mas não mereço nem mesmo um abraço?- me surpreendi com seu jeito bem humorado mesmo naquela situação.
- Seu bobo!
E a esperança de que tudo ficaria bem me tomou por completo.

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