I • SEXO SALVA VIDAS • Pronto Para Matar

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Ele queria fugir. Se pudesse, esmurraria sua babá musculosa ali mesmo e correria para uma vida normal. Sem cadáveres reanimados, fantasmas ou demônios. Longe do sangue e dos gritos que era obrigado a testemunhar. Mas hoje não iria apenas assistir a um assassinato. Hoje era sua iniciação.

A lama escalava as botas do jovem aprendiz. O breu noturno acolhia aos dois, furtivos por entre as árvores desfolhadas que ladeavam os arredores da ponte. O rio abaixo, outrora um rugir incessante, agora ecoava um grito mudo aprisionado nos últimos resquícios do gelo invernal.

Uma coruja observou o sorriso psicopata se aninhando nos lábios do brutamonte ao lado do rapaz. O sujeito musculoso riu do garoto de pele escura que ofegava trêmulo. Sob o capuz negro, vomitou seu sarcasmo:

— Pra tudo na vida existe uma primeira vez, não é mesmo?

— Será que não tem... outro jeito? — A indagação escorregou garganta afora. Gotas de gelo choviam por seu corpo, um suor incontrolável. — Talvez eu pudesse fazer isso sem ter que...

O sujeito de barba leonina respondeu com uma ameaça disfarçada de silêncio. Seus olhos eram canhões ansiando por qualquer sinal de traição que justificasse degolar o mancebo. Sem aviso, uma adaga surgiu em sua mão.

Ele a estendeu para o aprendiz, que hesitou. O garoto já viu aquela lâmina rasgar muitas entranhas antes, sempre sedenta e sádica. A arma era pequena, mas carregava o peso de muitas almas — literalmente. Ele sabia que hoje seria o mestre desse poder.

O jovem engoliu em seco e a mão insegura se apropriou da adaga. Sua pele estremeceu ao tocar o cabo ainda úmido de sangue.

A lua nova era um queijo escuro no céu. Ocasionalmente dava o ar da graça por entre as nuvens, revelando uma cicatriz enorme que atravessava o rosto do indivíduo musculoso. Era um rasgo diagonal que ia da sobrancelha direita até o canto esquerdo do queixo.

— Você se lembra de como fazer o ritual, Etherion? — o barbudo perguntou, agora estreitando os olhos amarelados em direção à ponte. Fungou como um lobo tentando farejar a presa, oculta nas entranhas da névoa onipresente.

— Óbvio que sim. — Seu tom era inconformado, cortejando uma irritação há muito contida. Dardejou um olhar de soslaio para o companheiro ao concluir: — Tive que ouvir isso vinte e três vezes na noite passada.

— Você estava contando? Eu estava era me divertindo com os gritos. Lembra daquela grávida? Ela implorou por sua mãe. Depois pelo marido. Depois pelo filho de cinco anos. E quando chegou na vez dela... ha, ha! Então me pediu para matá-la. Tsc, tsc. Escória.

Etherion desejou que ele a tivesse matado. Ao invés disso, teve que presenciar a pobre mulher ser torturada por três horas antes do golpe de misericórdia. Os gritos dela ainda ecoavam em sua cabeça.

Pesadelos brutalizaram sua noite anterior. Ossos rachando, tripas e miolos viscosos serpenteando por fendas de carne humana... A memória traumatizante só parou quando o trotar de cavalos se fez ouvir ao longe.

Eles estavam vindo.

— Se você falhar hoje, moleque — o timbre do sujeito era lento, como se espreitasse as palavras —, espero que saiba correr bem rápido.

— Não vou falhar — Etherion retrucou, fingindo uma coragem que não tinha.

Um buraco de ansiedade latejou em seu estômago. A coruja piou ao longe enquanto a brisa lhe assoprava um hálito glacial na nuca. O coração galopava muito mais rápido do que os cavalos brancos agora à vista.

A carruagem já estava atravessando a ponte.

Era agora ou nunca.


🐉💀 Palavra do Autor 👻👿

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