Capítulo 5 Parte 1

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Dulce

No momento em que desembarcamos em Florença, viajamos por mais de treze horas. A viagem até a propriedade Uckermann levou mais uma hora e quinze minutos. Localizada fora de Florença, ficava perto de uma cidade chamada San Gimignano, a casa - ou melhor, a propriedade - apareceu apenas alguns minutos depois de termos saído da estrada rural e atravessado uma grande entrada, onde havia altos portões de ferro abertos e paredes de pedra separando a propriedade da estrada.

Nós nos sentamos na parte de trás de um sedan escuro com vidros fumê. Quando o motorista nos levou, eu olhei para os dragões em cima dos dois pilares. Cada um foi colocado de maneira diferente, um empoleirado sobre seus quadris, e o outro pronto para voar com suas asas largas. Ambos tinham olhos que pareciam me seguir.

Estremeci e olhei para Christopher, que tinha um olhar estranho em seu rosto enquanto observava a paisagem, as grandes colinas, a grama verde, as vastas extensões de terra.

— É lindo.

— Obrigado. — Ele sorriu.

Esse foi talvez o primeiro sorriso autêntico que eu vi dele.

— Chama-se Villa Trevelyan. Está na família Trevelyan, a família da minha mãe, há séculos. Agora pertence a mim.

— Não aos seus irmãos também?

Ele balançou sua cabeça, negando.

— Sempre fica tudo com o primogênito.

— Uau. Isso é loucura. E seus irmãos? E você é um gêmeo, como isso funciona?

— Bruno é meu irmão gêmeo, mas ele nasceu três minutos depois de mim, o que me faz primogênito.

— Diga-me sobre eles. Bruno e Lucas, certo?

— Bruno vive nas proximidades. Você vai encontrá-lo em breve. Tenho certeza de que ele está morrendo de vontade de conhecer a minha futura esposa — ele disse sarcasticamente. — Lucas entrou para o exército quando completou dezoito anos. Não posso culpá-lo. Eu não sei onde ele está. Alguma missão em algum lugar, eu suponho.

— Você não sabe? Isso não te preocupa? — Ele não respondeu minha pergunta, parecendo flutuar nas memórias em vez disso.

— Nascemos na Filadélfia, nossos pais queriam ter certeza de que teríamos a cidadania americana, mas passamos a maior parte do tempo aqui. Com a vinícola em plena produção, era mais fácil.

— Seu inglês é fluente e você não tem sotaque.

— Nós frequentamos escolas internacionais.

— Ah! O nome Uckermann é americano, certo?

— Meu pai é, ou era de origem americana.

— Eu pesquisei sobre seu nome. Significa o que é consagrado à Cristo — eu disse.

Seu rosto endureceu e ele virou-se para mim, sua voz tensa quando ele falou.

— Eu não acredito em Deus, Anastasia. Nenhum Deus permitiria que acontecesse com a minha família o que aconteceu. — Ele olhou pela janela. — Você verá a ironia quando encontrar Bruno.

Alguns momentos depois, a casa ficou à vista. Eu não queria estar afetada, mas antes que eu pudesse me deter, eu emiti um som de espanto total.

— Ela precisa de reparos — disse Christopher. — Meu irmão fechou parte da casa. O dinheiro era.... Escasso enquanto eu estava na prisão.

— Nós voamos de primeira classe — eu lembrei. Ele prosseguiu, ignorando meu comentário.

— Dezessete quartos no total, dos quais apenas seis estão utilizáveis no momento, um pátio interior, uma grande piscina, cozinha reformada, dentre outros.

— Dentre outros? Você presta atenção em tudo isso?

Ele virou para mim.

— Eu presto atenção.

— A casa Uckermann aqui, pelo que eu sei, e porque nunca estive lá, é mais uma fábrica destinada à colheita e produção. Esta é linda. Elegante. É, ou era, a vinha? — Perguntei quando o carro parou diante de uma construção que ficava ao lado de um vasto campo do que parecia ser os restos carbonizados de um vinhedo.

— Sim. — Ele olhou diretamente para mim. — A que meu pai queimou. Para pegar o dinheiro do seguro. Você queria saber o que seu avô tinha a ver com o que aconteceu comigo. É isso. Meu pai devia dinheiro ao seu avô. Ele deu ao meu pai um ultimato, viver ou morrer, e meu pai colocou fogo na propriedade para pagá-lo e salvar sua vida inútil. Isso matou a minha mãe.

Ele falou as palavras rapidamente, como se determinado a não as deixar afetá-lo.

— Ela não deveria estar lá — eu disse. Eu li sobre isso. Que sua mãe voltou para casa com dor de cabeça e foi se deitar. Seu pai não sabia disso.

— Ela estava. Isso é tudo que importa. E se ela não estivesse, a teria matado saber que ele destruiu seu legado. Então, de uma forma ou outra, ela estaria acabada. —Ele respirou fundo e não olhou mais para mim. —E o desgraçado não conseguiu sequer cobrir seus rastros. O seguro não lhe pagou um centavo no final, e ele ainda morreu.

— Por que ele devia dinheiro ao meu avô? Ele dirige o negócio da família, porque ele...

— Quer a verdade, Dulce. Você pode suportar?

— Christopher...

— Quer saber por que seu avô concordou tão facilmente com isto? Entregá-la a mim?

Eu aguentaria essa verdade?

— Eu tenho a prova dos negócios dele com o meu pai, uma em particular. Ele iria preso se isso estivesse em mãos erradas. Ele perderia tudo, e você também.

Deus. Isso não pode ser verdade. Meu avô não era tão mau.

— Eu não acredito em você.

— Fatos são fatos.

— A Vinícola Espinosa é um negócio legítimo. Um sucesso.

— Claro, ele se esconde atrás do legítimo negócio. Sim.

— Christopher...

O carro parou. Christopher abriu a porta e saiu. Meu cérebro girou com os fatos de Christopher, e demorei um minuto para sair do carro. Saí e olhei para a mansão, em seguida entrei na casa, a qual estava preta do fogo.

Era uma enorme construção de dois andares, cujas pedras e a cor se encaixavam perfeitamente na paisagem toscana. Na porta da frente havia três arcos, que foram duplicados no segundo andar. Grandes janelas com ferragens intrincadas estavam abertas em ambos os andares, e eu me perguntava se a casa tinha ar-condicionado.

Christopher foi cumprimentar a mulher mais velha que saiu da casa com um enorme sorriso no rosto, enxugando as mãos no avental. Eu vi como eles se abraçaram, a observei esfregar suas costas, em seguida, ficar segurando suas mãos e o olhando. Ela enxugou os olhos e o soltou. Quando Christopher se virou para mim, eu não perdi o olhar de ternura em seu rosto, mesmo que ele fizesse desaparecer quando ele pôs os olhos em mim.

Em seguida, alguém saiu da casa. Observei quem saiu e retornei o meu olhar para Christopher. Eu sabia que eles eram gêmeos, mas vê-los pessoalmente, era estranho. Incrível, que a natureza pudesse duplicar a vida tão impecavelmente. Bruno era tão alto quanto Christopher, seu cabelo escuro, sua constituição física grande e poderosa. A única diferença entre eles eram os olhos. Bruno parecia gentil.

Ele cumprimentou seu irmão com um aperto de mão, e eu pude ver pelas expressões em ambos os rostos que o relacionamento deles estava tenso. Bruno olhou para mim e sorriu. Os irmãos se aproximaram juntos. Vê-los era quase surreal.

— Você deve ser Dulce.

Sua voz era tão profunda quanto à de Christopher, mas tinha um tom completamente diferente. Eu me perguntava se era assim que Christopher soaria se ele não tivesse passado os últimos anos de sua vida atrás das grades. Se as circunstâncias em sua vida tivessem sido diferentes.

— Eu sou Bruno Uckermann, irmão de Christopher. Bem-vinda a Itália.

Desonroso - Adaptada Vondy (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora