Livro 2 - Capítulo IX

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Trujillo — Outono, Dezembro de 834 d.C.

A gravidez fora relativamente tranquila, desde o início ela percebera que havia duas crianças em seu ventre o que encheu seus dias de alegria, mitigando a dor da saudade que sentia de Juan.

Suleymán era gentil e atencioso e a cercou de cuidados, mas ela logo foi obrigada a deixar de cavalgar e de se exercitar.

Passava a maior parte de seu tempo no jardim interno perdida em suas recordações, ou então lendo algum livro ou pergaminho que Yusuf lhe trazia.

Seu mentor conquistara a confiança do muladi e fora alçado ao cargo de conselheiro. Seu marido cumprira com a palavra e começara os preparativos para uma nova rebelião, para alegria de seu irmão.

Mas Suleymán fora categórico, ele somente se rebelaria após o parto de Jamila. Para justificar o nascimento das crianças antes do tempo, levando-se em conta o casamento dois meses depois do início da gravidez, informara que avisaria a todos que os bebês nasceriam prematuros.

As semanas correram e ela sentiu que a hora se aproximava.

Suleymán a avisara que enviados do rei Afonso estavam vindo para Trujillo, provavelmente com uma nova proposta de aliança, e por isso daria um banquete para disfarçar a presença deles, motivo pelo qual seu irmão Mahmud viera de Mérida e se hospedara no palácio.

— Entre eles estão ambos os filhos do Duque de Luco de Ástures – avisara encarando-a fixamente.

Ela nunca contara quem era o pai das crianças e ele nunca perguntara, embora provavelmente soubesse, não era segredo para ninguém que Juan era dedicado a ela, tendo inclusive juramentado sua espada.

— Minha flor, eu a amo, eu a aceitei quando nenhum outro árabe a aceitaria, seus filhos serão tratados como meus, mas não admitirei ser traído, se isso ocorrer, em nome de Alá, eu juro que matarei o desgraçado, enviarei as crianças para longe daqui e a prenderei dentro dos muros desse palácio até o fim de seus dias – advertira ao perceber o silêncio dela, com um tom de voz neutro.

— Me tomas por uma mulher adúltera, meu marido? Eu fiz os votos sagrados na presença do mulá, jurando por Alá, o misericordioso – respondeu sustentando seu olhar.

Apesar de não amá-lo, apesar de desejar a cada minuto de seu dia estar ao lado de Juan, ela jurara por Alá aceitar Suleymán como marido. Poderia se tornar uma perjura? Amaldiçoar seu nome e de seus filhos com a mácula do adultério? Trair o homem que salvara suas crianças ainda não nascidas da escravidão? E que, apesar de tudo, a aceitara e a honrara casando-se com ela?

Não poderia, sua honra exigia que respeitasse seu marido, por mais que desejasse estar nos braços de Juan, por mais que o amasse de uma forma que nunca amaria mais ninguém. Maktub, pensou consigo mesma, sua sina já estava predestinada a acontecer. Toda sua história com Juan deveria ser exatamente como fora, inclusive sua separação, pois isso já estava escrito.

Ela devia se conformar e reafirmar, perante Alá, a aceitação do seu destino.

— Não, minha esposa – respondera com voz mais suave — Apenas quis adverti-la.

Em seguida ele saíra do quarto deixando– a sozinha com seus pensamentos.

Recordou– se então do dia da cerimônia, o mulá citara um versículo do Alcorão:

— Ó humanos, em verdade, Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em povos e tribos, para reconhecerdes uns aos outros. Sabei que o mais honrado, dentre vós, ante Deus, é o mais temente. Sabei que Deus é Sapientíssimo e está bem inteirado.

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora