Esperança?

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Acordei com a visão embaçada e não consegui distinguir o local. Vi paredes brancas e alguma coisa presa no meu dedo. Olhei para o meu braço e tinha um tubo ligando minha veia a um tipo de soro. Olhei para a poltrona ao lado e vi minha mãe. Senti muita dor pelo o corpo todo, principalmente na cabeça  e fechei os olhos tentando amenizar. Coloquei a mão na cabeça e percebi que estava enfaixada.

- Mãe? – Perguntei mesmo sem ter certeza se ela estava ali, e saiu mais como um gemido. Logo que ela me ouviu, se levantou e veio até mim chorando.

- Oi minha filha, esta com dor? – Perguntou ela baixinho.

- Muita! – Respondi sentindo lágrimas se formarem nos meus olhos pela dor física. 

- Eu vou chamar o médico. – Ela saiu da sala e me deixou ali. Não me lembrava bem o que havia acontecido, só me lembrava de ter saído da festa, estar indo para casa e logo depois sentir muita dor, mas tentar lembrar desse momento me fazia sentir falta de ar e desespero. Um policial jovem entrou na sala e parou na minha frente.

- Boa tarde Lorenna, pode me chamar de Zac, está se sentindo bem? – Ele perguntou gentilmente.

- Não, eu estou com muita dor. Eu... não me lembro... não sei... - Tentei falar mas meus pensamentos estavam embaralhados e confusos. – Parei um pouco e pensei. – O que aconteceu comigo? Fui atropelada? – Ele me olhou e respirou fundo.

- Sua mãe foi chamar o médico, enquanto isso eu disse que viria conversar com você. – Assenti fracamente e ele se sentou numa cadeira próxima. - Acho que essa é a pior parte do meu trabalho. - Disse pelo que pareceu ser para si mesmo e esfregou as mãos na calça. – Não se lembra de nada?

- Lembro de ter saído da festa, estar indo para casa e depois sentir dor, mas não consigo me lembrar por que.

- Você quer a verdade agora ou quer esperar até se recuperar completamente? – Ele perguntou diretamente, mas com sensibilidade. 

- A verdade agora. Por favor... Eu sei que bom não foi. – Não conseguiria esperar minha recuperação, já que eu me sentia transtornada e com os pensamentos estranhos por não lembrar do que havia acontecido.

- Lorenna.... Você foi vítima de um estupro coletivo na noite de ontem. Por sorte um grupo de amigos seus chegaram, evitando que eles te matassem e fugissem. Eles já foram presos, exceto um que conseguiu fugir, os outros pegaram prisão perpétua. Mas, infelizmente eles chegaram tarde demais para evitar que acontecesse todo o sofrimento e a dor com você. – Ele disse não tão rápido, mas também não tão devagar. Como se fosse um filme eu comecei a me lembrar de cada detalhe, e toda a dor. É... aquilo não era nada bom... na verdade, era terrível. Minha respiração acelerou e eu ouvi os bips dos meus batimentos cardíacos aumentarem. Engasguei com o que pareceu ser um choro e levei a mão à cabeça, percebendo que tremia. A sensação terrível e o desespero cresceram em mim e eu gritei não conseguindo suportar aquela dor. O policial Zac se aproximou pacientemente de mim e me abraçou de lado, o que me fez sentir grata mas ao mesmo tempo repulsa. Percebi os hematomas nos meus braços, notei a dor entre minhas pernas, e o latejar da minha cabeça... eu conseguia sentir cada centímetro de dor do meu corpo e lembrar de cada toque que eu não tinha autorizado. Senti a violação... e chorei... chorei com a vontade de ter morrido ali naquela rua mesmo. 

O médico adentrou a sala junto com a minha mãe, meu pai e meus irmãos e me pediu calma enquanto eu me debatia em desespero, até que aos poucos mas muito rapidamente, eu não senti mais nada além de um sono tentador. 

- Eles acabaram comigo, eles não podiam ter feito isso. Alguém me ajuda por favor. – Implorei por fim sendo vencida pelo sono.

[...]
- Como está se sentindo? – Doutora Linda perguntou durante a nossa última sessão antes que saísse do hospital. Fazia dois meses que eu estava lá e todos os dias eu vinha fazendo sessão com ela.

- Estou me sentindo bem, eu acho.... – Respondi simplesmente.

- E como está se sentindo em relação a esse bebê que está vindo? – Ela perguntou apontando para a minha barriga. Automaticamente coloquei a mão em cima acariciando e sorrindo.

- Apesar de tudo, eu estou feliz e sei que vou amar meu filho. Já amo! – Respondi e ela sorriu de volta. – Continue voltando todas as sextas feiras aqui e não deixe de estudar.

- Não vou! Agora transferi meu curso para manhã, e a tarde antes de escurecer já estou em casa. Nada de festas e nada de sair por aí de noite desacompanhada, apesar de saber que a culpa não foi minha e que era meu direito andar sozinha por ai e estar protegida. – Ela bateu palminhas orgulhosa por eu ter pegado essa frase como mantra e tentando me alegrar, eu sorri de forma simpática. Sai da sala dela e Thomas já me abraçou, pegando a minha bolsa.

- Quer conversar sobre algo? – Ele perguntou tentando me distrair.

- Por que você não me conta do carinha que conheceu? – Ele sorriu docemente e começou a contar a história. Thomas foi capaz de mudar de curso por mim e disse que não se arrependia, pois, estava adorando. Naquela noite terrível, ele, Lucas e os irmãos de Amanda me encontraram após ouvirem de uma colega de sala que me viu saindo sozinha, e desde então nenhum dos cinco saiu do meu lado. Thomas assumiu um papel de superprotetor - apesar de antes nossa amizade ser um pouco "rasa" - mas eu estava amando, eu precisava daquilo!

- E aí ele foi um completo babaca e mandei ele pastar. – Disse me fazendo rir baixinho. – Mas iai? Como vai o meu afilhado ou afilhada? – Ele perguntou entusiasmado passando a mão na minha barriga.

- Vai bem. Semana que vem tem mais exames. – Ele bateu palminhas e deu partida no carro. Chegamos em casa e ele preparou algo para eu comer. Minha mãe chegaria em breve e sairíamos para comemorar a minha saída do hospital em um restaurante mais calmo. 

Subi para o meu quarto e deitei na cama. Me encolhi um pouco e as imagens daquela noite voltaram a minha mente, me assombrando. Fechei os olhos com força tentando tirar aquilo da minha cabeça, mas simplesmente não iam embora. Senti lágrimas descerem pela a minha bochecha e uma dor dentro do meu peito se estabeleceu fortemente.

- Lorenita o que foi? – Thomas me perguntou assustado entrando no quarto.

- Por que isso aconteceu comigo? – Consegui perguntar em meio ao choro. Ele sentou na cama e me abraçou. Eu chorei mais em seus braços.

- Meu anjo se acalme, nada mais de ruim vai acontecer com você! – Ele disse enquanto acariciava meus cabelos e me beijava na cabeça. Me senti protegida e com esperanças de que tudo dali em diante daria certo.

Ah Thomas.... Por que você mentiu pra mim? 

Anjo PerdidoOnde histórias criam vida. Descubra agora