Várias latas de tinta spray e canetas posca estavam jogadas pelo chão da garagem, coberto por velhos jornais. Três paredes que antes eram completamente brancas, estampavam desenhos aleatórios e coloridos que haviam sido feitos dias atrás. Apenas uma estava rabiscada com desdém, e quando Duda passou os olhos por ela e encontrou sua namorada sentada, observando-a e fumando um cigarro, entendeu que algo estava fora dos eixos. Aquele não havia sido um bom dia para S/N.Duda: Observando a obra?
Quebrou o silêncio e atraiu a atenção da garota para si, que sorriu de lado antes de jogar a bituca do cigarro no cinzeiro e Reis se aproximar. Afundando a cabeça no pescoço de Duda, a abraçava carinhosamente pela cintura. O perfume que sentiu era o que mais gostava e suspirou leve com o carinho em seus cabelos. S/N estava tão estressada pelo dia longo que havia tido, que nem mesmo os seus grafites estavam surtindo algum efeito.
S/N: Estou tão cansada, estressada e os problemas não se vão na gravadora. É tão torturante, às vezes.
Ela tinha consciência de tudo, pois acompanhava todo o processo de perto quando tinham tempo para ficarem juntas ou pelos relatos de S/N nas ligações e mensagens. O seu novo álbum estava prestes a entrar em atraso por causa de uma falha da produtora que, ridiculamente, estava pondo a culpa na garota como justificava para seus erros. Ela não tinha errado, e estar no meio de um grande problema envolvendo sua paixão e trabalho era algo que a desestabilizava ao ponto de seu maior hobby se tornar apenas rabiscos desconexos em uma parede.
Duda: Eu sei, meu amor, está claro em você como tudo isso está te desgastando. Mas tudo irá se resolver, certo? Não irá atrasar, será um sucesso e você vai conseguir terminar aquele desenho ali.
S/N soltou uma risada fraca dando um beijo no pescoço de Duda; que referia-se a imagem inacabada de um único olho azul.
S/N: Ah, o seu olho?!
A risadinha que saiu involuntariamente da sua boca deixou Duda com um ar mais animado. Ela também estava cansada pela rotina exaustiva no trabalho, mas em todas as noites daquela semana S/N havia estado ali para ela. Agora era sua vez.
Duda: Você estava me desenhando, Queiroz?
Sua pergunta soou divertida e surpresa. S/N a puxou para sentar entre suas pernas e pôde sentir quando as costas da mulher chocaram delicadamente contra seu peito. Seu cabelo tinha cheiro de morangos. "Ela e sua mania de lavar os cabelos com shampoos com cheiro de frutas", ela pensou sorrindo.
S/N: Eu lembrei de como me apaixonei pelo seu olhar no nosso primeiro encontro.
Duda revirou os olhos e negou com a cabeça. Estava doente nesse dia, com os olhos lacrimejando e irritados pela poeira que S/N havia feito quando passou com o carro por ela e o estacionou um pouco a sua frente no supermercado. Assim que desceu do carro, discutiram feio até que S/N se oferecesse para comprar remédios para Duda como uma maneira de se redimir. Desde então, não se desgrudaram.
Duda: Não me venha com essa, amor, por favor. Eu estava terrível aquele dia e você só piorou a situação. Você olhou para mim e ainda teve a audácia de perguntar se eu havia fumado alguma coisa. Aquilo foi tão errado, Queiroz.
S/N: Não podia ser uma possibilidade?
Duda a olhou pelo canto do olho e um sorriso se formou novamente nos lábios da namorada. Ela amava quando causava esse efeito sobre S/N. Adora vê-la feliz por algo que vinha dela.
S/N: Você estava linda aquele dia. E sua maneira raivosa de me olhar pode ter me encantado, não nego.
Os lábios de S/N a beijavam pelo pescoço, fazendo-a arrepiar e depois deitou a cabeça no ombro da garota.
S/N: Você foi uma das melhores coisas que já me aconteceram. De certa forma, até agradeço por estar estressada aquele dia e você ter discutido comigo.
Duda: Então eu não preciso me desculpar, não é?
Questionou sentindo um último beijo antes de virar-se para ela. S/N assentiu e sua expressão se tornou surpresa.
Duda: Por que eu preciso me desculpar, amor?! Se não fosse por mim e pela minha incrível habilidade de arrumar confusão com artistas famosos, nós não estaríamos aqui agora e eu não seria a sua musa inspiradora.
A maneira óbvia com que ela falava e gesticulava com as mãos, causava em S/N uma sensação de conforto. Observar que ela continuava sendo a mesma após três anos de namoro, era apenas mais um detalhe de tantos outros que colaboravam para que seu amor aumentasse ainda mais. "Ela está aqui, para mim, não importa o que aconteça."
S/N: Mas, babe, você não é minha musa inspiradora..
Toledo observou a feição de sua namorada mudar imediatamente e sentiu-se um tanto malvada por fazê-la ficar daquela maneira.
Duda: Então, o que eu sou para você? Se eu for a sua inspiração para aqueles rabiscos... Queiroz, eu não sei o que eu faço com você.
S/N não conseguia parar de pensar em como ela era linda e completamente falante, pronta para arrumar uma confusão com as mínimas das coisas.
Duda: Então... Diga-me S/N, o que eu sou?
Ela continuou impaciente, puxando-a para mais perto, S/N suspirou quando sentiu sua cintura ser abraçada pelas pernas de Duda. Estavam próximas o suficiente para que pudessem sentir a respiração uma da outra.
S/N: Você é a minha arte favorita, eu te amo, Reis.
Murmurou sobre os lábios de Eduarda, e o coração da mesma batia fora da normalidade. S/N sentia o seu da mesma forma. E aquelas foram as suas últimas palavras antes de beijá-la, um beijo calmo, totalmente sem pressa, com saudade e cheio de amor. As mãos de Duda bagunçavam o cabelo preto da garota, que a abraçava com as mãos por dentro de sua blusa fina e sentia sua pele quente.
Duda: Eu te amo, S/A.
Elas sorriram e ninguém - absolutamente ninguém - poderia negar o quanto S/N era apaixonada por aquela mulher, e o quão grato se sentia por tê-la em todos os momentos. Principalmente para aqueles em que ela era a única capaz de mostrá-la que o amor das duas era a melhor porta de saída para fugir de todos os outros problemas.