Reunir, Agregar, Extrair e Armazenar

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Um nevoeiro espesso e gélido descera com força turvando ainda mais nossa visão. A falta de luminosidade escondia nas brumas a face já cansada do mestre guerreiro. O dia havia sido longo. As horas de caminhada somadas ao tempo de treinamento resultaram num corpo dolorido e fatigado.

Leo colheu alguns gravetos com os quais acendeu uma fogueira. O fogo dissipou um pouco as trevas e aqueceu a pele já fria e úmida pelo sereno.

Enquanto as chamas bruxuleavam cintilantes continuamos o treinamento evitando tocar no assunto anterior conscientemente a fim de prevenir constrangimentos.

— Pai! — disse assim que uma dúvida surgiu. — Será que eu consigo me conectar ao fogo... digo... ao fogo comum? — perguntei apontando para as labaredas dançantes ao lado.

— Boa pergunta. Bom, isso que você acaba de chamar de fogo comum, na verdade, é a chama laranja — esclareceu. — E sim, é provável que você possa se conectar a ela. A chama vermelha é a mãe de todas as chamas. Todas as chamas se originam dela. Então, é possível que você possa dominar todas as outras — afirmou com segurança.

— E como eu faço? — Quis saber antes de meter a mão no fogo como da última vez.

— Primeiro você precisa estar em modo ON. Depois você deve concentrar o fogo dentro de você na parte do corpo que deseja se conectar fazendo com que as temperaturas sejam equivalentes — explicou.

Sem hesitar, levantei-me e fui até a fogueira. Com o ON conjurado reuni e direcionei as pequenas partículas de fogo em meu corpo até a mão direita que reluziu num brilho vívido em resposta. Uma sensação prazerosa fez meu coração acelerar.

Parei a mão a poucos centímetros da chama laranja com o objetivo de sentir sua temperatura. Olhei para a própria mão e fiquei impressionado. Está muito quente, concluí. Preciso abrandar a temperatura até que ambas estejam iguais.

Continuei por alguns segundos sem aproximar mais a mão, concentrado em todo o processo. Abrupta e inesperadamente as chamas da fogueira foram atraídas, quase que sugadas até a minha mão. Então, eu pude sentir a conexão.

— Eu posso sentir — atestei, logo ao perceber as chamas como uma extensão da minha própria mão.

— Muito bom — disse papai. — Eu não sabia que já conseguia reunir e conjurar o fogo de seu próprio sangue. — A voz revelando certa surpresa.

— Fiz isso contra o Naelin em Anzare — revelei. — Foi meio por instinto, mas o processo foi o mesmo.

Ele gesticulou positivamente com a cabeça.

— Ravel, ainda existe algo importante que você precisa saber — falou chamando a minha atenção. Imediatamente desconectei-me das chamas e tomei assento em sua frente. — Existe um risco muito grande ao se conjurar o fogo de dentro — advertiu e crispou a expressão denotando seriedade. — Ainda que o fogo seja um elemento em abundância em seu sangue, ele também é um componente fundamental deste. Quando você o reúne e conjura, aquelas pequenas partículas que compunham o seu sangue são extraídas. Caso extraia em excesso ou demore para recompô-las, seu corpo responderá...

— Por isso desmaiei logo depois que enfrentei o naelin — compreendi. Papai assentiu em resposta.

— Você precisa descobrir o limite de tempo de sua conjuração para evitar correr riscos — aconselhou. — Naquela oportunidade você desmaiou depois que a batalha fora vencida. Mas e se você desmaiasse antes?

A boca ficou seca de repente com a informação.

— Além do mais — prosseguiu —, conjurar o ON faz com que você consuma dois tipos de energias diferentes — informou e levantou o indicador direito. — Primeiro você consome o seu keer, que como já te informei é a energia da vida. — Levantou o dedo médio também indicando o número dois. — Segundo, você consome a energia da partícula elementar de seu sangue. O uso descuidado e em demasia destas duas fontes de poder pode gerar até mesmo a morte do usuário. Existe uma quantidade finita de energia dentro de cada um de nós. Caso usemos toda essa energia... — deixou a voz silenciar como quem não precisasse concluir.

O Descendente de Anur - Usuário do FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora