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Saio da casa com as palavras martelando em minha cabeça, passo pelo campo de treinamento e sinto um soluço na garganta, o seguro. Ele realmente apaziguou tudo? Absolutamente tudo? Durante cinquenta anos, eu não evolui? Se eu não fiz nada durante cinquenta anos, o que mais eu vou fazer? Vou o mais longe que posso e deixo minhas lágrimas caírem enquanto ando. Hércules quer me levar para minha outra família, que eu nem mesmo sei se é real. E quer me levar para lá para que? Para que eu me sente em uma cadeira e mofe durante todo o restante da minha vida? Que fico quieta enquanto meu reino é tomado? Eu fiquei oitenta anos sem saber de Hallari. Na verdade, eu fiquei oitenta anos sem saber de nada do mundo exterior.

Caminho até o íntimo da floresta, acho uma grande árvore, paro em sua frente, seu tronco era muito mais largo que eu que poderiam ter quatro de mim enfileiradas que ainda teria espaço, sua altura era maior que a cachoeira que eu havia caído, tento olhar para o topo e a visão borrada atrapalha.

Não entendo, fiz tudo o que ele mandou durante anos, dias, aprendi a lutar com ele, desaprendi a ser princesa e aprendi a ser uma sobrevivente por causa dele, sua existência me tornava melhor e ainda assim não era o suficiente, após tantos anos eu ainda sou um fardo, ainda sou a princesa fraca que chora quando está sozinha, que berra ao fechar os olhos, que tem que ser consolada a cada dia, do amanhecer ao entardecer. Por causa de sua disciplina eu não sou mais assim, minha melhora ainda não foi o suficiente para fazê-lo se orgulhar de mim, para fazê-lo ter confiança em mim. 

Meu peito dói a ponto de não conseguir respirar, está ofegante que podia ver a fumaça saindo de meus lábios, o frio não incomoda, não tanto quanto o coração que arde em meu peito, de alguma forma essa dor é diferente, eu sei que ele está decepcionado comigo em muitos níveis, ouvir é bem diferente de saber, não importa o que for. Eu estou fraca ao ponto de ser uma decepção. O quão ridícula eu estou sendo por pensar que eu seria o suficiente? Que eu poderia recuperar a minha casa? O quão inútil eu sou?

Inspiro e prendo o ar por alguns segundos antes de soltar, afinal, chorar não leva a lugar nenhum. Arrumo minha postura em frente a árvore, firmei a base, ergui os punhos e iniciei uma sequência de socos intercalando com chutes durante algumas horas, em seguida treino meus músculos, apoiando meus braços no chão e ergo meu corpo ficando pelo máximo de tempo que consigo, pelo que já consegui contar quarenta minutos é o meu máximo. Volto com a sequência de socos e pontapés no tronco da árvore. Faço a contagem na cabeça para não ficar desocupada e pensar na mágoa que estou sentindo de Hércules, meu corpo já está suado e tremendo pelos exercícios intensivos.

Vendo o amanhecer, recostei-me na árvore e fecho os olhos por algum tempo para deixar meus músculos relaxarem, o pesar nos olhos ajudam o sono achegar mais tranquilamente. Dessa vez, não luto contra, deixo que o breu tome meu corpo sem lutar contra, está cansada demais para lutar contra o breu me rodeia como um redemoinho comigo em seu centro deveria estar ofegante, mas estou cansada demais para fazê-lo, então desapareço.

Um aproximar me desperta os sentidos, pego o peso que tocou meu ombro, uso as pernas para fazê-lo cair e terminar em cima do seu corpo com uma adaga na garganta. Pisco algumas vezes até ver que a pessoa que não gostaria de ver, está tremendo pálido e suando. Porque... porque esse garoto está aqui? Mickael está pálido e tremendo.

- Olha.

Sua voz falha. E de certa forma foi... agradável, vê-lo ficar nervoso.

- Olha, eu até gosto de uma mulher em cima de mim, mas com adaga eu acho que não gosto não.

Uma preocupação me ocorre, eu estou perto de casa, Hércules está vulnerável!

- Você está me seguindo? - Pergunto entre dentes.

O conto da Princesa Perdida (REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora