O Curupira insistiu diante da minha evidente hesitação.
E se eu ficar e tanto o Leo como meu pai morrerem?, ponderei, dirigindo o olhar para a floresta de onde vinham os sons da intensa rinha que ecoavam por entre as árvores.
— Eles vão ficar bem — garantiu o pequenino antecipando-me.
— E como você pode ter tanta certeza disso? — rebati, querendo crer na promessa do guardião da floresta.
— Em poucos minutos eles receberão um grande reforço — afirmou gesticulando com as mãozinhas e, ao notar minha feição desconfiada, prosseguiu: — O grandão já abateu os outros invasores. Ele demorou mais do que o esperado, mas está bem e já está à caminho. Eu darei ordens para que ele se junte aos demais na batalha.
Se isso for verdade, então, realmente eu não preciso me preocupar, conclui. Certamente o Mapinguari seria um reforço muito poderoso, que certamente aumentaria consideravelmente as nossas chances.
— Tudo bem — admiti. — Mas como vai contacta-lo? — questionei mostrando firmeza na voz.
— Por que acha que eu sou o Guardião da Floresta? — perguntou com aspecto jactancioso. Cerrei o cenho sem compreender o objetivo da pergunta. — Toda a floresta está sob o meu comando. Aqui, não há nada que eu não possa fazer. — Ele fechou os olhos, espremeu os lábios e arqueou bem as sobrancelhas.
Ainda com expressão altiva, o diminuto ser encheu o peito e soltou o ar controladamente emitindo uma espécie de som parecido com um canto de pássaro com a boca. Em resposta um pequeno vulto escuro saiu por entre as folhas que cobriam o chão e voou até pousar sobre o dedo indicador direito do Curupira que pareceu se comunicar com a ave.
Era um curiango, estava acostumado com esse tipo de pássaro notívago, bastante comum em Anzare. Com penugem pardo-amarelada e as rêmiges pretas trespassadas por linhas brancas, a ave era revestida de uma beleza natural. Vê-la deixou-me impregnado um gosto nostálgico na consciência.
Após alguns segundos o pássaro voou novamente até se ocultar pela mata como quem carregasse fielmente a mensagem de seu amo.
— Está feito — revelou o pequenino num risinho de canto de boca.
Tempos atrás eu riria debochadamente da estranha criatura de pés invertidos, mas depois de ver tudo o que o pequeno ser era capaz, nada mais me impressionava.
Sem mais objeções, o Curupira sentou-se no chão coberto por folhas e fez sinal para que eu fizesse o mesmo. Ainda com revelada desconfiança, fiz conforme solicitara.
Sem rodeios, como de costume, Curupira iniciou a conversa:
— Eu sei que um turbilhão de dúvidas assola sua mente...
— E como você sabe disso? — argui instintivamente, interrompendo-o.
— Se você não me deixar falar vai ser bem difícil — contrapôs fulminando-me com os olhos e espremendo os lábios manifestando reprovação.
Senti-me envergonhado e fiz sinal de desculpas com a mão e pedi para que ele prosseguisse, ao que pareceu concordar de bom grado.
— Como eu ia dizendo... — falou e abriu bem os olhos como quem dissesse: Não me interrompa novamente. — Eu sei que muitas dúvidas te afligem constantemente, mas preciso te dizer que se eu te der as respostas que você tanto procura, mas de modo superficial, isso só aumentaria a sua angústia. Então, vou precisar te contar toda a história — hesitou —, ou, melhor, preciso te contar o necessário para possivelmente evitar uma grande catástrofe. Está bem?
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O Descendente de Anur - Usuário do Fogo
Fantasy#1 Lugar em Fantasia em Os Tops do Ano 2017 Balrók, o Caçador, montado em seu leão de fogo juntamente com mais sete cavaleiros negros invadem o pequeno vilarejo de Nanduque em busca de um grupo de rebeldes fugitivos. Um comerciante local, o tapeceir...