Capítulo 63

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Capítulo 63

Eles ficaram no litoral por mais três dias e então voltaram para São Paulo. O clima era de férias, porém eles precisavam trabalhar. Clara se despediu dos amigos com um abraço mais longo do que o habitual e foi com Pedro para sua casa. Eles estavam cansados da viagem, mas ela não poderia mais adiar aquele momento.
Pedro estava deitado em sua cama e Clara o observou por alguns segundos antes de se aproximar. Ele estava com a barba por fazer e o cabelo preguiçosamente bagunçado, do jeito que ela gostava. As tatuagens adornavam seus músculos e os olhos pareciam dois pedacinhos do céu. Clara se aproximou e deitou-se ao seu lado, de frente pra ele.
- Como você ta?
Pedro sorriu antes de responder.
- Melhor que ontem.
Clara esticou a mão e passou seus dedos por entre dos fios de cabelo loiro dele. Pedro fechou os olhos por um instante.
- Me desculpa. Me desculpa por não ter sido honesta, por não ter dividido essa parte da minha vida com você. Eu não me orgulho disso... – A voz de Clara foi sumindo.
Pedro abriu os olhos e a encarou. Clara engoliu em seco.
- Tudo bem. O Fred me contou, você sabe... – Ele deu de ombros – Eu estava esperando você trazer o assunto a tona.
- Eu tenho um problema, Pedro. Eu entendo isso. E quero melhorar. Vou me internar em uma clínica de reabilitação.
Pedro apertou os lábios em uma linha fina e balançou a cabeça.
- Eu não posso continuar desse jeito e não quero. Quero me libertar de tudo isso...
- Você ta fazendo a coisa certa – Pedro acariciava a bochecha de Clara.
- O tratamento pode ser longo, sabe... – Pedro balançou a cabeça, ainda acariciando a bochecha dela. – Eu não quero mais ser um peso na vida de ninguém, Pedro. Principalmente na sua. Você não merece alguém como eu, uma drogada.
Pedro franziu o cenho.
- Clara, não fala assim. Você não é um peso, pelo contrário. Você é o amor da minha vida – Ao ouvir essas palavras, Clara se arrepiou. Ela mordeu o lábio.
- O tratamento vai ser longo, Pe. E eu escolhi não te levar pra esse momento. Não vai ser fácil, não mesmo. Mas eu não quero que você me veja em estado de abstinência.
Uma parte de Clara dizia-lhe que ela estava sendo tremendamente egoísta e insensível ao abandonar Pedro. Ele ainda não havia superado a morte de sua mãe, ainda estava recente. Porém, outra parte dela sabia que isso era o certo a ser feito. Por ela e também por ele. Pedro merecia que ela ao menos tentasse se curar.
- Clara, eu não vou te abandonar. – Pedro disse, seus olhos estavam sérios e Clara sentia seu coração se quebrando em vários pedacinhos.
- Você não ta me abandonando, meu amor. Mas eu escolhi isso. Não vou te prender a mim sendo que vou ficar sabe-se lá quantos meses em tratamento. Não vou fazer isso, Pedro. Você vai ficar aqui fora, vai viver sua vida.
Pedro sentou-se na cama de Clara e ela fez o mesmo.
- Quando você vai? – Ele perguntou.
- Amanhã de manhã. Antes eu preciso fazer uma coisa...
Clara contou para Pedro sobre Martin. Toda a história, desde a época de Samuel.
- Agora eu preciso pagar essa tal dívida.
Pedro ficou em silêncio.
- Eu vou com você – Antes que Clara pudesse dizer algo, Pedro concluiu – Por favor, Clara. Não me peça pra te deixar ir até um traficante sozinha.
Antes de saírem, Clara mandou uma mensagem de texto para Martin, avisando que passaria em seu apartamento. Agora ela tocava a campainha e esperava que ele abrisse a porta.
- Angel – Martin sorriu com sua voz melosa, mas o sorriso se desfez assim que viu Pedro – Quem é esse?
- O namorado dela – Pedro disse, entrando no apartamento atrás de Clara.
Martin fechou a porta e o sorriso estava de volta ao seu rosto.
- Angel, querida, por que a pressa? Estávamos nos divertindo tanto...
- Pega logo o seu dinheiro, Martin – Clara estendeu um envelope estufado com notas de cem reais.
- Eu e o Surfista vamos sentir sua falta... – Martin continuava falando enquanto conferia a quantia. Clara revirou os olhos. – Bem, está tudo certo.
- Na verdade, está faltando uma coisa.
Então tudo aconteceu muito rápido. Pedro partiu pra cima de Martin e lhe acertou um soco no maxilar. Martin mal teve tempo de se recompor e Pedro lhe acertou de novo, dessa vez no nariz. Clara gritou ao ver o sangue jorrar. Pedro e Martin se embolavam pela sala. Pedro o empurrou e Martin caiu por cima da mesa de centro, quebrando o tampo de vidro.
- Pedro, para! Para! – Clara estava desesperada. Pedro agora estava por cima de Martin e lhe socava repetidamente no rosto. Clara se aproximou por trás e puxou o namorado. Pedro tinha um corte no lábio e na testa, além de sangue respingado por toda sua camisa branca.
No chão, Martin ria enquanto tentava se levantar.
- Gostei do seu namorado, Angel.
- Cala a boca! – Pedro gritou – Você nunca mais vai aparecer na vida dela!
- Vamos embora! – Clara saiu do apartamento puxando Pedro.
Clara tremia, mas mesmo assim dirigiu o mais rápido que conseguiu até a casa de Pedro. Ele, por outro lado, estava bem tranquilo com toda aquela situação. Ele tirou a camisa e limpou superficialmente seus ferimentos, jogando a camisa, agora encharcada de sangue aos seus pés. Clara percebeu o desconforto dele com todo aquele sangue mas ao menos ele não desmaiou dessa vez. Ela suspeitava que Pedro precisava extravasar toda sua fúria e preferiu fazer isso com Martin, ao invés do saco de areia, como de costume.
Clara limpava os ferimentos de Pedro e tentava se acalmar. Ela nunca teve medo de Martin e sabia que ele não lhe faria nenhum mal físico, mas agora estava preocupada com Pedro.
- Eu não vou pedir desculpa por socar aquele filho da puta... – Pedro disse enquanto Clara limpava o ferimento em sua testa.
- Isso foi burrice, Pedro! E se ele vier atrás de você?!
- Eu não ligo! Clara, eu vou até a polícia...
- Não é simples assim!
- Fica tranquila, ele não vai vir atrás de mim.
Clara terminou de fazer os curativos em silêncio e Pedro não parecer se importar com isso.
Ela estava lavando as mãos, quando Pedro a abraçou por trás.
- Eu amo você... – Ele disse em seu ouvido, passando o nariz em seu pescoço.
- Pedro... Você entendeu o que eu disse mais cedo? Não vamos ficar juntos. – Clara sentiu as palavras saírem de sua boca como cacos de vidro.
Pedro a virou de frente pra ele.
- Amanhã. – Ele disse, olhando-a nos olhos. – Hoje ainda somos um só.
Pedro a beijou e Clara sentiu que aquele era mais que um beijo de despedida. Era um beijo de declaração. Declaração de amor, de cumplicidade, companheirismo e desejo. Pelo resto da noite ele a amou e eles foram um só.
Quando Pedro acordou na manhã seguinte, Clara não estava mais lá.


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