Ao sul de Al-Andalus- Verão, Julho de 833 d.C.
O jovem fechou, com cuidado, o pergaminho que estivera traduzindo para um livro. Era um tratado sobre filosofia de um mestre grego chamado Platão.
A maior paixão do jovem era a leitura, quando criança, seu tutor Yusuf, o ensinara a ler e escrever em árabe, além de ensinar-lhe chinês, escandinavo e um pouco de bretão e franco.
Além dele, também tivera vários mestres árabes e estrangeiros, aprendera latim com os padres e hebraico com os judeus. Fora ensinado nos textos do alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos, conhecia os poemas heroicos gregos, embora abominasse o exercício com armas. Amava poemas e poesias e arriscava-se até mesmo a escrever alguns, embora nunca tivesse ousado mostrar a quem quer que fosse, com exceção de sua irmã mais nova, Jamila.
Ela, ao menos, embora preferisse os exercícios de guerra à leitura, apreciava os poemas. Seu irmão mais velho, Mahmud, que não aprendera a ler e escrever, apesar dos esforços de Yusuf, o ofendia às vezes chamando-o de efeminado.
Mas Ibrahim sabia que não era, ele apenas era sensível demais, sua alma ansiava pelo belo e espiritual, às vezes pensava em estudar para ser um mulá, mas seu pai nunca permitiria, por isso se esforçava em aprender medicina, ao menos poderia ser útil ao clã.
Agora ele acompanhava seus irmãos na expedição ao sul de Mérida, seguindo às margens do Rio Guadiana. Mensageiros desesperados procuraram seu pai, pedindo socorro contra bárbaros que subiram o rio em cinco galeras e vinham saqueando as aldeias, incendiando-as, massacrando os homens e escravizando mulheres e crianças.
Jamila comandava uma tropa de cem cavaleiros, todos jovens e fanaticamente devotados a ela, que avançara na vanguarda batendo o terreno, tendo ao seu lado o nobre asturiano de nome Juan, um convidado de seu pai que trouxera uma proposta de apoio para que o clã se rebelasse novamente contra o Emir.
Ibrahim considerava isso uma interferência abominável nos assuntos de Al-Andalus, mas sua opinião raramente era levada em conta. Entretanto, sua opinião sobre o assunto não o impediu de simpatizar com o Juan.
O jovem asturiano parecia apaixonado por sua irmã, tanto que se oferecera para acompanhá-la nessa surtida contra os invasores e ela parecia interessada nele, embora procurasse de todas as formas disfarçar seu sentimento, ciente de que tal relacionamento nunca seria permitido pelo Sheik.
Ibrahim se compadecia dela, ela negava enfaticamente que tivesse qualquer tipo de sentimento por Juan, mas quando ambos estavam conversando seu olhar a denunciava. Graças a Alá, poucos eram os que possuíam a habilidade para perceber o que acontecia com sua irmã, talvez Yusuf desconfiasse, mas ele a amava como uma filha e a protegeria e apoiaria em qualquer circunstância.
Sua mente voltou novamente à situação política, se os reis cristãos convencessem seu pai a se rebelar muito sangue correria.
A última revolta fora quatro anos atrás e, embora tivessem ocorrido apenas algumas escaramuças contra as tropas do Emir, ele morrera de medo, não só de ter que lutar, mas principalmente de envergonhar seu pai e irmão. Mas graças à Mahmud, que estivera ao seu lado no primeiro combate, ele se saíra bem, não matara ninguém, mas lutara com coragem e, na primeira oportunidade, se voluntariou para ajudar os feridos.
Não que fosse covarde, pelo contrário, daria sua vida com prazer pelo pai e irmãos, simplesmente ele amava demais a vida para tirá-la de quem quer que fosse, mesmo sendo a de um inimigo.
Com um suspiro apagou a vela de sebo que estava sobre a mesa e saiu do pequeno aposento em que estava hospedado, em uma casa de alvenaria de dois andares, pertencente ao alcaide local, em uma cidade às margens do rio.
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A GUERREIRA INDOMÁVEL
Roman d'amour"O que acontece quando uma jovem guerreira se vê entre o amor e sua convicção?" Século IX d.C., a península ibérica dominada pelos árabes se vê envolta em fortes tensões sociais. Uma embaixada enviada pelo último rei cristão à Mérida tem o objetivo...