20 - Lorenzo

5 2 0
                                    

Saltei para o terraço e olhei em volta, com a sensação de que estava a ser observado. Mas não ouvi nem vi nada de suspeito e convenci-me de que eram só os nervos a falar mais alto. Eram tantas as coisas más que tinham acontecido nas últimas semanas que quase me sentia paranóico, sempre com medo que algo acontecesse.
Bati duas vezes na porta envidraçada e ouvia-a andar pelo quarto até chegar à porta, abrindo-a. Entrei e, quando ela fechou a porta, fomos sentar-nos na cama dela. Era incrível a vista maravilhosa que se tinha dali para a floresta.

- Consegui entrar no esconderijo dos meus avós – disse ela com um sorriso.

- A sério? E como é que é?

- É incrível – o sorriso dela desvaneceu um pouco – Mas um pouco assustador... todas aquelas armas...

Pousei a minha mão na dela. Armas. Subitamente aquela casa deixou de ser tão confortável como costumava ser.

- Estás a pensar aprender a usar as armas? – perguntei.

A resposta dela foi imediata, como se já tivesse decidido isso há muito – Claro, claro que sim.

Inconscientemente larguei a mão dela. Não tive coragem para a encarar por isso mantive o meu olhar fixo nas árvores cujos ramos balançavam ao sabor do vento.

- O que é que se passa? – perguntou.

- Nada... - respondi, engolindo em seco – Só não me agrada a ideia de teres um monte de armas em casa e de quereres aprender a usá-las.

Senti o olhar dela queimar-me a pele.

- Qual é o mal em eu querer treinar? É para o meu bem, nunca se sabe o que pode acontecer!

- Estás a insinuar que eu te posso fazer mal? – a pergunta saiu-me de repente, sem pensar.

- Não... claro que não – respondeu ela com o olhar brilhante – Mas tu e a tua família não são os únicos vampiros no mundo, e disseste que há lobisomens... e a caçadora que anda por aí...

- Tu não tens de te meter nisto – disse-lhe, ouvindo o coração dela acelerar – Estas guerras não são tuas. Nada te vai acontecer se tiveres cuidado, se não fores sozinha para a floresta... De resto eu posso proteger-te, não tens de andar armada!

- Mas eu não preciso que tu me protejas, tu não podes estar comigo vinte e quatro horas por dia! E estas guerras também são minhas. Isto não é nenhuma fantasia minha, é uma herança de família, os meus pais e os meus irmãos também foram treinados, eu não posso depender só de ti!

Levantei-me, começando a sentir-me demasiado nervoso com aquela discussão. A última coisa que queria era ver a pessoa que eu mais amava no mundo armada. Com armas de prata. Que me podiam matar. Que podiam matar o irmão dela.
Acima de tudo, não a queria ver metida naquela confusão.

- Sim, é uma herança de família, mas não tens de a aceitar. Lá porque o teu avô era um caçador não quer dizer que também o sejas – baixei o tom de voz – Não quer dizer que tenhas de te meter nestes assuntos.

- Eu namoro com um vampiro. Acho que o meu envolvimento nestes assuntos é bem claro.

Suspirei – Desculpa... mas não consigo aceitar essa decisão.

Ao ouvir-me, o olhar dela mudou. Ficou frio, distante. Ela não precisou de dizer nada. Assenti e virei-lhe as costas, abrindo a porta do terraço e saindo para o frio da noite.

a herdeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora