Seu timbre tranquilo fica desajustado ao notar minha situação, sua preocupação fica estampada em seu olhar, alguma coisa se agita em mim, talvez seja porque não ouço nenhuma outra voz além da de Hércules. Ele tenta se aproximar e giro as adagas, protejo meu rosto com uma e coloco a outra a frente do corpo, ele para, pelo menos é esperto para reconhecer uma ameaça quando está próximo de uma.
- Está tudo bem, eu não vou machucar você.
Ele acha que eu sou um animal para falar assim comigo? Lentamente ele leva a mão até a cintura e me preparo para me defender caso ele jogue algo em mim, ergue a blusa e mostra o coldre para uma faca, abriu, meu corpo se tensiona e controlo a respiração, ele tem uma vantagem contra mim, mas não vou deixar que isso me atrapalhe. Franzi o cenho e não entendi sua ação, ele pega a faca e a joga longe. O que ele está fazendo? Se eu estivesse com mais força esse garoto com certeza estaria morto.
- Meu nome é Mickael, meus amigos me chamam de Micka. – Coloca a mão no peito, ele realmente está me tratando como um animal? – Eu sou um aprendiz de curandeiro e eu moro na vila que sobe a cachoeira.
- O que faz aqui? – Minha voz pateticamente fraca praticamente denuncia meu afogamento.
- Eu estava procurando por mirtilo, é uma fruta pequena e azulada.
Agora eu me ofendo, ele acha que eu sou uma leiga?
- Mas aí eu vi um filhote de urso nadando, eu achei fofo, até ele cair da cachoeira. Você o viu? Se não o viu ele pode estar morto em algum lugar, isso é bem triste na realidade.
- É, ele caiu. – Continuo com o cenho franzido, forço meu corpo a ficar em pé e as mãos não soltarem as adagas.
- Você está bem? Você parece machucada, eu posso ajudar você. – Dá um passo e recuo. – Olha. – Suspira. – Eu já disse que não vou te machucar, eu só quero ajudar.
Inspiro e murmuro um feitiço simples e os cortes e ralados feitos pelas pedras ardem e desaparecem, o olho do garoto se arregala e por um segundo realmente achei que saltariam para fora da órbita. Me atento ao seu rosto, embaixo de seus olhos há pequenas olheiras, de alguma forma eu posso vê-lo sentado em uma escrivaninha estudando e anotando com o pulso sujo de tinta, a mesa de estudo está completamente bagunçada, coberta de papeis, vasos de flores, plantas, um sanduíche meio comido, pinturas e mapas estão espalhados pela parede, ele é um garoto simples que vive uma vida simples, sem nunca precisar estar em batalhas para lutar por sua vida.
Pessoas como eu e ele jamais irão se misturar.
Ele é um garoto que tem uma vida longa e feliz pela frente. Pessoas como ele e pessoas como eu nunca poderão se misturar e caso um encontre o outro, um dos dois será gravemente machucado. Ficar aqui é perigoso, ele pode ser um estudante, mas ninguém nunca realmente está sozinho. Ficar com ele é arriscado, mesmo que ele não seja uma ameaça para mim eu ainda preciso sair daqui.
- Tá. Você não precisa de mim. Tudo bem. Okay. Entendi o recado.
Minhas costas estão sendo um problema, respirar dói, os músculos parecem estar quebrados como vidro, qualquer movimento, mesmo o mais leve, arde. Já está ficando tarde e Hércules provavelmente está preocupado, as roupas molhadas fazem o frio parecer mais gelado do que realmente está, se ficasse até a noite ou mais, vou ter uma hipotermia e vou dar mais trabalho ao meu tio. Procuro o caminho de volta e um outro caminho para sair do rio, acho um amontoado de pedras que seguem até o outro lado, é minha melhor chance.
- Você está machucada.
O ignoro e começo a andar. Ele tenta me encostar quando fraquejo, levanto as adagas e ele recuou.
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O conto da Princesa Perdida (REVISÃO)
FantasyPolly Erlathan, uma herdeira feérica, nunca chegou a ser coroada como princesa. Após ter seu trono usurpado e sua família assassinada, ela viveu décadas em uma fuga fracassada, carregando as marcas do passado. Convencida de que sua vingança e o reto...