Capítulo 5

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Baixei a cabeça, deixando meu cabelo cobrir um pouco meu rosto, e coloquei a mão sobre a boca. Comecei a soluçar baixinho. Não sou atriz. Mas eu não precisava chorar de verdade. Apenas convencê-lo de que era real.

– Desculpe, mas foi você quem pediu por isso – ele disse, mas eu não ia desistir tão fácil.

Levantei-me rápido e fiquei de costas para o professor. Ainda fungando, fingindo limpar as lágrimas que não vieram, quando na verdade esfregava os olhos e nariz para ficarem mais avermelhados.

– Claro, professor. Eu entendo. – Eu ainda estava de costas. – Não ligue para mim. É só que está tudo dando errado na minha vida e eu não estou dando conta.

Viro-me de frente para ele. Continuo olhando para baixo, mão cruzadas na frente do corpo, pés juntos. Coloco uma mecha de cabelo atrás da orelha para fazer charminho, possibilitando que ele visse meu olhos vermelhos e a maquiagem um pouco borrada.

– Meu pai perdeu o emprego recentemente – comecei –, como ele é idoso então eu tenho que sustentar ele, minha mãe e minhas duas irmãs mais novas, sendo que uma delas é deficiente e precisa de cuidados especiais. Por isso eu ando trabalhando muito. Eles estão no interior, mas eu quero muito oferecer uma vida melhor para eles então não posso desistir da faculdade. – Levantei apenas os olhos para ver como ele estava reagindo. Sua boca estava entreaberta. Seus olhos arredondados transpareciam comoção. Ele estava caindo como um patinho. – Só que o curso de jornalismo é integral, então só posso trabalhar à noite, não estou dormindo muito bem, estou exausta! Por isso estou com nota ruim na maioria das matérias, entende?

Baixei a cabeça novamente. Não queria que ele me visse tentando controlar o riso. Eu devia ao menos levar isso mais a sério. Mas o que posso fazer se momentos sérios me deixam com vontade de rir?

– Você poderia ao menos ter prestado mais atenção nas aulas... – Ele tentava não mostrar piedade, infelizmente para ele, eu já havia percebido sua inocência.

– Eu trabalho, fico cansada de manhã. E, para ser sincera, eu não tenho muito interesse por artes, mas preciso pagar alguma eletiva para me formar. – Sempre jogue uma verdade no meio de mentiras, vai torná-las mais convincentes.

Ele acabou sorrindo com minha sinceridade. Um sorriso caloroso, dessa vez. Sorri tentando imitá-lo, mas eu estava mesmo era com vontade de rir. Baixei os olhos mais uma vez tentando me controlar.

– Tudo bem. Eu não vou diminuir sua nota. – Opa, já estava começando a mudar de opinião. – Também não vou aumentar, pois não seria justo.

Eu não fiz esse teatro todo para sair com a mesma nota!

– Não precisa sentir pena de mim. Se você acha justo diminuir minha nota, então diminua. Eu dou um jeito, durmo menos, ou posso... Não sei! Não sei mais o que fazer. – Caí no choro falso de novo, virando-me de costas para segurar a mentira.

Eu não esperava, porém, que ele se levantasse da cadeira, viesse para minha frente e me desse um abraço apertado.

– Vai ficar tudo bem, Amélia. As coisas parecem difíceis agora, mas tudo vai se resolver.

Ok. Ele estava mais comovido do que achei que ficaria. Imaginei que se sentiria desconfortável e me desse um ponto a mais só para se livrar de mim. Não esperava por isso de jeito nenhum. Também não esperava gostar do cheiro dele. Chegou até a me distrair um pouco.

– Obrigada. Isso significa muito para mim. – Tinha que manter o meu ato.

Ele me solta do abraço, mantendo uma mão em meu ombro, como se eu fosse cair caso ele me soltasse de vez. Se esticou um pouco para pegar minha prova, que ainda estava em cima da sua mesa atrás de mim. Mais uma oportunidade para desfrutar do perfume dele que não desperdicei.

– Talvez eu tenha sido um pouco injusto na correção. – Isso! – Vou levar sua prova para casa para ver se acho algo que possa ser aproveitado, tudo bem?

Tudo ótimo, profê!

– Não precisa... – Meu tom já não era tão insistente.

– Eu vou levar mesmo assim e se você precisar de ajuda, com qualquer coisa, pode contar comigo.

– Obrigada, Renan – agradeci sorridente, limpando uma lágrima inexistente.

– René.

– Como?

– Meu nome é René, não Renan.

– Ah, claro. Eu sei disso! Ando dormindo pouco, sabe como é. – Sorri sem graça. – Bom, eu vou procurar por minha amiga, já que terminamos aqui.

René assentiu e eu saí da sala de aula a passos rápidos. Assim que abri a porta, vi uns cinco colegas de turma esperando para entrar. Deixei a porta aberta para eles.

Não fui em direção a Beatriz imediatamente. Precisava passar no banheiro antes para limpar a maquiagem borrada. Só depois fui até a lanchonete. Ela ainda estava lá com seu refrigerante, essa hora da manhã. A alimentação de Beatriz era a base de fast food. Ela era magra de ruim mesmo.

Beatriz notou meus olhos vermelhos e perguntou o que tinha acontecido. Limitei-me a dizer que havia dado tudo certo. Se ela soubesse da verdade provavelmente sairia correndo para dizer a René que eu sou uma grande mentirosa. Mas, como diz o ditado, no amor e na guerra vale tudo. Se ela acha que pode me fazer ficar seis meses sem sair pra beber, então isto é uma guerra.

Voltamos para a sala de aula e René estava com um novo olhar para mim. Não sei se Beatriz notou. Se notou, ficou quieta. Sabe, mesmo que ele não me dê ponto nenhum, estou muito feliz em não ser mais marcada por ele. Já valeu a pena só por causa disso. Agora eu só tinha que manter o ato até o fim do semestre. Ou seja, evitar falar com ele a qualquer custo. O que poderia dar errado?

Sentei ao lado de Bia, peguei meu tablet, pronta para fazer anotações. Eu nunca anoto em aula nenhuma, exceto quanto é algo realmente importante. Até o fim do semestre, esta aula se encaixava como muito importante na minha agenda.

Então René começou a falar. Parece que meu cérebro já havia associado a voz dele com cochilos no meio da manhã. Sério. Meus olhos estavam insuportavelmente pesados e minha cabeça ficava pendendo, querendo um apoio para descansar. Ridículo. E Beatriz ficava olhando para mim e rindo.

– Parece que alguém vai ficar confinada em casa por um tempo – provocou.

Olhei para ela com meus olhos semicerrados. Eu não ia ficar sem meus momentos de diversão. Saí da sala para pegar um café. Graças a isso, consegui não dormir o resto da aula. O que só serviu para me mostrar o quão por fora do assunto eu estava. Eu não entendia nada, não sabia de quem ele estava falando ou de que momento ou se era pintura ou escultura!

 A sala estava silenciosa, atenta e lotada o que me levou a crer que talvez ele não fosse o um professor tão ruim assim. Mas eu não conseguia me concentrar na aula dele! E isso não era porque eu não havia acompanhado o assunto desde cedo, pois desde o primeiro dia eu tenho essa dificuldade. 

Não gosto de como ele ensina e pronto! Teria que dar um jeito de aprender tudo sozinha. Eu ainda tinha um mês e meio para isso. E eu sou super auto-didata. Vai ser moleza.

Claro que antes eu teria outras coisas para fazer. Precisava finalizar um texto para o dia seguinte e havia uma apresentação para semana que vem que eu ainda não tinha começado. Essas coisas eram mais urgentes.

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Adiando as coisas até o último momento... Isso nunca dá muito certo, né? Hehehe

Meu Bom ProfessorOnde histórias criam vida. Descubra agora