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– Daehan pediu para que me entregassem. Acho que ele já sabia que algo aconteceria com ele... – engoliu em seco. – Não que seria assassinado, mas que não tinha muito mais tempo sobrando.

– Você sabia que ele estava doente? – Hames questionou.

– Não, apenas a Rose e alguns médicos. Você também não sabia?

Hames negou com a cabeça.

– Eu percebi que algo estava estranho, que o Príncipe parecia cansado demais em alguns momentos, mas nunca pensei que fosse algo tão sério. – Hames parecia verdadeiramente triste, o que era de se esperar, ele conhecia o Daehan há anos. – Ele era tão jovem...

– Você agora entende o porquê de eu estar fazendo tudo isso? – Thomas perguntou. – O Dae sabia. De alguma forma. Sabia que a Rose precisaria de mim, que ela iria me afastar, e que ela poderia fazer algo de que se arrependesse. Você conhecia o Daehan. Conhecia até melhor do que eu. Sabe que ele era uma boa pessoa, sabe que ele era tudo para a Rose. Eu entendo o motivo dessa guerra, e, sendo sincero, eu no fundo espero que a Rose se vingue do Joseph e do desgraçado do Robert, mas você é do exército, você mais do que ninguém sabe o que acontece. Isso não vai ser uma disputa em um campo de batalha. A Rose estará com um exército de dez mil homens invadindo um reino, uma cidade. Isso vai ser um massacre, Hames. Quantas pessoas precisam morrer?

– Você acha que consegue impedir uma guerra?

– Não. E não quero impedir. Não estou tentando impedir a Rose de atacar, Hames, eu estou apenas tentando impedir ela de se perder. De perder a parte boa que ainda existe nela. O Daehan sempre acreditou nisso. “Ela não é uma má pessoa”, ele escreveu, e eu acredito totalmente nisso. Não sei o que vai acontecer quando a Rose invadir Oris, nem sei o que vai acontecer quando ela matar o Joseph, mas a única coisa que eu tenho certeza, é que eu tenho que estar lá. Algo em mim diz isso. Um instinto, sabe? Talvez você não acredite, ou pense que eu sou louco, mas assim que eu cheguei no Castelo, nas comemorações do aniversário de reinado, aquela vidente, a Noreen, me disse que eu tinha um papel importante para cumprir. Naquele momento eu pensei que era ela maluca, ou uma vigarista querendo apenas arrancar dinheiro dos idiotas, mas agora eu penso que era sobre isso que ela estava falando.

– Você não pode salvar um reino, Thomas. – Hames falou, empático. – Está se enganando ao pensar que vai conseguir. Isso tudo é muito maior do que você ou eu.

– Eu sei, mas talvez eu consiga salva-la. – disse Thomas. – A Rose foi empurrada para um lugar de escuridão e sofrimento. Um lugar para onde ela não queria ir. E ela não teve outra alternativa a não ser transformar isso em ódio, rancor, vingança. E eu tenho medo de perdê-la. E de que ela perca a si mesma. Acredito que se eu conseguir salvar a Rose, eu estarei salvando milhares de pessoas. De alguma forma.

Cuide dela, Thomas, não a deixe fazer algo de que se arrependa depois, ela já carrega culpa demais.

– Por que você não entregou a carta para ela? – Hames perguntou, indicando o outro envelope.

– Ela não quis aceitar. – explicou Thomas. – Mas ela precisa ler. Acredito que existe algo nessa carta que vá reconforta-la de alguma forma. Nada no mundo vai conseguir tirar a dor de perder o irmão, isso todos nós sabemos, mas acho que o Daehan escreveu algo que possa ajudar. Ele queria que a carta fosse entregue à ela. Ele queria que eu fosse a pessoa a entregar. E queria que ela lesse. Eu tenho que fazê-la ler. Por isso a trouxe comigo, eu tinha planos de que, quando conseguisse acompanhar a tropa, entregaria a carta. Eu até mesmo a leria em voz alta, caso a Rose se negasse a aceitar, mas eu garantiria que ela soubesse do que se tratava. Eu sei que é triste, é desolador, mas, por mais triste que tudo isso posso aparecer, ter essa despedida do Daehan para mim, me reconfortou, entende? Pode não fazer muito sentido, mas eu sinto como se fosse uma parte dele, aqui. – Thomas balançou o envelope em sua mão. – Uma parte que eu vou manter comigo até o dia em que eu morrer. São as últimas palavras de um amigo incrível e especial. Ele poderia escrever essa carta para qualquer outra pessoa no mundo, porque ele conhecia milhares, mas ele escreveu para mim e por mais egoísta que isso posso soar, faz eu me sentir especial, porque ele escolheu se despedir de mim. Queria que tivesse sido de outra forma. Queria ter podido abraça-lo uma última vez e dito adeus. Queria ter tomado uma última garrafa de bebida e passado uma última noite conversando com ele, mas infelizmente eu não tive a chance. E a Rose não teve a chance. Tudo o que ela teve foi poucos minutos de seu irmão sangrando até a morte em seus braços, e a imagem dele morto sobre uma mesa de pedra fria. Então Hames, eu imploro para que você me perdoe por tudo o que te fiz, e para que você entenda os meus motivos. Eu fiz isso pelo Daehan, por mim... Pela Rose. Ela está mais quebrada do que deixa transparecer, mas vai chegar um momento em que ela não vai conseguir segurar. Eu não quero que ela esteja sozinha nesse momento. O Daehan não queria que ela estivesse.

Hames andou lentamente até a outra cama que havia naquele aposentos, e sentou-se em silêncio. Com certeza estava processando todas as informações que acabara de receber. Ele, assim como o Thomas e como todos no reino, não sabia que o Daehan estava doente e descobrir assim era, de fato, chocante.
Thomas deu todo o tempo que Hames precisasse. Permaneceu em silêncio, aguardando para ouvir o que o soldado teria para dizer.

– Eu sei o que você está me pedindo. – o soldado falou, depois de longos minutos em silêncio. – E eu entendo, de verdade, mas, Thomas, não é tão fácil assim.

Thomas suspirou desapontado e também triste.

– Eu entendo, Hames. Te pedir para ignorar uma ordem assim. Pedir para você me deixar ir até a Rose, eu sei, é algo grande e sério. Você estará se arriscando também. Arriscando a confiança que a Rose deposita em você. – Thomas o encarou, olhando no fundo dos olhos castanhos de Hames, esperando que assim ele pudesse perceber toda a sinceridade em suas palavras. – Você uma vez me disse que morrer por Ennord e pela Rose não era um sacrifício, que um soldado tem que estar preparado para morrer, e eu posso não ser um soldado, mas eu me sinto dessa mesma forma. Eu estou pronto para ir até Oris, para a guerra. Para encontrar com a Rose, entrega-la aquela carta e fazê-la saber o que o príncipe escrevera para ela antes de morrer. Para realizar o último pedido do Daehan. E se eu morrer tentando, ou se a própria Rose me matar por desobedecer uma ordem dela, então por mim tudo bem. Mas eu preciso da sua ajuda...

– Eu não consigo decidir isso agora. – Hames falou, se levantando da cama e seguindo na direção da porta. – Pensei que não importaria o que você me dissesse, eu ainda permaneceria com as mesmas decisões e pensamentos de quando eu acordei do lado de fora daquele bar, mas agora, eu não sei o que fazer. Preciso de um tempo para pensar. – falou por fim e saiu, deixando Thomas sozinho no quarto.

Seguiu para a cozinha. Como a chuva continuava caindo forte ele não poderia sair para espairecer, que era o seu desejo naquele momento. Encontrou Josett cortando algumas verduras e legumes sobre uma das mesas que havia no amplo cômodo, não havia mais ninguém ali.

A Rainha de Ennord: O Confronto dos Grandes ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora