Capítulo 60: Deve ser coisa de família.

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A primeira coisa que notei é que era extremamente parecida com a minha mãe. A minha mãe de verdade. Sempre me achei muito diferente de Kristie e imaginava que tinha puxado muito mais do meu pai fisicamente do que dela. Mas agora, olhando para eles, sei de onde puxei cada traço meu.

Os dois ficaram na ponta da cama, enquanto Julian se manteve perto da janela, como se quisesse nos dar o espaço necessário. Mesmo que quisesse chamá-lo para ficar ao meu lado, não fiz isso, porque sabia que precisava fazer aquilo sozinha.

—É um prazer conhecer você, Abigail. —Foi o homem quem falou primeiro, enquanto a mulher ainda estava tentando conter as lágrimas, parecendo incapaz de dizer qualquer coisa naquele momento. Ele passou o braço ao redor dela, abrindo um sorriso pra mim, que era uma mistura de ansiedade, nervosismo e hesitação. —Meu nome é Damian, e essa é a a minha esposa, Adeline. Você pode nos chamar como preferir. Como desejar.

Balancei a cabeça que sim, segurando com força o tecido do lençol que me cobria, porque o nervosismo estava aumentando a cada segundo. O nome dos dois ficou se repetindo na minha cabeça, com a sensação de ser algo que eu deveria saber a muito tempo, mas havia perdido também.

—Briar nos contou algumas coisas sobre você. —Damian olhou para o filho e depois para mim de novo, parecendo estar buscando as palavras. —Ainda estamos um pouco chocados com algumas coisas. Talvez até um pouco perdidos. Mas... —Ele olhou para a esposa, que estava finalmente conseguindo controlar as lágrimas, mesmo que os olhos não me deixarem por nenhum segundo. —Mas gostaríamos de deixar claro que tudo que você precisar, estamos aqui. Só queremos...

Ele parou de falar, levando a mão aos lábios quando eles subitamente tremeram, como se ele não conseguisse mais conter o que estava sentindo. Seu olhar se desviou de mim para o chão, enquanto meu coração ficava subitamente apertado. Não conseguia imaginar o que era esperar anos por alguém e finalmente a encontrar.

—Tudo bem, pai. —Briar abriu um sorriso pra ele, parecendo compreender perfeitamente o que ele estava sentindo.

—Eu posso...? —Adeline finalmente falou, gesticulando entre o espaço entre nós duas.

Comprimi meus lábios, balançando a cabeça que sim, vendo-a soltar a mão do marido e então se aproximar da lateral da cama até estar do meu lado. A ansiedade fez um buraco se abrir no meu peito, porque cada palavra ou ato dos dois era como uma escada muito longa que todos nós precisávamos percorrer para recuperar o tempo perdido.

—Você é muito, muito bonita, Abigail. —Ela soltou o ar como se estivesse sem fôlego, com as mãos tremendo ao passar pelas bochechas. —É um pouco parecida comigo quanto eu tinha sua idade.

—Um pouco? —Briar e Damian falaram juntos, arrancando uma risada baixa de Adeline, que olhou para Briar como se estivesse tão agradecida a ele naquele momento.

—Você também é muito bonita. —Falei, ficando um pouco constrangida por minha voz ter saído muito baixa, um pouco estranha pelo meu nervosismo. Adeline pareceu surpresa por me ouvir falar pela primeira vez, antes do seu rosto se transformar em algo iluminado quando  sorriu pra mim.

—Deve ser coisa de família. —Briar comentou, passando a mão nos cabelos de  um jeito como se quisesse fazer charme, o que nos fez rir. Sabia que ele só estava tentando quebrar o gelo que envolvia todos nós e ficava muito grata por isso. —Menos a mamãe usando pijama em um hospital.

—Estávamos dormindo quando você ligou, eu não tive tempo de me trocar, porque ficamos preocupados. —Ela tentou ajeitar o sobretudo para esconder mais o pijama, mesmo que isso fosse impossível. —Desculpa, Abigail. Não era desse jeito que eu imaginava reencontra-la. Ainda estou me recuperando do susto.

—Você parece ótima pra mim, não precisa se desculpar. —Falei, percebendo que ela falou reencontrar e não conhecer.

Me perguntei quantas vezes ela conseguiu me ver depois que eu nasci, antes de sermos arrancadas uma da outra. O fato de estarmos evitando falar de Kristie era bom, porque parecia que todos estavam dispostos a não estragar a situação com qualquer menção sobre ela.

Seus olhos se voltaram para os meus de novo, com um brilho diferente que eu tinha certeza que ela estava pensando no mesmo que eu. Fiquei um pouco envergonhada quando Damian se aproximou e parou ao lado dela, passando o braço ao redor do ombro da esposa.

Soltei uma respiração pesada quando ela ergueu a mão e tocou minha bochecha, limpando as lágrimas que manchavam a minha pele. A palma da mão quente trazendo uma sensação de conforto pro meu coração quando sua outra mão tocou minha outra bochecha e ela aninhou meu rosto nas duas, me observando por um momento tão longo e significativo.

Ela e Damian se olharam, como se pudessem estar pensando a mesma coisa que eu. Os olhos ficando marejados de novo, como se fosse impossível evitar aquilo. Quando ela voltou a olhar pra mim, afastou as mãos do meu rosto, abrindo os braços como se estivesse me dando a opção de recuar se achasse que aquilo fosse demais.

Mas não fiz isso. Me afastei de Briar e me inclinei sobre a cama para perto dela. Seus braços me envolveram no mesmo instante que ela soltava um soluço em meio as lágrimas e me abraçava apertado. Fechei meus olhos e passei o braço ao redor dela, pensando que pela primeira vez estava realmente abraçando minha mãe e não uma mentira.

Meu coração disparou dentro do peito, me deixando constrangida por conta dos fios que estavam ligados a mim, que mostravam pra todo mundo como eu estava me sentindo, já que o blip da máquina estava muito frequente e muito alto em meio ao silêncio. Mas eles pareceram não notar isso, porque o pai de Briar — o meu pai — passou os braços ao redor de nós duas e nos abraçou também.

Tinham muitas palavras não ditas entre todos nós. Muitas coisas que não podiam ser ignoradas por muito tempo. Mas eu tinha a sensação que iríamos falar sobre todas elas em breve, quando o choque finalmente passasse. E eu tinha certeza, pela forma que os dois me abraçavam, como se realmente tivessem me esperado esses anos todos, que eles não iriam sair do meu lado.



Continua...

Como conquistar Abigail Brooks / Vol. 4Onde histórias criam vida. Descubra agora