Abigail Brooks
Depois que Julian foi embora a governanta me encheu de perguntas sobre o que nós dois ficamos conversando. Isso só confirmou o que Julian havia dito pra mim, sobre o aviso que recebeu dela. Não quero pensar no porquê ela deu o aviso a ele, dizendo-o para não falar sobre nada comigo, como se eu devesse ficar as escuras de qualquer coisa.
Eu a ignorei, juntando os papéis do trabalho e meus livros, amontoando-os nos meus braços antes de correr para o meu quarto. A ouvi me chamando nesse meio tempo, mas apenas tranquei a porta, não querendo falar com ela e muito menos com a minha mãe. Podia ouvir o som do carro chegando, assim como o ronco da moto de Julian ficando mais baixa, até sumir, quando ele foi embora de fato.
Dessa vez não havia motivos pra ele voltar pra minha casa. O trabalho já estava concluído e eu só precisava enviar para a professora. Aquila percepção fez meu coração se apertar, porque as palavras dele ainda giravam na minha cabeça, como uma verdade que eu me esforçava a não acreditar. Mas eu sabia que ele tinha razão em muitos pontos. Eu não estava infeliz ali, mas estava muito longe de me sentir feliz de verdade.
Soltei as coisas sobre a escrivaninha, bagunçando os papéis do trabalho até encontrar o papel dobrado que Julian havia escondido ali. Sua letra desengonçada estava marcada com dois números de telefone, escrito "eu" e "polícia" bem ao lado. Soltei uma respiração pesada, sentindo um gosto amargo na boca ao perceber que Julian achava minha vida tão estranha, a ponto de me deixar o número da polícia.
Era como se ele esperasse que algo de ruim acontecesse. Como se ele soubesse que eu ia precisar. Isso me fez olhar pelo quarto, procurando o melhor lugar para esconder aquele papel. A governanta estava sempre no meu quarto, organizando as coisas e limpando. Não podia deixá-la encontrar aquilo ou perderia a única ligação real que eu tinha com o restante do mundo.
O escondi no meu closet, dentro do bolso interno de uma das minhas jaquetas. A sensação de estar fazendo algo muito errado queimou na boca do meu estômago, porque aquilo era só um número de telefone. Minha mãe não deveria ficar brava por conta disso. Mas eu tinha a sensação que ela surtaria se encontrasse aquele papel com o número da polícia e de Julian. E era uma sensação que partia meu coração em dois.
[...]
Minha mãe não perguntou sobre Julian quando desci para o jantar. Ela permaneceu em silêncio, comendo enquanto me lançava sorrisos contidos, uma vez ou outra. A comida parecia brasa na minha boca toda vez que eu comia mais um pouco, sentindo meu estômago pesado. Não estava com fome e não conseguir me concentrar no presente, sem olhar pra minha mãe e pensar no que Julian disse.
Eu queria sair. Sempre quis. Todas as vezes que desejei, minha mãe falou milhares de coisas e eu dei ouvidos a ela, não querendo deixá-la irritada ou triste. Era sempre assim. Talvez eu apenas não tivesse insistido o suficiente. Eu não podia ser uma prisioneira na minha própria casa, com minha mãe. Ela se importa comigo.
—Você está tão quietinha hoje. —Ela finalmente falou, abrindo um sorriso e me encarando com a cabeça tombada de lado. —Está tudo bem, meu amor? Sua tarde foi agradável?
—Foi sim. Terminamos o trabalho e eu já enviei pra professora. —Afirmei, vendo-a balançar a cabeça positivamente, com uma expressão que deixava claro que aquele fato a agradava muito. —Depois, se você se lembrar, pode enviar um e-mail pra ele avisando que o trabalho já foi entregue pra professora? Ele me pediu para avisar, apenas para ter certeza que tudo deu certo.
—Antes de dormir eu mando. —Minha mãe prometeu, enquanto eu comprimia os lábios, soltando um suspiro pesado ao voltar a encarar meu prato.
Hoje era sexta, então eu teria o final de semana inteiro em casa com a minha mãe, se ela não tivesse qualquer compromisso nesses dias. Ponderei sobre a melhor forma de falar com ela, repetindo a mim mesma para não abaixar a cabeça e insistir. Eu precisava ser firme, mesmo quando ela tentasse me dobrar com suas palavras de preocupação.
—Eu estava pensando em ir no shopping esse final de semana. Poderia ir com um dos seguranças, pra você não ficar tão preocupada. —Comentei, vendo minha mãe ficar imóvel na cadeira, enquanto minhas mãos tremiam ao redor dos talheres, mesmo que eu me esforçasse a me manter calma. —Só dar uma volta e comprar alguma coisa. Nunca sai pra fazer compras. Você sempre faz isso e...
—O que ele disse pra você? —Indagou, cortando minhas palavras. Ergui a cabeça para encara-la, ficando em absoluto silêncio. —O que aquele rapaz disse pra você, Abigail?
—Nada! —Afirmei, rápido demais, vendo-a comprimir os lábios, com o rosto um pouco vermelho. —Ele não me falou nada. Fizemos o trabalho e ele foi embora.
—Não minta pra mim! —Retrucou, soltando os talheres com força sobre o prato, me fazendo sobressaltar na cadeira. —Você não tinha essas ideias de sair antes desse rapaz aparecer aqui. O que ele disse pra você?
—Eu sempre pedi pra sair, mas você nunca deixou! —Rebati, com a voz saindo mais alta do que eu estava acostumada a falar com ela. —Eu só quero dar uma volta no shopping. Manda um segurança comigo.
—Não. —A resposta dela veio curta e baixa, antes de minha mãe voltar a comer, fazendo meu coração disparar dentro do peito.
—Por que não? Por que eu não posso sair como alguém normal? —Insisti, odiando o fato de ela estar olhando para a comida como se ela fosse muito mais interessante do que eu. —Eu vou viver assim pra sempre, mãe? Nunca vou poder sair, ver as pessoas e fazer qualquer coisa diferente? E quando eu me formar, não vou poder trabalhar? Eu tenho que viver presa o resto da minha vida?
—Já chega, Abigail!
A voz dela saiu tão alta, que eu me encolhi inteira na cadeira, sentindo meu coração afundar como uma pedra de gelo no meu peito, enquanto meus olhos se enchiam de lágrimas. Quando encarei os olhos furiosos dela, desejei mais do que tudo que ela me deixasse sair. Que ela provasse que Julian estava errado. Ele tinha que estar errado.
—Vá para o seu quarto. Não vou admitir que falte com respeito comigo, depois de tudo que eu fiz esses anos todos pra você. —Afirmou, com a voz mais baixa, erguendo a mão e apontando para o corredor. —Vá para o seu quarto e não saia de lá até que eu diga que pode. Eu amo você, filha, mas tudo tem um limite.
Fiquei imóvel por um segundo interminável, antes de empurrar a cadeira e sair correndo para o meu quarto, sentindo meu coração sendo esmagado por aquelas lágrimas que manchavam minhas bochechas.
Continua...
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Como conquistar Abigail Brooks / Vol. 4
RomanceAbigail Brooks está muito longe de ser a Rapunzel, mas foi criada a sete chaves desde criança. Estudando desde a infância em casa e tendo todo o contado com o mundo vindo apenas de sua mãe, ela está mais do que ansiosa para descobrir o que existe al...