Quando tudo acontece

Capítulo 43

Capítulo 43

Clara sentia falta de Aline, isso era um fato incontestável. Queria compartilhar com a amiga o nervosismo e a ansiedade que estava sentindo: iria jantar na casa da mãe de Pedro e ser apresentada a toda sua família.
Fazia muito tempo que não passava por tal situação, estava sentindo-se adolescente novamente e sabia que Aline conseguiria acalmá-la.
Mas ela ainda estava chateada, ainda mais depois do que leu.
Clara estava esvaziando sua bolsa para arrumar para o jantar. Dentre as coisas que tirou, estava a uma das agendas de Aline. A mesma na qual estava guardada a foto com Gian.
Clara segurou a agenda por alguns instantes. Se fosse em outra circunstância, jamais teria pensado em abrir. Mas, lá estava ela, com a agenda de Aline. A mesma agenda que ela guardava sua foto com Gian. Aquilo tinha que significar algo, certo? Sem pensar mais, Clara abriu a agenda. Pelas datas, era de quase quatro anos atrás. Clara passou as primeiras páginas, nada prendeu sua atenção. Até que seus olhos captaram o nome do ex namorado, parecia ser a primeira vez que Aline escrevia sobre ele. Clara continuou lendo as páginas e foi um mês depois da primeira anotação sobre Gian que Aline dormiu com ele. No dia em que acontecera, Aline não escreveu em detalhes. No meio da folha estava "Eu sou uma péssima pessoa.", apenas.
Mas o que realmente magoou Clara, foi uma anotação de dias antes.
"Não gosto desse namorado da Clara. Não gosto mesmo. Ela merece coisa melhor, isso é tão óbvio. Acho que no fundo ela sabe disso também. Mas não vou falar muito sobre isso, ela está feliz...
Outra coisa que me incomoda é o fato de que eles não combinam, nenhum pouquinho. A Clara, com todas aquelas tatuagens e aquele cabelo platinado e ele todo engomadinho, camisa polo e tudo o mais. Ele é bonito, é sim. Mas não com ela. E já percebi a forma como ele olha pra mim, me comendo com os olhos. Tenho certeza que isso incomoda a Clara, mas ela tem que entender que nem todo homem só quer saber de bunda e peitos! Inteligência e elegância contam muito também.
Entretanto, tenho que confessar: minha autoestima agradece todos aqueles olhares indecentes, haha.
Clara fechou a agenda com força e a arremessou do outro lado do quarto. Ela jogou-se na cama e expirou com força, fechando os olhos.
Quando começou a namorar com Gian, Aline estava passando por uma fase muito tóxica, como Fred gostava de chamar. Seu irmão estava com casamento marcado e toda a atenção da família ia para ele. Aline decidiu sair de casa e ir atrás de sua tão sonhada independência. Porém, ela sentia-se muito sozinha, já que Clara e Fred estavam super atarefados com a abertura do restaurante. Parando para pensar, Clara percebeu que a insegurança de Aline sempre esteve presente com elas. Na adolescência, Aline resolveu que queria emagrecer e fez uma dieta maluca. Ela atingiu seu objetivo, mas sempre fora insegura. Sempre comparando-se com Clara: ela era magra, mas sem muitas curvas, acabou ficando mais alta que Clara. Já Clara sempre fora baixinha, os seios fartos e bem acinturada. Sempre que iam a alguma festa, Aline fazia de tudo para que Clara não usasse decote ou saia. Ela precisava ser notada e, mais tarde, precisava ser desejada por todos. Até mesmo pelos namorados de Fred.
De tanto pensar no passado, Clara pegou no sono. Acordou atrasada, mas conseguiu se arrumar a tempo. Agora, estava observando seu reflexo no espelho, sentia falta de sua melhor amiga. Com todos os seus defeitos e suas brigas.
Pedro mandou uma mensagem avisando que já estava em frente a seu prédio. Clara deu uma última conferida no cabelo, pegou na cozinha a torta holandesa que havia preparado e desceu.
Ela entrou no carro e inclinou-se para selar os lábios de Pedro, mas ele ficou imóvel, apenas encarando-a.
- Que foi?! – Clara perguntou.
- O que aconteceu com seu cabelo? – Um vestígio de sorriso já despontava nos lábios de Pedro.
- Decidi voltar às raízes – Clara deu de ombros, mas corou. Ela odiava sentir-se assim, tão vulnerável na presença de Pedro. Mas só porque não estava acostumada a receber os olhares que ele lhe lançava. Estava tão apaixonada e, cada vez que Pedro sorria, Clara entendia o significado da famosa frase clichê "borboletas no estômago".
Pedro esticou os dedos e os passou por entre os fios de Clara que, agora, estavam pretos.
- Achei que fosse impossível você ficar mais linda mas, como sempre, você me surpreendeu.
Ele sorriu e Clara acabou com a distância entre eles e o beijou.
- Certo... – Ela foi se afastando dele, lentamente – Vamos mostrar toda essa beleza aqui para sua família!
Pedro riu e saiu em direção à casa de sua mãe.