Capítulo 61

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Quando desci, o carro já havia chegado. Duas da manhã. Eu não fazia ideia se ele estava acordado muito menos se queria me ver. Nossa comunicação foi bastante formal e distante esse último mês. Com exceção daquela ligação. Mas e se ele aquilo tivesse bastado para ele seguir em frente? E se ele estivesse com outra mulher?! Acho que não estaria com ele da sexta pro sábado. Seu dia de folga era no domingo apenas. E se eu acordasse os filhos dele e ele me odiasse por isso? Dá um trabalho colocar criança pra dormir. Mas elas têm sono pesado, não é? E se ele tiver sono pesado também e não se levantar para abrir a porta para mim? Por que essas dúvidas só estavam surgindo quando eu já havia saído de casa?! O efeito do álcool devia estar passando. Eu devia ter ficado dormindo. Deveria ter ligado para ele quando acordasse lá pras onze da manhã. Sondaria o que estava acontecendo na vida dele e então tomaria uma decisão.

Sim, era o que eu devia ter feito. Agora, na frente da casa dele, ainda pensei em pedir para o motorista voltar. Mas se eu esperasse até amanhã eu lembraria de todos os motivos que me faziam ter medo.

Paguei o motorista. Toquei na campainha. Ninguém veio. Meu coração começou bater muito rápido. E se ele tivesse saído com outra pessoa?! Poderia ter pedido aos sogros para ficar com as crianças. Toquei novamente, mais de uma vez para ter certeza. Escutei a chave girar na fechadura. Se eu achava que isso ia melhorar minha ansiedade, estava enganada. Meu coração bateu ainda mais rápido. Esqueci de pensar no que eu ia dizer quando a porta abrisse!

– Por que você demorou tanto! – falei assim que vi o rosto amassado de René.

– Lia, são quase três da manhã! – Ele passou a mão no rosto, acho que tentando acordar. – O que você está fazendo aqui?

– Não vai me chamar pra entrar?

– Não, não! Eu passei um mês sem te ver, tentando tirar você do meu sistema. Eu não posso ter uma recaída agora! Então faça a gentileza de voltar para sua casa – René falava o mais alto que podia sussurrando, certamente para não acordar os vizinhos. Não parecia ameaçador assim.

Não sei se eu achava fofo ou estranho ele ter me comparado a uma droga.

– Tá frio aqui fora... – Cruzei meus braços e me encolhi. Estava bem frio mesmo, mas eu estava agasalhada. Era só drama.

René suspirou irritado, mas me deixou entrar.

– Você tem dois minutos para me dizer o que veio fazer aqui a essa hora. – Apesar de suas palavras duras e os braços cruzados, René me parecia muito mais apreensivo do que com raiva. Sua voz suave, quase triste.

– Eu sinto sua falta. Acho que não consigo viver sem você.

– Não seja boba. É claro que consegue.

– Eu sei que consigo! – Revirei os olhos, revoltada com sua falta de romantismo. – Mas estou tento fazer uma declaração! Eu não sei como se faz essas coisas, é minha primeira vez!

Ele colocou a mão na frente do rosto tentando esconder o riso, mas eu vi.

– Não faz isso comigo, Lia. – René parecia bastante angustiado ao mesmo tempo que tentava não sorrir. Eu dei um passo para perto dele. Ele recuou. – Por favor.

– Desculpa por ter aparecido à essa hora – falei tirando minha bolsa e meu casaco, jogando-os no sofá.

– Pelo jeito não pretende ir embora tão cedo – observou, passando a mão pelo cabelo.

– Eu preciso falar contigo.

René me fitou de cima a baixo. Imaginei que estive pensando em jogar a pobre e pequena eu para fora de sua casa. Eu ainda não tinha certeza do que queria dizer. Só podia esperar que as palavras certas saíssem da minha boca. Ele murmurou alguma coisa, virou de costas e começou a andar.

– Onde você vai? – perguntei indo atrás dele.

– Está quente aqui. – Não estava, não. – Preciso esfriar a cabeça.

Chegamos na cozinha. René abriu a geladeira e pegou uma cerveja. Abriu a latinha, e tomou um gole grande.

– Quer uma? – ofereceu.

– Não. – Achei melhor não contaminar meu sangue com álcool agora que estava melhorando. Mas minha garganta estava bastante seca. – Aceito uma água.

René pôs a latinha em cima da mesa e me serviu um copo d'água. Notei que fez questão de não chegar muito perto. Serviu-me com o braço esticado e ainda assim quase tive esticar todo o meu braço para pegar o copo. Seu gesto foi tão exagerado que não pude deixar de rir. Era um riso um tanto nervoso também.

– Eu não vou pular em cima de você, René. Não precisa ter medo – eu disse, mas eu também estava com medo. Tomei um gole d'água para tentar me acalmar.

René deu uma pequeno sorriso e se sentou do outro lado da mesa.

– Estou com medo, sim. Eu não sou forte o suficiente quando se trata de você. – Tomou mais um bocado da cerveja. – Sabe do que é que eu tenho mais medo? É de dormir sentindo seu calor e acordar sozinho e com frio. É humilhante. Eu não quero passar por isso de novo.

– Desculpa. Eu não devia ter feito isso – sentei à mesa também, mas respeitei a distância que ele queria.

– Deixa pra lá. – Sua voz estava mansa, mas seus olhos triste preferiram encarar a latinha que suas mão giravam distraidamente sobre a mesa.

– Eu não posso ser mãe nem esposa...

– Eu já disse que não estou te pedindo isso!

– Não está, mas é isso que você quer! Você quer alguém madura e responsável em quem possa confiar, como sua esposa era! Você vai me comparar a ela, mesmo que não queira. Ela é a única experiência de relacionamento que você teve e foi, pelo que ouvi, perfeito! E eu nunca vou chegar aos pés dela e você tem que entender isso. Eu só tenho vinte e dois anos, ainda nem terminei a faculdade e não vou me casar até ter um bom emprego. Eu não sei cuidar de crianças nem tenho tempo para isso. Você não vai poder contar comigo para quase nada. Mesmo assim, mesmo tendo certeza de que você vai se cansar de mim em pouco tempo – respirei fundo antes de continuar –, eu não quero mais ninguém. Só você. Porra! Há cinco meses atrás eu sequer teria pensado em casamento e olhe para mim agora.

Pronto. Aí estava. Tudo que eu tinha para dizer. Não foi a melhor das declarações, mas era honesta. Isso devia contar para alguma coisa, não? René me olhava com determinação. Ele se inclinou um pouco para frente antes de falar.

– Tudo que eu espero de você, é poder acordar do seu lado. Se não puder ser todas as noites, então que seja de vez em quando. Desde que a gente possa tomar café da manhã juntos e sair pra jantar quando der. Nas férias, quem sabe, passar algumas tardes ociosas e falar sobre vida. E depois... Depois a gente vê – ele deu de ombros.

Olhei no fundos dos seus olhos castanhos e vi refletidos neles o desejo e a tranquilidade que eu também sentia quando estava com ele. Não era exatamente um plano, mas eu sentia que era possível. Havia amor. Então era possível.

Levantei da cadeira e cheguei perto de René. Ele engoliu seco, nervoso. Eu estava um pouco nervosa também, mas tentei não deixar transparecer. Sentei de lado no colo dele. Pus a mão em seu rosto, acariciando de leve. Ele não recuou dessa vez. Então tomei seus lábio com os meus. Foi um beijo suave, saudoso até.

– Posso acordar com você amanhã? – perguntei ainda sentindo os lábios dele contra os meus.

René segurou minha cintura com firmeza e me colocou sentada na mesa, ficando logo em pé, entre as minhas pernas.

– Por favor... – ele sussurrou, em seguida atacou meus lábios em um beijo ansioso.

Enrolei minhas pernas na cintura de René, que facilmente me levantou sem se atrever a separar nosso beijo, e me levou para seu quarto. Nos livramos de nossas roupas rápido. Fazia tanto tempo que não sentíamos o gosto um do outro, ainda assim não houve estranhamento. Nossos corpos, juntinhos, cumprimentaram um ao outro de forma tão natural, parecia que nunca haviam se separado. Toda sua pele nua contra a minha, o quarto quente, sua mão deslizando por minha coxa, nossas línguas brincando... Eu devia estar no paraíso.

Eu não demorei a chegar no ápice do prazer. Dormimos abraçados. Foi o sono mais tranquilo que havia tido há muito tempo.

Meu Bom ProfessorOnde histórias criam vida. Descubra agora