Capítulo 30

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Minha mãe me segue, ela deita ao meu lado enquanto acaricia meu cabelo e faz algumas perguntas que respondo com balançares de cabeças ou erguendo e revirando os olhos

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Minha mãe me segue, ela deita ao meu lado enquanto acaricia meu cabelo e faz algumas perguntas que respondo com balançares de cabeças ou erguendo e revirando os olhos. Ela nota que custo a engolir minha própria saliva e a todo segundo que me empenho em responde-la, consegue capitar meus semblantes dolorosos e por esta razão, ela desiste de tentar entender o que aconteceu durante os poucos minutos que estava fora.

Pietro deita ao lado da minha mãe e todos ficamos aqui, deitados, conformados ao ato de respirar e pensar. Cada um inundado com seus próprios pensamentos corriqueiros, mas ao contrário deles, os meus não se silenciaram, o que era para ser uma noite de sono, transformou-se em mais uma noite sem sono. Eu vi o barulho dos carros diminuírem, o céu negro ser preenchidos por nuvens cinzas que mais a tarde trouxeram chuva, eu vi os pingos finos engrossarem, a janela embaçar e em todas as vezes que fechei os olhos para o mundo, encontrei-me perdida, revivendo a mesma cena, sentido a mesma sensação da falta de ar, dos meus ossos quererem ceder, da minha pele queimar e dos meus pensamentos gritarem para eu agir, me defender, mas ao contrário da realidade, eu sou uma estátua que recebe dor por mãos que englobam minha carne e que me mata sem dor e sem piedade. Não conseguia mais fechar os olhos e viver a atrocidade da realidade retorcida, então optei por mantê-los alertas.

Ouço o barulho do fluxo de carros aumentarem, o céu negro se tornar cinza, a chuva afinar e o sol dar inícios de sua presença, não preciso nem ao menos pegar no celular para saber que já deve ser seis e meia. O frio está disperso pelo ar, mesmo com as janelas fechadas e meu corpo agasalhado, o frio consegue me atingir e não sou capaz de me mexer para puxar a coberta, pois não quero acordar ao Pietro que ronca do outro lado da cama ou minha mãe que está com suas pernas por cima das minhas, eu simplesmente não quero que eles acordem e comecem a me velar, convencer de que devemos ir para delegacia, de que tenho que sair da cama e enfrentar mais um dia. Cubro o rosto da claridade e sem ao menos notar, sinto lágrimas deslizando por meu rosto. Tenho tanta coisa guardada em meu peito que a qualquer momento solitário do dia, ele sorrateiramente enxotar para fora através de lágrimas.

Batidas aflitas golpeiam a porta. A cama afunda e sobe, num pulo aturdido Pietro salta da cama, seus cabelos ralos caindo por sua testa e sua cara amassada com marcas de travesseiros procuram soluções em minha face, que não expressam nada. Minha mãe em seguida também se levanta e encara Pietro com aflição.

─ Deve ser a polícia. ─ Pietro pressupõe. O observo andando de um lado para o outro expressando desespero a cada piscar. O homem olha no espelho e esforça para melhorar a aparência, antes de seguir para onde as batidas continuam a ecoar.

Retorno a encostar a cabeça no travesseiro e a cobrir os olhos.

─ Aonde ela está? ─ Thomas praticamente grita, sem ter controle nenhum de seu próprio tom de voz.

Tiro a coberta da cabeça e confirmo com meus próprios olhos que não estou sonhando ou se meus ouvidos estão pregando uma peça em mim, e não. Thomas está com o sobretudo molhado, as bochechas rosadas e o peito arfando. O homem um pouco abatido engatinha pela cama e mira meu pescoço e meu rosto, o vejo travar os dentes e fechar os olhos com raiva antes de expirar.

─ Ela já prestou queixa? ─ Sua mão acaricia a lateral do meu rosto.

─ Não. Desde a hora que te mandem mensagem ela não mudou de decisão. ─ Pietro responde e não consigo controlar um olhar de repreensão em sua direção, ele apenas balança os ombros, mostrando não estar arrependido, muito pelo contrário, parece aliviado, como se confiasse que Thomas é o único a me acalmar.

─ Podem me deixar a sós com ela? ─ Pede.

Thomas não precisa nem pedir duas vezes, em menos de um minuto o apartamento é somente nosso. Desvio meus olhos do dele e retorno a me aconchegar nas cobertas e a encarar as janelas, contemplando o céu e a imagem de alguns pombos parados nos postes de luz.

Thomas desce da cama, escuto o barulho de seus sapatos serem jogados no chão, reparo em sua imagem que enfia em meu campo de visão, despindo-se do sobretudo e do cachecol que usou para esconder seu pescoço do frio. Ajoelha a minha frente e eu fecho os olhos, proibindo-me de cair na perdição dos olhos claros, na boca delineada e do nariz levemente desenhado por um pintor que almeja a perfeição em suas obras, recuso a cair em tentação, novamente.

Meu pé se descobre e o frio invade meus pés, no entanto, assusto-me ao notar que Thomas trilha o caminho dos meus pés até meu rosto, seu corpo gelado roubando o calor do meu e ao mesmo tempo provocando calores em lugares que já estão aquecidos, ele tira a coberta, dando espaço para que a claridade ilumine nossos rostos. Seus lábios estão há centímetros de mim, seu joelho entre minhas pernas e suas mãos localizadas nas laterais do meu corpo.

─ Vamos conversar.

─ Eu não quero conversar. ─ Impressiono-me que ainda possuo voz.

Ele deita um pouco a cabeça e encara meu pescoço, sua mão passa levemente e carinhosamente por minha pele que arrepia-se com o choque que o corpo dele ocasiona ao meu. Em seguida, seus dedos tateiam minha bochecha e quando menos espero seus lábios estão sobre minha pele.

─ Dói? ─ Despeja um segundo beijo em meu pescoço.

─ Um pouco.

─ Pretende ir à delegacia prestar queixa? ─ Beija outra vez.

─ Claro que sim, não vou deixar aquele cretino sair dessa impune, mas eu só... queria ter o privilégio de descansar primeiro. ─ Fecho os olhos, mas os abro quando sinto o colchão afundar-se.

Thomas está desleixadamente jogado ao meu lado, ele apoia dois travesseiros debaixo de sua cabeça e logo em seguida, com delicadeza encaminha meu corpo para o seu, deixando que rosto repouse em seu peito e que minhas mãos tenham a liberdade de circular pelo corpo masculino. Suas mãos estão concentradas em dedicar a cariciar aos meus cabelos e a minhas costas, suas grandes mãos sobem e descem, traçando com exatidão a linha da minha coluna vertebral.

─ Como passou a noite? Na mensagem que Pietro me mandou, disse que estava abalada, em choque e calma, todos sabem que a agitação é sua companheira, enquanto a calmaria, é uma estranha para você.

O que adiantaria eu gritar, espernear? Nem todo espetáculo do mundo iria conseguir tirar a dor do meu peito, além do mais, não é somente eu quem estou sofrendo, sentindo esta angustia, solidão, medo, tem alguém aqui dentro que não tem culpa de nada, mas está sofrendo frutos que nem se quer plantou. Minha raiva ou me estresse seria justificado caso este sentimento afetasse somente a mim, porém, meu filho não merece sentir nada disso.

─ Não quero falar sobre a noite de ontem. ─ Afundo meu rosto em seu peito, sentindo-o levantar e abaixar, de leve conseguindo captar seus batimentos e usando o perfume masculino como um antidepressivo, para acalmar meus ânimos.

─ Não conseguiu dormir, não é?

─ Todas as vezes que preguei os olhos, eu o senti, me batendo e enforcando, nesses poucos minutos eu não reagia e estava afundada, praticamente aceitava a dor e a experiência de morrer, sem ao menos lutar por minha própria vida, Thomas. ─ Confesso.

─ Pesadelos não são reais, servem para assustar, desmotivar e aterrorizar, mas eles não são capazes de feri-la, amor. ─ As primeiras lágrimas caem, não choro pelo pesadelo, não choro pelo medo e a incapacidade de controlar meu inconsciente, mas choro, porque essa não é a primeira vez que Thomas repete esta frase para mim. Depois de ser ameaçada de morte, ler cartas dizendo as maneiras mais horríveis de tortura, os pesadelos começaram a fazer parte de minha vida e esse era um dos motivos por passar a noite na casa de Thomas, pois sempre nas piores horas, ele estava ali, para me acordar e me tirar daquele inferno. Recordo-me do suor, das lágrimas e de Thomas me abraçar com tanta força, com tanto amor que só conseguia adormecer novamente graças aos seus braços que me trazia o conforto e a segurança de conseguir fechar os olhos.

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