A Fuga

405 77 260
                                    

Vote ✡ Vote ✡ Vote

🔛

Pequenas aberturas no alto das paredes deixavam vazar algumas réstias de luz. Eu não sabia que horas eram, se estava cedo ou tarde, só que ainda era dia. Pelos meus cálculos, esse deveria ser o quarto dia desde que havia sido capturado.

Assim que deixei a cela, tive que pensar rápido em como faria para encontrar o meu pai. Eu não conhecia o Castelo de Pedra e isso dificultaria muito a situação. Ele pode estar em uma das celas, arrazoei e avancei trôpego pelo corredor olhando em todas as câmaras observando com cuidado pelas grades. Havia inúmeras delas, quase todas cheias com homens e mulheres. Fiquei surpreso ao ver até mesmo crianças ali. Poucos deles estavam presos por correntes. A maioria estava livre dos cadeados nas mãos e nos pés.

Um odor forte de mijo seco e excremento impregnou-se em minhas narinas deixando-me com náuseas. Imediatamente inibi o olfato e continuei andando, ainda enjoado só pela recordação do mal cheiro.

Ao chegar no final do corredor sem encontrar sequer pista de onde estava o meu pai, uma nota de tristeza assenhoreou-se sobre o meu ânimo deixando-me sem saber o que fazer.

- Garoto - Ouvi uma voz masculina me chamando por trás. Virei-me imediatamente e notei a figura de um homem sem camiseta e com várias cicatrizes estampando o seu corpo. - Me leve com você - disse. - Eu posso ajudar. Sei onde Mainz está.

- E como você sabe que procuro por ele? - questionei, desconfiado.

- Tenho ouvidos treinados e atentos, meu jovem - respondeu. - E a acústica daqui não favorece muito a privacidade, não é mesmo?

Tive que concordar. O local era todo fechado e com paredes grossas garantindo um bom isolamento acústico. O menor dos sons reverberava nas paredes ricocheteando em forma de eco.

Aproximei-me das grades e a figura do homem ficou nítida diante dos meus olhos. Ele tinha pele parda e cabelos castanhos ondulados ocultando-lhe o lado esquerdo da face.

Sem tempo para pensar em uma estratégia melhor, tive que tomar uma decisão rápida. Esse cara deve ser um criminoso perigoso, concluí, olhando para a grossura das correntes que o prendiam. Se isso for verdade então eu sou a única chance que ele tem de sair daqui. Uma dura lembrança bateu em minha consciência deixando-me uma sensação de amargura. Não posso confiar nele, não posso confiar em mais ninguém.

- Vamos garoto - persistiu o homem. - Você me tira daqui e eu te mostro onde está Mainz...

- E como posso crer em sua palavra, nem mesmo sei se você o conhece? - argui analisando se ele de fato poderia cumprir a sua promessa.

- Só alguém que já tenha morrido há cinquenta anos que não sabe quem é a Lâmina Letal...

- E como você sabe onde ele está se você está aqui?

- Por que só existe um lugar seguro em todo esse castelo para trancafiar um manipulador do metal do calibre de Mainz - garantiu. - E eu sei onde é esse lugar.

As respostas do homem realmente demonstravam que ele conhecia o meu pai. Analisei a entrada da cela e notei que ela era trancafiada por um ferrolho e uma grossa trava de aço. O que você está fazendo?, questionei-me ao mesmo tempo em que derretia a fechadura.

Abri a cela sem grandes dificuldades, evitando ao máximo desperdiçar energia. Aproximei-me do homem com bastante cautela. Ele estava com os pés descalços e o corpo desnudo, vestido apenas com uma calça clara que dava no meio de suas canelas. A face expressiva e de linhas fortes voltada para mim com seriedade agora revelava uma cicatriz repuxando sua pele ao lado da boca onde outrora o cabelo escondia. Seus olhos cor de mel se iluminaram ao notar a minha aproximação. Os cabelos oleosos e a aparência maltrapilha eram de dar arrepios. Os lábios secos e feridos denunciavam que ele deveria estar ali há um bom tempo.

O Descendente de Anur - Usuário do FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora