Capítulo 45

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Continuação...


Antes

2002

- VAI SE FODER, RICHARD! QUE INFERNO!!

- JÁ MANDEI VOCÊ NÃO FAZER ISSO!

- EU FAÇO O QUE EU QUISER! VOCÊ SEMPRE SAI E FAZ O QUE QUER, E EU NÃO TENHO DIREITO DE FAZER O MESMO?!

- EU VOU TE QUEBRAR ATÉ VOCÊ APRENDER QUEM É QUE MANDA AQUI!

- SE VOCÊ FIZER QUALQUER COISA COMIGO, EU CHAMO A POLÍCIA!

- CHAMA! EU MATO VOCÊ E ELES!

- VOCÊ SÓ AMEAÇA! MAS TODO MUNDO SABE QUE VOCÊ É UM COVARDE! ATE OS SEUS AMIGOS SABEM DISSO!

- REPETE ISSO QUE VOCÊ DISSE!

- VOCÊ É UM COVARDE, RICHARD!

Ouço vários barulhos, um dele parecia um tapa, mas eu não tinha certeza.

- SEU DESGRAÇADO! OLHA O QHE VOCÊ FEZ! – A voz da minha mãe parecia estranha, como se ela estivesse chorando enquanto gritava.

- DA PRÓXIMA EU VOU FAZER PIOR!

Por mais que eu apertasse minhas mãos contra os meus ouvidos, eu não conseguia abafar os sons dos gritos dos meus pais brigando de jeito nenhum. Todo dia era uma briga diferente, mas a única coisa que eu não entendia era porque eles continuavam juntos, e pior ainda, eles continuavam a dormir juntos também. Eu acho que vou desistir de entender isso, é confuso demais para mim.

Ouço a porta de casa bater e olho pela janela, vendo minha mãe sair de casa, me largando sozinha com meu pai de novo como sempre. Eu estaria segura se continuasse no meu quarto, talvez se eu ficasse bem quietinha ele nem iria lembrar que eu estava aqui. Mas por mais que eu pensasse dessa maneira, ele sempre voltava sua frustração para mim quando minha mãe saia. E hoje não foi diferente.

- LYANNA!!! – Ouço seu grito furioso vindo do primeiro andar.

- OI?! – Respondo apreensiva.

- VEM AQUI, AGORA!

Desço pela escada lentamente já esperando tomar xingamentos gratuitos do meu pai, porque minha mãe sempre saia quando ele ainda tinha muita raiva guardada. Eu paro no pé da escada e o vejo sentado na sua poltrona de costas para mim, pude notar que ele estava bebendo.

- Oi. – Falo com medo.

- Mandei você vir aqui.

Caminho até ele e olho para os meus pés, mesmo depois desses anos eu ainda não conseguia olhar em seu rosto direito.

- Pega outra cerveja para o seu pai.

Eu caminho até a cozinha e abro a geladeira, pegando outra garrafa de cerveja para ele e voltando ate a sala. Entrego em sua mão, e ele não diz nada, parecia continuar prestando atenção na TV. Caminho lentamente para tentar sair dali e voltar para o meu quarto sem que ele notasse, mas ele segura no meu braço, me puxando de volta para ficar na frente dele.

- Porque você está de vestido? – Ele volta sua atenção a mim.

- É que está calor...

- Hum. – Ele vira a garrafa na boca, sentia que estava me olhando de cima abaixo. – Se está com calor, porque não tira?

- Tirar o que?

- O seu vestido.

- Não... – Respondo sem entender o que o meu pai queria dizer com isso.

- Pode tirar, não tem problema.

- Mas eu não quero...

- Eu estou mandando você tirar. Eu sou o seu pai, e você faz o que eu mandar. Anda, tira o vestido!

Meu coração acelera, estava assustada, mas movo minhas mãos até as alças do meu vestido e as puxo para o lado, deixando que o vestido caísse aos meus pés. Eu só conseguia olhar para baixo, sinto um nó se formar em minha garganta e lágrimas escorrerem pelos meus olhos. Eu tinha dez ano, mas aquela situação era embaraçosa demais, nunca havia passado por algo assim, não sabia como reagir.

- Se sente melhor, não se sente? – Meu pai fala comigo, mas eu não respondo. - NÃO SE SENTE?! – Ele grita.

- Sim! – Respondo.

- Eu te disse. – Ele pega em meu braço novamente e me puxa para mais perto dele. – Você é muito linda. Queria que a sua mãe fosse igual a você, você sempre faz o que eu mando, não é teimosa que nem ela. Se eu não fosse seu pai, me casaria com você.

Alguém me tira daqui, por favor! Sinto o desespero tomar conta do meu corpo. Meu pai me solta e me empurra para o lado, e eu aproveito para subir correndo de volta para o meu quarto. Assim que passo pela porta sinto falta de ar e levo minha mão ao meu peito, sinto meu coração disparado como se fosse sair pela boca. Sentia uma necessidade gigantesca de fugir, fugir pra qualquer lugar bem longe daqui. Caio de joelhos no chão e espremo meus olhos segurando minha cabeça com as duas mãos, enquanto sentia aquela sensação de desespero tomar o meu corpo.

Depois de alguns minutos, o que pra mim pareceram uma eternidade, aquela sensação horrível e agoniante passa. Não compreendia o que havia acabado de acontecer comigo, eu nunca tinha tido isso na vida, só sei que foi horrível e eu não quero ter essa sensação de novo nunca mais. Como também não quero que meu pai me peça para me ver nua novamente. Nunca senti tanta vergonha e medo ao mesmo tempo, achei que ele faria algo ruim comigo. O que eu fiz para merecer isso?

Abraço o meu corpo com meus próprios braços, como se eu mesma me acolhesse enquanto chorava desesperadamente. Era só o que eu estava precisando, de um abraço em que eu pudesse me sentir completamente segura. Achei que poderia ter isso com minha mãe, mas eu estava enganada, com meu pai então, estava fora de cogitação. Eu estava sozinha, no meio dessa merda que as pessoas chamam de família.

Quando minha mãe volta para casa ela vai até o meu quarto, não aguentava me ver quieta na minha. Ela me olha deitada na cama debaixo da coberta e vem até mim.

- Lyanna?

- Oi?

- O seu pai foi trabalhar, e eu vou ter que sair. Você acha que pode cuidar de si mesma?

- Aham.

- Que bom. Ele não tem que saber que te deixei sozinha, então cala a boca.

- Tá. – Saio de debaixo da coberta. – Mãe?

Vejo ela fechar a porta e ir embora, não sei se ela não me ouviu chama-la ou apenas me ignorou. Ela nem estranhou o meu comportamento, nem perguntou o que aconteceu, nem se quer quis saber o que eu estava sentindo. Eu suspiro, volto para debaixo da coberta, sentindo lágrimas escorrerem de meus olhos e molharem meu travesseiro. Porque minha mãe não se importa comigo? Porque ninguém faz nada? Porque ninguém me diz o que está acontecendo? Eu só quero que alguém me dê um motivo! Um maldito motivo que explique porque essas coisas acontecem comigo!

Sinto um calor crescer em meu peito, minha mandíbula se trava e eu aperto minhas unhas em meu braço. A minha angústia estava se transformando em outra coisa, era raiva, muita raiva e frustração. Eu podia estraçalhar alguma coisa com as mãos que provavelmente me sentiria bem melhor. Isso que está acontecendo não pode ser minha culpa! Eu não fiz nada a ninguém! Então porque eu tenho que passar por isso?! Porque sou eu que tenho que sentir essas coisas?! Porque é comigo e não com outra pessoa?! O que foi que eu fiz para esse mundo me tratar dessa forma??!!


Continua...

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