Capítulo 6: Eu não tenho celular.

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Julian ficou em silêncio depois disso e nós dois voltamos para a questão do trabalho que precisávamos fazer. Mas eu ainda fiquei pensando em tudo que ele disse, sobre morar longe do pai e poder fazer o que quiser, sem ninguém em cima dele para ditar suas ações. Parecia uma coisa irreal pra mim, mas era Julian que estava me encarando como se minha realidade fosse estranha.

No meio da manhã a governanta apareceu para nos trazer um lanche, lançando um olhar demorado a Julian e eu, como se quisesse saber todas as palavras que havíamos trocado para reportar a minha mãe. Tentei ignorar sua presença quando ela parou perto da porta e ficou ali, nos observando comer e falar sobre o trabalho. Não costumava me sentir desconfortável com isso, porque já estava acostumada. Mas com Julian ali, me senti estranha, como se até mesmo minhas ações dentro de casa fosse um perigo.

Ela saiu depois que terminamos de comer, enquanto eu checava as horas e pensava em quanto tempo ainda tinha com Julian. Ele parecia concentrado nas pesquisas e no que precisávamos escrever, mas eu podia sentir seus olhos em mim uma vez ou outra, como se ele não soubesse muito bem o que pensar. Como se ele quisesse falar comigo, mas não soubesse como.

No final da manhã o celular dele tocou, com a tela se acendendo sobre a mesa. Observei a foto de um rapaz ruivo surgir ali, ao lado de uma garota de óculos. Julian murmurou algo pra mim que não entendi, antes de pegar o celular e se afastar para atende-lo. Um desconforto surgiu na boca do meu estômago, mas eu não conseguia entender o que de fato estava me incomodando naquele momento.

—Eu preciso ir. —Julian voltou pra mesa depois de um minuto, guardando as coisas dele na mochila. —A gente pode marcar pra terminar o trabalho? Posso vir aqui de novo na sexta a tarde, que é quando não temos aula e tenho tempo livre.

—Pode ser. Se não for um problema pra você vir aqui de novo. —Falei, comprimindo os lábios ao vê-lo balançar a cabeça negativamente, fechando a mochila e a jogando nas costas, antes de olhar pra mim. Eu ainda estava sentada, apertando minhas mãos escondidas embaixo da mesa, sentindo meu coração martelando na minha cabeça. —Posso tentar ir na sua casa, mas não acho que terei permissão.

—Ah... —Julian fez uma careta, engolindo lentamente ao me encarar, como se tivesse ficado sem palavras por um segundo. Mas ele balançou a cabeça logo em seguida, como se quisesse espantar alguns pensamentos, antes de abrir um sorriso hesitante. —Tudo bem, Abigail. Se não conseguir, eu venho aqui de novo sem problema. —Me encolhi quando ele abriu o celular e o estendeu pra mim. —Coloca seu número, assim a gente pode conversar se acontecer um imprevisto com um de nós dois... ou se você conseguir ir na minha casa.

—Eu não tenho celular. —Afirmei, vendo-o puxar a mão de volta, abrindo e fechando a boca várias vezes, antes de desviar os olhos e corar, como se estivesse constrangido. Acho que corei também, porque senti minhas bochechas queimando em uma mistura de vergonha e nervosismo. —Julian...

—Srta. Brooks. —A governanta abriu a porta sem nem bater, fazendo Julian e eu pularmos de susto. Ela encarou Julian, percebendo que ele estava de pé e pronto pra ir embora, enquanto eu me levantava apressada. —Sua mãe está chegando. Se já terminaram o trabalho, melhor se apressar para o almoço.

—Já estou indo. —Abri um sorriso fraco pra ela, antes de olhar pra Julian, percebendo que ele estava me encarando como se estivesse com pena. Mas aquele sentimento logo sumiu quando ele sorriu pra mim. Seu rosto se iluminando de uma forma que o deixava muito bonito.

—Eu vou... —Ele indicou a porta, parecendo não saber como agir, já que a governanta estava esperando na porta. —Tchau, Abigail. A gente se vê na sexta.

Abri um sorriso pra ele, sentindo uma sensação esquisita ao vê-lo desviar os olhos de mim e caminhar até a porta, murmurando uma despedida a governanta antes de desaparecer no corredor. Me encolhi sobre o olhar afiado da mulher mais velha, que ergueu as sobrancelhas, provavelmente se perguntando o que eu havia combinado com ele.

[...]

Subi para o meu quarto, correndo para a varanda assim que fechei a porta. Julian havia acabado de descer as escadas e estava caminhando na direção da sua moto, enquanto o carro da minha mãe estacionava na frente da casa. O observei montar na moto e colocar o capacete, antes de nossos olhares se encontrarem quando eu percebi que eu estava ali.

Julian hesitou, me encarando por tanto tempo que senti que meu coração iria se estilhaçar quando ele ligou a moto e saiu dali. Meus olhos o seguindo até que eu não conseguisse mais vê-lo. Aquilo me fez soltar um suspiro pesado e voltar para o quarto, onde me sentei na ponta da cama e fiquei pensando em todas as coisas que havíamos conversado.

—Abigail? —A porta se abriu e minha mãe entrou, franzindo a testa ao me ver sentada ali. —O que está fazendo? Não vai descer para almoçar comigo?

—Eu já estava indo, mãe. —Retruquei baixinho, vendo-a permanecer me encarando confusa, antes de se aproximar até parar na minha frente, como se visse nos meus olhos as duvidas que eu tinha naquele momento. —Posso ter um celular?

—Por que você quer um celular? —Indagou, erguendo as sobrancelhas pra mim, como se eu tivesse escondendo coisas dela. —Você só tem a mim e qualquer coisa que precisar pode falar com a governanta que ela providencia.

—Eu sei, mas... —Abaixei a cabeça, encarando meus pés, me sentindo tão frustrada naquele momento. —A gente não conseguiu terminar o trabalho hoje. Julian vai precisar voltar aqui na sexta. Ele pediu meu número, caso um de nós tivesse um imprevisto.

—Ele tem seu e-mail, Abigail. Se precisar ele manda mensagem lá e eu vejo. —Afirmou, comprimindo os lábios como se estivesse infeliz. —Não faça essa carinha de cachorro perdido, minha filha. Aquele rapaz não é seu amigo. Ele é seu colega e você passou uma manhã com ele apenas. Não vou te dar um celular pra você trocar mensagens com um desconhecido. Depois que esse trabalho acabar vocês dois nem irão se ver mais, de qualquer forma.

—Eu só queria... —Parei de falar, sem saber ao certo o que eu queria. Parecer normal? Eu nem sabia o que era ser normal depois de ouvir aquelas coisas de Julian e ver a forma como me olhou. —Eu posso ir na casa dele terminar o trabalho? Combinamos na sexta a tarde.

—Ele não pode vir aqui de novo? —Indagou, me fazendo erguer a cabeça para encará-la, vendo que minha mãe me encarava com uma expressão impaciente, antes de soltar um suspiro pesado e se afastar em direção a porta. —Se ele pode, não tem porque você sair. Se arrume e venha almoçar comigo. Não criei você com tanto amor pra você ficar sentimental por conta de alguém que você nem conhece direito.

Continua...

Como conquistar Abigail Brooks / Vol. 4Onde histórias criam vida. Descubra agora