DANIEL
Entrei no carro pensando sobre o que a Ángel queria dessa vez e também no tamanho do risco que eu estava correndo com toda aquela aproximação. Tinha que admitir que já não via como sem fundamento a apreensão da Amanda.
O carro que ela mandou para me buscar era preto com vidros fumê, o mais discreto possível. Nos bancos da frente, dois seguranças da Ángel estavam alojados. A única vez que falaram comigo foi para me mandarem colocar o cinto e me acomodar no banco traseiro.
Cerca de vinte minutos depois que saímos do hotel, paramos em uma estrada de barro.
— Pode descer — disse um dos seguranças.
Saí do carro e a Ángel me esperava em pé ao lado de uma moto.
Pelo visto ela tinha outro momento planejado para nós dois. O que me levava a pensar que precisava tirar uma vantagem desse encontro e colocar a Ángel na cadeia o quanto antes enquanto meus objetivos continuavam sólidos.
Aproximei-me de onde ela estava e a nossa interação que, em alguns momentos me deixava curioso e excitado, e em outros me fazia odiá-la, deixou-me perdido e confuso, fazendo com que me irritasse profundamente. Por isso foquei em me concentrar em subir na moto e segui-la, carregando no íntimo o forte desejo de encontrar algo que a levasse para a cadeia.
Mas aquela uma hora na moto, aproveitando da liberdade que o veículo permitia e vendo o cenário que se apresentava a cada quilômetro, diminuiu a intensidade da minha raiva. Tenho que admitir que, observar a Ángel tirando o capacete e descendo da moto, completando com a informação que ela estava ali só para mim, era admirar a representação do pecado.
— Bem-vindo a Lores — disse, aproximando-se quando paramos em frente a uma casa pequena de madeira extremamente simpática, localizada dentro de uma propriedade construída no isolamento da comunidade local.
— Lores? É essa casa? — perguntei, fingindo-me de idiota desinformado sobre a região.
Sabia do pequeno vilarejo, porém não fazia ideia que a Ángel tivesse uma casa no local. As pesquisas feitas pelas equipes locais estavam repletas de falhas.
— Lores é o vilarejo seguindo a trilha, essa é a minha casa — disse, apontando.
— Entendi — respondi, descendo da moto.
A um sinal da Ángel, os seguranças foram embora, pegando a trilha que ela havia falado, logo depois, uma senhora apareceu à porta da casa com um sorriso enorme para Ángel.
— Ángel!
— Benita! Que saudade! — disse, aproximando-se e a abraçando.
Olhei a cena, perguntando-me como uma mulher doce e gentil pode ter tantos crimes em suas costas.
— Também estava. Tudo está do jeitinho que gosta. Estarei na minha casa se precisar de alguma coisa e o Antonio foi pescar para preparar os seus peixes especiais.
— Hum! Já posso sentir o gosto na boca — disse e virou-se, me olhando: — Benita, esse é o Daniel, passará o fim de semana aqui comigo.
— Seja bem-vindo — disse, sorrindo com simpatia.
— Gracias — respondi.
E da mesma maneira que surgiu, a velha senhora nos deixou sozinhos. Ángel entrou na casa e, como o submisso no qual ela estava me transformando, eu a segui até o seu interior.
— Não tem medo? — perguntei, assim que a encontrei perto de uma mesa, mexendo em uma jarra de suco.
Com os copos nas mãos, aproximou-se e entregou um deles.
— Daniel, eu morri no dia que decidi ficar e assumir o cartel — respirou fundo e, olhando para mim de forma serena, continuou: — faço coisas que nunca sonhei fazer em prol de pessoas que precisam ser protegidas. Creio que, quando arrisco meu pescoço transando sem camisinha, como fizemos, ou estando nessa casa sem equipe de segurança, estou buscando a minha liberdade. Arriscando o meu pescoço, estou deixando a minha rebeldia falar.
— Não seria um sinal de depressão, de pouco valor à vida? — disse, observando-a.
— Rebeldia é um nome bem mais bonito que depressão, não acha? — comentou, piscando um olho. — Além do quê, é uma forma de disfarçar e evitar que os meus amigos se preocupem — completou de forma irônica.
— Não sei, acho que deveria se proteger também. Mesmo tendo assumido o cartel, ainda está viva e com muito o que aproveitar — disse.
Ela sorriu, aproximou-se e colocou a mão no meu peito, um gesto doce, porém ao mesmo tempo dominador, pois deixava claro que encerrava a discussão.
— Encerramos aqui esse assunto, afinal não o trouxe aqui para que banque o analista — disse e girou o corpo, seguindo pelo corredor, com toda certeza, na direção ao quarto.
Ouvi a resposta que me deu e não me zanguei, pelo contrário, fiquei preocupado com ela, ao mesmo tempo em que me preocupei também comigo, pois, desenvolver empatia pela Ángel, complicava a minha postura no cumprimento da missão.
Olhei para o caminho que ela tinha seguido e decidi ir atrás, pensando que a minha missão precisava ser cumprida, então a empatia tinha que ser colocada de lado e o foco mantido na pessoa que a Ángel representava, uma traficante e assassina com uma longa ficha no FBI e Interpol.
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Ángel
ChickLitA rebeldia e a liberdade de Carina eram os seus guias na vida, até que um dia todos os limites foram ultrapassados e se viu jogada em um mundo que para sobreviver teria que dominá-lo. Assim nasceu a Ángel, líder de um dos cartéis mais violentos da C...