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                                                                                                              MIL ANOS ATRÁS

"Já disse que negociar com aquele demônio é uma péssima ideia, Bombadril. Do jeito que você é, ele poderia te vender suas próprias calças. Com juros," disse o dragão telepaticamente para seu mestre, um guerreiro anão que voava em seu dorso há horas.

— Você subestima minha inteligência, Snaugg! — retruca o pequenino, a barba ruiva tremelicando ao vento. — Tenho uma ideia imbatível. Além do mais, você sabe que sou o maior de todos os anões!

"Sim, claro. Falou o cara com um metro e trinta. Mas se te consola, acho que você tem dois centímetros a mais que a média."

Isso é o que minha ex costumava dizer, he, he.

"Sua ex era uma gnoma, cara. Um arbusto era uma selva pra ela."

Metralhado de resmungos, o dragão aterrissa no pico de uma montanha. A neve pincelava um tapete branco no terreno de rochas. O ar soprava incessante, amuado como um bocejo eterno. Em uma área plana, um pedestal estranho se erguia do chão. Era um braço de pedra em cujas garras repousava uma lâmpada dourada.

O dragão acompanhou o guerreiro até a mão pedregosa e o observou esfregando o artefato. Uma luz escarlate é emitida pelo objeto e uma fumaça é baforada. A nuvem logo se transforma em um sujeito de pele azul com sobretudo e cartola. Seus cabelos roxos davam aos ombros, eram curtos e encaracolados.

— Óh, poderoso Kamilzedek — reverenciou o anão —, Senhor do Sétimo Abismo! Vim para que realize meu desejo! Eu quero...

— Por mil dragões! — interrompe o demônio. — Me escondi em uma lâmpada minúscula no topo da montanha mais alta de uma ilha flutuante. E mesmo assim você conseguiu me encontrar. Não sei se te pulverizo ou se bato palmas. Qual seu nome, anão?

— Eu sou Dhöm Bombadril, filho de Drumbil, Forjador do Trovão, Herdeiro de Trawgakkyr, Herói de...

— Chega. Já deu no saco isso. O que você deseja?

— Não quer que eu conte como consegui te encontrar?

— Estou mais interessado em saber a que horas você vai embora. Desembucha logo.

O anão dá um largo sorriso. Tinha certeza de que ninguém na história jamais teve uma ideia tão fantástica como aquela. Ele faz um suspense antes de anunciar com toda pompa:

— Eu quero ter desejos infinitos!

O sujeito com chifres na cartola tem uma crise de risos. O dragão e seu mestre se entreolham, ondulando as sobrancelhas (não que o réptil tivesse sobrancelhas, claro). Quando Kamilzedek volta a si, satiriza:

— Tá se achando a última bolacha do pacote, né, queridão? Pode ir tirando o unicórnio da chuva.

O anão franziu o cenho, contrariado. Mas ele já tinha pensado na hipótese desse desejo não poder ser atendido. Então ele pôs em prática seu plano B:

— Tá. Já que é assim, eu quero... a imortalidade!

— Nem que o trasgo tussa! Se você não morrer, eu não vou ter sua alma. Aí fico sem pagamento. Tá achando que eu trabalho de graça, é?

Bombadril fechou a cara..

— Mas que diabos de demônio é você?

— Do tipo impaciente. Anda logo antes que eu mude de ideia.

— Eu mereço, viu... Tá, tá. Já sei! Eu quero...

— Demorou muito. — Quando o Kamilzedek estalou os dedos, o anão se transformou em uma formiguinha e o dragão, em uma vespa.

O azulão ergueu seu pé com sapato de ponta curvada e pisou os dois. Ele revirou os olhos roxos e concluiu:

— Quanta audácia me acordar a essa hora da tarde. Ninguém merece esses mortais!

De repente um tentáculo gosmento surge de um brilho no bico da lâmpada. Ouve-se então uma voz feminina dizer:

— Volta pra cama, gatão! Senão eu e as meninas vamos brincar sem você, hein...

— Tô indo! — responde Kamilzedek, esfregando as mãos. Ele dá um pulo em direção ao artefato como se estivesse saltando de um trampolim.

Uma luz rúbea pisca no local, fazendo ele e o tentáculo desaparecerem. No alto da montanha, uma lâmpada dourada ficou chacoalhando por longas horas...

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