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A Batalha dos Mortos

Elizabeth se contorceu até escorregar da cela e machucar-se no chão árido. Podia sair correndo, mas concluiu que não seria tão fácil encontrar um galho cortante nessa floresta morta. De costas, suas mãos mergulharam no alforje que a caçadora tinha amarrado nas costas do pégaso prateado. 

Ela manteve a esperança de tatear alguma adaga para cerrar sua corda antes que eles notassem. E de fato, os dois inimigos estavam bem ocupados. O centauro careca com o tapa-olho tomou sua lança do chão e galopou contra Lorendell. Ele ergue a haste e a arremessa com ímpeto. 

A elfa usa suas lâminas duplas e pica a arma em pedaços antes que pudesse atingi-la. "Baixa qualidade," pensou. "Não deve valer nem vinte moedas de cobre." Ao invés de se esquivar, a arqueira correu na direção do adversário, que ainda avançava em sua direção.

 Ele ainda tinha a ponta da flecha irrompendo de sua testa, rios de sangue fluíam pela cara insípida. Quando parecia que ela seria atropelada pela criatura reanimada, Lorendell moveu-se para a esquerda e derrapou no chão. 

Os sabres deslizaram no ar e, com um corte meticuloso, amputaram as patas esquerdas do rival. O caolho não gritou, mas capotou imerso em uma chuva de sangue. Não havia tempo para recuperar o fôlego. O centauro decapitado estava quase sobre ela enquanto o mais velho apareceu ao longe, já retesando o arco e fazendo mira ao se aproximar.

Brontak estava pronto para o retorno do projétil enfeitiçado pela elfa. Os olhos brancos do homem com bochecha perfurada captaram a seta luminosa voltando. Ele embainhou sua espada longa e aguardou. 

Seu único movimento provinha da aura verde ondulando suas vestes manchadas e do sangue fluindo para a arma. Quando a flecha já estava a dois centímetros de sua testa, a mão com luva de couro interceptou o projétil.

Brontak precisou de toda sua força para conter a propulsão da magia. Enfurecido, partiu a flecha em dois, extinguindo seu encanto élfico. Logo em seguida, o barbudo com a cicatriz diagonal cravou a espada no chão e começou a recitar palavras sombrias.

Inesperadamente, o centauro sem cabeça não tentou atropelar a arqueira. Antes de alcançá-la, ele pulou até ela, planejando afundar suas patas na rival. Como um reflexo, Lorendell deu uma cambalhota para frente, passando por baixo do morto-vivo. 

Quando terminou de rolar, usou o sabre para rebater uma flecha quase na sua cara. Mas ela não contava com as outras três que vinham em seguida. Duas pegaram de raspão enquanto a terceira perfurou sua clavícula à esquerda. 

A dor aguda queimou a carne, o sangue espirrou ao vento. Sem demora, ela arrancou o projétil e o jogou para longe. Engoliu os espasmos do corpo e se concentrou na luta novamente. Quando ela se virou para o centauro decapitado, só viu dois cascos voando na sua cara. 

Ele deu um coice musculoso na caçadora, cujo impacto a decolou uns cinco metros no ar. Devido ao ferimento, ela não conseguiu manter o sabre esquerdo no punho, relegando-o ao chão. Antes de cair, Lorendell faz um impulso com as pernas e rodopia no ar para conseguir pousar ao invés de se espatifar. 

Mais projéteis estavam sendo tesados no arco, o centauro de barba branca parecia mais eficiente morto do que vivo. A lutadora de capa prateada retira o mangual da bolsa às costas e gira a corrente. A esfera espinhosa na ponta rodopia zunindo.

Como um escudo, parecendo um ventilador, a elfa bloqueia todas as flechas que acometeram contra ela. O zumbi sem cabeça não ficou parado: outra vez galopou contra a inimiga. Lorendell aproveitou o impulso giratório do mangual e atirou a arma contra as patas do centauro tal qual uma boleadeira.

A arma se enrosca nas patas dianteiras como planejado. A bola de espinhos espeta a carne e a criatura tomba durante a corrida, deixando um rastro carmesim no chão. A arqueira se aproxima e com o sabre direito mutila as patas da frente antes que o oponente consiga se levantar. Nervos escorregam em suco rúbeo por entre os ossos à mostra.

Em seguida ela faz um rolamento súbito, desviando de mais setas disparadas pelo mais velho. Ele ainda tinha a flecha vertical encaixada no seu crânio. Quando Lorendell se ergue do chão, embainha os sabres e tira o arco das costas, preparando o ataque.

O centauro estava mirando na elfa quando foi alfinetado por uma rajada de projéteis. Eles acertaram principalmente os tendões de todas suas juntas. Sem conseguir se mover, o zumbi foi ao chão. Todos os inimigos continuavam "vivos", embora incapacitados de continuar o combate. 

Foi então que a caçadora ouviu a voz deformada de Brontak repetindo uma frase bem alto:

— ANACRETON MNAERVUS YATANZAKNAR GONJAV SHANDRAESHNUR!

De repente, os três centauros explodem. Mas ao invés dos músculos, tripas e ossos se espalharem em todas as direções, eles começam a flutuar no ar. A massa de carne e sangue se concentra em um único ponto, formando um tornado. 

Ouve-se o som de esqueletos se encaixando, de órgãos glutinosos se revirando como se fossem massinha de modelar. Quando Lorendell deu por si, a aberração amorfa assumiu o formato de uma enorme garra com quatro dedos longos e afiados. Súbita, a mão de remendos acelerou-se, voando a incrível velocidade.

O ferimento na clavícula diminuiu drasticamente a velocidade da elfa, afetando sua agilidade. Após ziguezaguear na clareira por alguns segundos, os dedos viscosos e sanguinolentos a abraçaram com fúria.

— Canalha... — praguejou a caçadora enquanto a mão de remendos a trouxe flutuando para perto do barbudo de olhos brancos.

Brontak tira a espada do chão, dá um sorriso triunfante e indaga com sua voz aterradora:

— Últimas palavras?

— Vai tomar bem no olho do seu... — A lâmina lhe atravessa o coração, roubando o ar dos pulmões e desorbitando os olhos lilases da elfa.

A magia se desfaz: o corpo de Lorendell despenca no chão, imerso em um bolo pegajoso de órgãos, intestinos, pelos e ossos. Então Brontak ouve um relinchar. Quando vira a cabeça, vislumbra Elizabeth montada em cima do pégaso. Ela mostra o dedo do meio e esporeia a montaria, que decola do chão e voa distante no céu.

— VAGABUNDA!!!! — pragueja o necromante.