Capítulo 35

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Capítulo 35

Pedro até tentou convencer Clara a ir direto para casa, mas ela estava ansiosa demais para ver o restaurante. Pedro mal terminou de pagar o taxista e Clara já estava saltando do carro. Eles pegaram suas bagagens no porta malas e, finalmente, Clara abriu a porta do The Licious.
- Que porra é essa?! – Clara falou alto demais, atraindo os olhares dos clientes que estavam por lá.
- Clara! – Mari, a recepcionista, saiu apressa de trás do balcão e foi até ela com o Black Power descolorido balançando. – Achei que vocês só voltassem segunda! – Mari a abraçou e depois abraçou Pedro.
- Pois é, voltamos um pouco mais cedo... – Clara ainda estava chocada com a nova decoração do restaurante.
- O que aconteceu aqui?
- A Aline e o Fred resolveram redecorar – Mari respondeu.
- Ficou ótimo – Pedro disse.
- Os clientes também adoraram – Mari sorriu, voltando para o seu posto.
Depois de uma rápida parada na cozinha, só para conferir se estava tudo bem, segundo Clara, eles chamaram um táxi para irem para casa.
- Pode dizer que você também gostou – Pedro disse, referindo-se à nova decoração.
- Eu gostei, gostei sim. Apenas acho que eles deveriam ter me consultado antes – Clara fez um pseudo bico e Pedro a abraçou de lado. Minutos depois, o motorista estacionou em frente ao prédio dela.
- Tem certeza que não quer que eu fique? – Pedro perguntou.
Era o que ela mais queria. Mas Clara sabia que precisava conversar com Gian antes.
Pedro também saiu do carro para ajudá-la com sua bagagem. Ela se aproximou dele e segurou seu rosto.
- Você sabe que isso é o que eu mais quero agora – Cada vez que Clara o olhava nos olhos, ela se perdia naquele azul. – Mas eu preciso resolver logo aquela questão – Clara enfatizou.
- Eu to com medo – Pedro confessou e riu – De que ele te convença a ficar... Sabe?
Pedro estava meio corado. Ele, agora, segurava as mãos de Clara, entrelaçando seus dedos. Clara sentia o coração disparando.
- Isso não vai acontecer. – Ela se aproximou dele e ficou na ponta dos pés para sussurrar em seu ouvido – Eu to apaixonada por você.

Clara estava largada em sua cama. Por mais que o quarto em que ficava hospedada na fazenda fosse super confortável, estava com saudades de sua cama. Ela se espreguiçou e ficou de barriga pra cima, fitando o teto. Talvez Aline voltasse ainda esta noite. Estava louca para lhe contar todos os detalhes da viagem, mas estava mais ansiosa ainda para contar sobre Pedro...
Pedro...
O suspiro foi inevitável. E inevitável também era a constatação de que, sim, estava apaixonada. E havia se declarado há alguns minutos. Achou extremamente fofa a insegurança de Pedro. Só então ela se lembrou de que Pedro também precisava conversar com Isabella. Mas ele também estava apaixonado, certo? Se não estivesse, pra que faria toda aquela cena na Casa de Julieta?!
Independente disso, Clara iria conversar com Gian. Pegou o celular e digitou uma mensagem:

Estou indo para o flat. Esteja lá em uma hora.

Ela enviou e ficou satisfeita consigo mesma: nunca tinha sido tão incisiva com ele.
Clara ignorou o cansaço e tomou um banho rápido. Enquanto dirigia para o flat, ficou surpresa por não estar nervosa. Pelo contrário, estava ansiosa para terminar aquilo logo. Não seria hipócrita a ponto de dizer que não amou Gian. Porque amou. Mas aquele sempre foi um relacionamento que a machuvaca mais do que fazia bem. Na verdade, a felicidade era instantânea. Quando passavam o final de semana juntos, não se falavam durante toda a semana. Quando se viam durante a semana, ela sabia que não poderia, jamais, tentar falar com ele durante o final de semana. Viviam se policiando e era Clara quem sempre saía machucada. Ela simplesmente não sabia como havia conseguido levar aquela vida por quase três anos. Era desgastante e nenhum relacionamento deveria ser assim.
Quando Clara entrou no flat, viu que Gian já estava lá. Ele estava sentado na ponta do sofá. Uma taça de vinho pela metade. Ao ver Clara, ele se adiantou até ela.
- Ainda bem que você resolveu me responder – Gian disse e tentou abraçá-la, mas Clara habilmente desviou de seus braços estendidos. Ela passou por ele e ficou parada em frente a porta da varanda, os braços cruzados.
- Precisamos conversar.
- Sim, eu sei. Eu estava tão agoniado, Clara! Não faz mais isso... – Ele tentou se aproximar, mas Clara deu um passo atrás.
- Gian, me deixa falar. – Ela olhou diretamente para ele e ele sentou, tomando mais um gole de seu vinho.
- Eu não consigo mais fazer isso – Clara começou, mas então Gian a interrompeu. Ele levantou e foi até ela.
- Clara, eu não sabia que você ia estar na galeria. Eu simplesmente não sabia, eu juro!
- É lógico que você não sabia. A gente não se falava há dias!
- Porque eu estava viajando com ela!
- Exatamente. E isso não deveria ser um problema...
- O que você quer que eu faça?
- Nada, Gian... Você não precisa fazer nada. Quem vai fazer sou eu.
- O que você vai fazer?
Clara passou por ele e deixou em cima da mesa de centro a sua cópia da chave do flat. Aquela chave era o que melhor poderia simbolizar o relacionamento dos dois: secreto e errado.
- O que você ta fazendo?! – Gian elevou a voz, pegando a chave.
- Eu não quero mais! Não quero mais isso – Clara fez um gesto, abrindo os braços. – E não quero mais a gente também.
Gian a encarava, em silêncio. Clara se aproximou.
- Gian, eu te amei. De verdade. Mas não é isso o que eu quero pra minha vida. Isso sempre foi errado, e você sabe. Não é justo com ninguém! E eu realmente não mereço isso.
- A gente pode fazer isso dar certo, Clara!
Clara engoliu em seco. Era a primeira vez que Gian falava sério sobre fazer dar certo. Ao menos parecia ser sincero. Mas também era a primeira vez que ela sentia que deveria seguir em frente, sem ele.
- Não, Gian. A gente não pode. E dentre tantas coisas, eu tenho dois motivos bem consistentes: eu não estou mais apaixonada por você e você nunca vai largar sua mulher.
O rosto de Gian era um misto de emoções, mas a raiva era a que se destacava.
- Você não está mais apaixonada por mim? – Gian perguntou, em total descrença. Ele terminou a taça de vinho e então começou a beber na própria garrafa.
- Desculpa... Me desculpa. Mas certas coisas a gente simplesmente não controla.
Gian deu um enorme gole. Ele balançou a cabeça, olhando para Clara.
- Tem razão, sabe? A gente não pode fazer dar certo...
Clara quase esboçou um sorriso, parecia que ele estava entendendo o lado dela. Mas então ele continuou – Eu não te amava, Clara. Eu nunca te amei. Eu só queria te foder.
Inicialmente, as palavras de Gian causaram um choque em Clara. Mas então ela entendeu. Era apenas Gian sendo Gian: já que as coisas não saíram como ele queria, ele ia desdenhar.
- E eu não vou mesmo largar a minha mulher. Ela é tudo o que eu preciso.
Clara fechou os olhos e respirou fundo.
- Ótimo, Gian. Espero que vocês sejam muito felizes – Ela disse, já indo até a porta.
- Nunca mais me procura, Clara!
- Com certeza eu não vou fazer isso, babaca! – Clara bateu a porta com toda força e chamou o elevador.
Nos poucos segundos em que o elevador demorou para chegar, Clara percebeu que tremia. Tremia de raiva. Talvez devesse ter falado umas verdades, mas, pensando bem, ele não valia suas palavras. Ela queria ter terminado de forma civilizada, mas devia saber que Gian ia querer sair por cima na situação.
Enquanto apertava o botão para o térreo, seu celular vibrou e ela pegou o aparelho para ler uma mensagem de Pedro:
To oficialmente solteiro. Não quer passar aqui em casa pra mudar esse status?
Clara riu sozinha e adorou perceber que, mesmo por mensagem, Pedro a fazia bem de verdade. Sem pensar muito, Clara entrou no carro e dirigiu até a casa de Pedro. Enquanto estacionava, ela lembrou-se de uma frase que a Tia Millicent falava em Peter Pan: "depois da tempestade, sempre vem a bonança". Mais uma vez ela riu sozinha, enquanto apertava a campainha. Segundos depois, Pedro abriu a porta. Ele vestia apenas um moletom preto. A pele clara tinha tatuagens nos braços e na parte debaixo da barriga definida. Clara interrompeu o riso pra engolir em seco. Aquilo tudo, agora, era dela. O pensamento fez com que suas bochechas esquentassem.
- Ta rindo do que? – Pedro perguntou, enquanto fechava a porta atrás de si.
- Na-nada não... – Clara gaguejou, olhando ao redor e se dando conta de que nunca estivera ali antes. A casa de Pedro era bem espaçosa. As paredes eram brancas e amarelas, o que deixava o ambiente bem iluminado. Um enorme sofá cinza em forma de L ficava no canto oposto da sala. Um delicioso cheiro de tomate seco vinha da cozinha americana e o estômago de Clara roncou baixinho, fazendo-a perceber que não havia comido nada além do lanchinho no avião. Alguma música do Coldplay tocava baixinho.
- Então... – Clara disse, virando-se para Pedro que estava saindo da cozinha depois de desligar o fogão – Você ta solteiro...
- Achei que você deveria ser a primeira a saber – Ele sorriu, caminhando lentamente até ela. Clara sentiu a ansiedade aumentando com o frio que surgiu na barriga.
- Algum motivo em especial? – Clara deu de ombros, já sentindo o calor que Pedro emanava para ela
- Pra fazer isso...
Ele acabou com a pequena distância que havia entre os dois e colou seu corpo ao dela. Clara o abraçou pelos ombros, ficando nas pontas dos pés enquanto Pedro juntava seus lábios. Seu coração batia tão rápido que ela sentia a pulsação nos ouvidos. A língua de Pedro se moldava à sua, movendo-se em sincronia. Ele desceu as mãos para a cintura dela e apertou, enquanto as dela se ocupavam em explorar suas costas. Pedro desceu mais as mãos e as encaixou na parte de trás de suas coxas, pegando-a no colo. Clara mordeu suavemente seu lábio em aprovação quando encaixou suas pernas ao redor da cintura dele e, sem quebrar o beijo, Pedro caminhou com ela até o quarto.
Diferente da sala, o quarto era bem escuro. Iluminado apenas por algumas velas espalhadas em cantos estratégicos no chão. Clara se perguntou se era sempre assim ou aquela era uma ocasião especial. Fez um lembrete mental para perguntar depois, quando sua boca não estivesse tão deliciosamente ocupada beijando o pescoço macio e tatuado de Pedro.
Pedro a deitou na cama e pairou sobre ela apenas por pouquíssimos segundos, até Clara o puxar para si e recomeçar o beijo. As mãos dela desciam por suas costas e brincavam com o elástico de seu moletom. Em um movimento rápido, Pedro deixou-a por cima e, com as duas mãos por dentro de sua fina blusa branca, começou a despi-la. O coração de Clara martelava no peito. Os olhos de Pedro ardiam em sua direção, demorando-se no sutiã preto meia taça. Ela se livrou de sua calça jeans e voltou a beijá-lo. Primeiro os lábios, e então o queixo, o pescoço, o peito e barriga e descendo cada vez mais, até tirar sua calça junto com a boxer também preta.
Mais tarde, naquela noite, Clara lembrou-se de agradecer a Fred por contratar Pedro.

Clara acordou lentamente. À medida que despertava, flashes da noite passada invadiam sua mente. Ela abriu os olhos e viu que Pedro ainda dormia, com o rosto virado parado o lado oposto, mas a mão sobre a barriga dela. Clara sorriu sozinha e se aproximou apenas um pouco, o suficiente para sentir o cheiro maravilhoso que ele tinha. Ela observou o quarto que, com a janela fechada, ainda estava escuro, mas reparou em um mural de fotos na parede de frente à cama. Infelizmente, seus olhos captaram cabelos vermelhos em uma das fotos da parte inferior do mural. Então Clara sentiu um frio na barriga, mas dessa vez não era bom como o que sentiu na noite passada.
Um pensamento irritante não saía de sua cabeça. Sem conseguir se contar mais, Clara chacoalhou Pedro.
- Acorda... Vai, Pedro... Acorda!
Finalmente ele abriu os olhos. Azuis, tão azuis. Clara mordeu o lábio para manter o foco.
- O que aconteceu? – Ele perguntou, a voz rouca de sono.
- Você terminou com a Isabella.
- Sim... – Pedro espreguiçou-se, enrolando suas pernas com as de Clara.
- E você fez isso tão facilmente...
Ele esfregou os olhos e olhou para ela, o cenho franzido.
- Acho que não to entendendo...
Clara se desvencilhou dele e sentou na cama, apoiando as costas na cabeceira e cobrindo os seios com o edredom.
- Pedro, você simplesmente... Terminou com a menina!
Pedro olhava para ela, ainda sem entender. Na verdade, Clara estava com medo. Pedro terminara o namoro sem pensar duas vezes. Talvez fizesse o mesmo com ela.
Pedro limpou a garganta e também sentou na cama.
- Eu fiz o que já devia ter feito há muito tempo. Na verdade, aquilo nem era um namoro. Isabella e eu não éramos exclusivos, apesar do título... – Pedro riu de leve, balançando a cabeça – Eu sabia que ela ficava com outras pessoas. No começo eu também ficava, e tava ótimo pra mim! Mas, sei lá... Acho que to ficando velho – Pedro sorriu, batendo de leve seu ombro no de Clara.
- Hum... – Ela mordeu o lábio – Eu não sabia disso...
Lentamente, Pedro tirou o edredom de Clara e se posicionou entre suas pernas, sem tirar os olhos dos dela.
- Eu não vou a lugar algum... – Ele disse entre beijinhos – E se eu for, você vai comigo.

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