Capítulo 14 [Parte 4]

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A conversa enveredou para trivialidades. Arthur r me mostrou onde ficavam alguns utensílios e me alertou para não deixar coisas jogadas pelo chão, pois a faxineira guardava tudo no lugar errado e levava semanas até que lembrasse onde colocara cada objeto. Aprendi um pouco sobre ele naquela conversa. Ele fora campeão estadual de nado de costas quando estava na faculdade – o que explicava muita coisa, principalmente aquelas costas largas e bem definidas -, mas decidira abandonar o esporte para ser estagiário na L&L. Ele ainda nadava sempre que podia.

Arthur me contou sobre seus poucos amigos, seus pais, mas não tocou no assunto que, curiosamente, mais me intrigava e as mulheres de sua vida. Ele tinha alguém?

Ele falou, falou e falou, mais do que eu imaginei que fosse capaz, e por diversas vezes tive que me lembrar de parar de sorrir. Fiquei surpresa quando ele sugeriu pedir uma pizza para o jantar e constatei que já era noite, pois mal vira o dia passar. Ele até me deixou escolher o sabor, e descobri que ambos éramos fissurados por pizza de calabresa. Conversamos um pouco mais enquanto comíamos, ainda sobre trivialidades, ainda pisando em solo arenoso, testando, nos conhecendo.

- Eu lavo e você seca e guarda – ele disse, retirando os pratos da mesa e levando-os até a pia.

- Não tem lava-louças? – perguntei em pânico.

- Não.

- Por que não? – eu quis saber. – Todo mundo tem lava-louças! Até a mãe da Viviane tem.

- Nunca precisei – ele deu de ombros. – Sempre morei sozinho. Não tem muita louça pra lavar.

- Mas... mas... eu não sei onde guardar! - apontei aflita.

- Por isso mesmo você vai secar e guardar – ele sorriu, divertido, com meu horror. – Vou te dizendo onde cada coisa fica, assim você aprende, para o caso de decidir cozinhar alguma coisa.

- Você realmente não me conhece. Obrigada pela preocupação, mas dificilmente isso vai acontecer. Não sei cozinhar. Não vou precisar de nada. Mas eu... eu te ajudo. Você foi legal comigo hoje.

- Eu sou legal! – ele sorriu. – Comprei algumas coisas para você. Nunca morei com uma garota antes então o Paulo me deu uma ajudinha.

- Quem?

- O Paulo, do Comex – ele disse, como se fizesse algum sentido. Percebendo que aquilo não significava nada para mim, prosseguiu: - Aquele cara que derrubou vinho na Alice no nosso almoço de casamento.

- Ah, o Paulo. – Magrelo, narigudo, trabalhava no mesmo setor que Arthur e nunca falara comigo até aquela manha, e mesmo assim seu "Parabéns, tomara que dure" não fora bem uma conversa.

- Somos amigos há muito tempo, desde a época da faculdade. Ele disse que as mulheres gostam de certas coisas. Estão no armário e na geladeira. Se eu comprei errado, me avise.

- Hã... obrigada, Arthur – respondi, espantada com sua delicadeza. E me dei conta de que em aspecto algum ele era o ogro que eu havia imaginado quando o xingava . Era educado, gentil e atencioso. Não entendi o por quê, mas essa constatação me deixou com mais medo dele.

- Por falar nisso, agradeço se você não mexer nos meus hidrotônicos. Costumo levar uma garrafa de manha quando vou malhar. Se quiser posso comprar alguns pra você, só me diz que sabor prefere.

Ah, então aquela montanha de músculos era cultivada com algum esforço e que esforço viu .

- Não gosto de hidrotônicos, obrigada.

Terminamos com a louça rapidamente. Arthur voltou para a TV e aproveitei para tomar um banho. Vesti o pijama – calça azul com nuvenzinhas brancas, regata branca lisa, pantufas de patinhas de dinossauro – e fui direto para aquela cama mole demais para o meu gosto.

Viviane ligou assim que me deitei.

- E aí? Estou interrompendo alguma coisa? – perguntou sugestivamente.

- Deixa de ser boba

- Uma garota pode sonhar – ela suspirou. – Como foi?

- Foi... surpreendentemente bom – admiti, encarando o teto branco.

- Bom? Quer dizer, bom mesmo?

- Por incrível que pareça, o Arthur é bem bacana quando quer. – Ele era mesmo bacana! Como eu não tinha percebido isso antes? – Ele me ofereceu carona para ir para o trabalho.

- Não acredito! O que você disse?

- Agradeci e aceitei, claro. – Embora devesse ter recusado. Arthur e eu ficaríamos muito tempo juntos. E isso parecia ruim de alguma forma.

- Ah... Sinto cheiro de coisa boa vindo por aí. Mas você não parece muito animada com tudo isso.

- É que... eu não sei, você é minha melhor amiga,Viviane e . Parece que tem algo errado. Não sei dizer o que é.

- Humm... Talvez você esteja se sentindo culpada por enganar seu avô.

- Talvez. – Mas, sendo sincera, não era esse o problema, era?

- Amanhã eu passo aí pra conhecer sua nova casa. Boa noite, Carla .

- Até amanhã, Viviane .

Demorei um pouco para pegar no sono. O colchão mole afundava e minhas costas doíam. Depois de me remexer por mais de uma hora, finalmente adormeci, mas preferia ter me mantido acordada a noite toda.
Vovô voltou a assombrar meus sonhos. Estávamos no cartório, Arthur conversava animadamente com Viviane , e vovô Pedro , no fundo da sala, me observava. Caminhei lentamente até ele. Ele não sorria, seu rosto marcado pelo tempo estava triste. Uma tristeza profunda, que fez meu coração doer.

- Que foi? O que está errado?

Ele olhou para Arthur por um longo tempo, depois voltou os olhos negros para os meus.

- Você não gosta dele? – perguntei insegura.

Ele não respondeu.

- Olha, vovô, eu não queria fazer isso, tá legal? Mas o Carlos disse que eu ia para a cadeia se não pagasse os meus cartões, e tive até que vender o meu cupê, e você mais do que ninguém sabe como eu amo aquele carro... e... e as coisas estão meio fora do meu controle e você morreu. Então não tem o direito de me julgar.

Ele suspirou.

- Vai partir seu coração – disse, com um pesar que me causou calafrios.

- O Arthur ? Não. Eu juro que não. Ele é um cara bacana, mas eu nem gosto dele. E ele não gosta de mim desse jeito. Ele meio que me tolera e é só até tudo se resolver – expliquei apressada.

Ele me mostrou um sorriso triste.

- Vai doer além do que você pode suportar.

Eita Carla se eu fosse você ouvia seu avô,

Os mais velhos sempre são os mais sábios.

Por hoje é só

Amanhã tem mais 🥰🦋
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Procura-se um marido-Carthur  (Finalizada )Onde histórias criam vida. Descubra agora