Capítulo 12

22 1 0
                                    



Capítulo 12

Quando Clara chegou em casa, já estava quase amanhecendo. O céu estava começando a clarear quando ela abriu a porta e encontrou Aline sentada em uma das bancadas da cozinha. Sua cabeça já começava a latejar, sinal de que a ressaca se aproximava.
- Oi – Elas disseram juntas.
- Como foi a festa? – Aline perguntou, dando uma garfada no que estava comendo.
- Até que me diverti, no fim das contas. - Clara fez um balanço mental do resto da festa. Depois que Pedro foi embora, ela não parou de dançar. Precisava mesmo se distrair - Fred e eu dançamos – Ela jogou a bolsa no sofá e se aproximou.
- Sério?! Poxa, faz tanto tempo que não vejo vocês dançarem...
- O que você ta comendo? – Clara perguntou, olhando para o prato de Aline.
- Manga com shoyu – Aline sorriu com a boca cheia.
Antes que Clara pudesse responder, ela sentiu que todos aqueles rodopios que dera com Fred misturado com toda a cerveja que havia tomado estavam fazendo efeito. Ela saiu correndo para o banheiro e pôs tudo para fora.
- Eita... – Aline murmurou enquanto escutava a amiga passando mal. Ela deu mais uma garfada em sua manga com shoyu, mas não chegou a engolir. Aline também saiu correndo e agradeceu mentalmente por terem dois banheiros em casa.
Mais tarde naquele dia, Clara estava completamente acabada e largada no sofá.
- Você ta bem? – Aline perguntou.
Clara levantou o polegar em sinal de positivo.
- Apenas mais uma ressaca – Ela disse.
- Eu vou até a casa da minha mãe.
- Vai com a Diabinha – Clara disse e indicou a chave, que ficava dentro de um vaso.
- Eu me sinto péssima com isso, sabe? Te dando despesas, usando seu carro...
- Cala a boca e saia logo daqui. A única coisa que você ta me dando agora é dor de cabeça com essa ladainha sem fundamento.
Aline riu e saiu.
Já no trânsito, ela teve de ser muito forte para não mudar o caminho e ir até a casa de Márcio. Chegou até a pensar no que falar, caso realmente fosse. Mas foi forte e, por fim, estacionou em frente a casa dos pais. Aline tocou a campainha e, segundos depois, sua mãe atendeu, secando as mãos em um pano de prato.
- Oi, filha! – Ela sorriu e as duas se abraçaram.
Aline e a mãe entraram e foram para a sala, onde o pai estava.
- Oi, pai – Aline o cumprimentou. Ele apenas fez um gesto com a cabeça, sem desgrudar os olhos do futebol.
Aline e a mãe reviraram os olhos.
- Vem aqui, eu to terminando de fazer um bolo – A mãe disse, já indo para a cozinha. Aline a seguiu e desabou em uma das cadeiras com encosto de madeira alto.
- Hum, bolo de laranja! – Aline inalou o delicioso aroma do bolo que a mãe tirava do forno.
- Sim... Me diz, como você está? – A mãe a olhou de esguelha por cima do ombro.
- Ah, eu to viva, né? – Aline deu de ombros.
- Nenhuma notícia do Márcio?
- Não, mãe...- Aline soltou um grande suspiro – E na verdade, eu não quero. Não quero que ele faça parte da minha vida. Não quero pensar em advogados e testes de DNA. Pelo menos não agora.
A mãe de Aline desenformou o bolo e o pôs em cima da mesa, sentando-se de frente para a filha. O bolo quentinho estava entre as duas, emanando um cheiro delicioso por toda a cozinha.
- Eu sei que você vai conseguir passar por isso. Você não está sozinha, e sabe disso.
- Mãe, eu conheci um cara...
Então Aline contou sobre Caio. Como haviam se conhecido e como se aproximaram depois. Ao fim do relato, sua mãe não disse nada. Apenas balançou a cabeça.
- Eu já te contei como conheci seu pai, não?
- Sim... Na quermesse da igreja do bairro... – Aline falou com a voz arrastada.
- O que eu não te contei é que eu já estava noiva quando o conheci – A mãe de Aline sorriu, atraindo a atenção da filha.
- Sério? – Aline ajeitou-se na cadeira.
- Sério. Eu namorei este outro rapaz por dois anos e estávamos noivos havia seis meses, quando conheci seu pai.
- E como você soube que o papai era o cara certo?
- Eu não dei bola pra ele no dia da quermesse, afinal eu era uma moça comprometida. Mas ele não desistiu – A mãe de Aline sorriu com a lembrança – Em uma semana ele me fez sentir coisas que eu não tinha sentindo em anos de namoro. O principal: ele me fez sentir segura e amada.
- Que lindo, mãe!
- Eu sei que o momento não parece propício. Mas eu acredito que ninguém entra em nossas vidas por acaso. Você só precisa ter calma, porque é assim que tudo se ajeita. E não se esqueça: jamais se feche para o amor.
Enquanto as duas tomavam café com o bolo de laranja, Aline ficou pensando nas palavras da mãe. Como sempre, ela estava coberta de razão.
Depois do café, as duas foram para a sala. O pai de Aline estava sentado na ponta de sua poltrona cinza desgastada. Os olhos ainda grudados ao jogo que passava na televisão, ele tinha as mãos juntas e os cotovelos apoiados nos joelhos.
- Tchau, pai – Aline disse.
Mas ela se despediu bem quando o time de seu pai fazia um gol.
- GOOOOOOL! – Ele gritou e a abraçou. Aline riu, mas sentiu um enorme alivio ao perceber que, não, seu pai não a odiava.
Ela saiu da casa dos pais com a sensação de que as coisas estavam seguindo o rumo certo.

Clara já estava cansada de ficar em casa curando a ressaca que, no fim das contas, nem havia sido tão forte assim.
Ela estava com uma receita na cabeça, mas não tinha certeza dos ingredientes. Então lembrou-se que havia comprado um livro novo, mas o deixara no restaurante. Clara chamou um táxi enquanto pegava o elevador e, quando entrou no carro, passou para o motorista o endereço do The Licious.
Meia hora depois, ela estava abrindo a porta de seu restaurante. Domingo a noite, com todas as luzes apagadas e sem ninguém, o lugar parecia totalmente diferente. Por alguns instantes, Clara ficou parada no hall tentando lembrar-se de onde estava o livro.
Clara passou pelas mesas vazias e pela porta fechada do escritório de Fred, a qual fez menção de abrir, mas então lembrou-se que o livro estava na cozinha. Clara entrou às escuras e estava esticando-se na ponta dos pés para pegar o livro que estava em uma das prateleiras, quando um barulho ao fundo lhe chamou a atenção. Ela engoliu em seco, agora com medo de não estar sozinha. Lentamente Clara tateou a parede e encontrou o interruptor. Assim que a forte luz branca iluminou a cozinha, Clara virou-se para os fogões que ficavam ao fundo e ficou totalmente sem reação ao ver Pedro e Isabella. A garota estava sentada em cima de um dos fogões, que tinha o tampo abaixado. Ela estava com a saia azul enrolada até o meio das coxas e tinha o batom borrado. Pedro estava entre suas pernas, o cabelo totalmente bagunçado e o batom vermelho da namorada espalhado pelo rosto.
A expressão em seu rosto refletia a de Clara: também estava totalmente sem reação.
Ao contrário de Isabella, que mordia o lábio inferior para evitar a gargalhada.
- Clara... – Pedro sussurrou e foi o que bastou para Clara se mexer.
Ela parecia ter levado um choque. Em questão de segundos, puxou o livro da prateleira e saiu da cozinha. Ela ouviu Pedro a chamar, mas não parou. Cruzou o salão vazio e escuro e saiu para a noite fresca. Ela não se incomodou em trancar a porta. Clara procurava o celular na bolsa para chamar o táxi, quando Pedro saiu do restaurante.
- Clara, me desculpa! – Ele apressou-se em dizer, aproximando-se da garota. – E-eu sei que fiz merda. Mas a Isa insistiu para conhecer o restaurante.
- Pedro! – Clara finalmente encontrou sua voz – Você estava transando com a sua namorada, no meu restaurante. EM CIMA DO MEU FOGÃO! – Ela gritou e Pedro engoliu em seco.
- Não estávamos transando.
- Não estavam porque eu cheguei bem na hora. QUAL É O SEU PROBLEMA?!
- Me desculpa! A gente acabou se empolgando! – Pedro passava as mãos furiosamente pelos cabelos.
Clara finalmente encontrou o celular e foi andando na direção contrária do rapaz.
- Aonde você vai?! – Pedro gritou e foi atrás dela.
- Eu vou embora, porra! Pode voltar e terminar o que você estava fazendo.
- Você ta sem carro? Eu te dou uma carona!
- Pelo amor de Deus, Pedro! – Clara parou de andar e virou-se de frente para ele – Eu to com tanta raiva de você neste exato momento que apenas queria que um piano caísse na sua cabeça! – Ela disse e última parte entre dentes e então pediu o taxi.
Pedro olhava pra ela, mais uma vez sem reação. Clara terminou a ligação e atravessou a rua, ficando na padaria que havia na esquina.


Quando tudo aconteceDonde viven las historias. Descúbrelo ahora