A GUERREIRA INDOMÁVEL

Capítulo 47

Oviedo — Inverno, Janeiro e Fevereiro de 836 d.C.

Juan estava treinando alguns jovens que haviam se reunido ao exército permanente que o rei Afonso estava montando. Ele se casara dois meses antes, e viera para Oviedo atendendo uma convocação do rei vinte dias atrás com a ordem de ficar um mês na capital.

Sua obrigação era treinar os filhos dos fidalgos de Oviedo e das demais cidades enviados para se tornarem cavaleiros. Ele os treinava em um grande pátio no interior do castelo real e dentro de dez dias estaria liberado para voltar para Luco de Ástures e para os braços de sua esposa.

Apesar de suas dúvidas iniciais o casamento era feliz, Madalena além de bela era inteligente e gostava de ler, tanto quanto ele, era atenciosa e gentil, nunca o questionava sobre o passado nem exigia que ele fizesse juras de amor. O pequeno Felipe era uma criança adorável, bem parecida fisicamente com Manoel e com a mesma energia.

Seu relacionamento com o Duque melhora significativamente, embora nunca viessem a ser amigos, seu pai agora o tratava com respeito e conversava sobre os assuntos políticos do reino, tanto que o acompanhara, juntamente com Madalena até a corte, onde foram apresentados formalmente como um casal ao rei Afonso.

Juan estivera fora de Oviedo por uma semana quando levara os aspirantes à cavaleiro para treinarem em meio às montanhas, quando voltara, vinte dias atrás, seu pai levara sua esposa de volta para Luco de Ástures enquanto ele deveria ficar mais quinze dias na capital do reino para somente então retornar para sua terra natal, onde desfrutaria de um mês de licença, para então novamente retornar para a corte, dessa vez com Madalena, seu enteado e seu pai, o qual comprara uma espaçosa residência em uma área em que os fidalgos mais abastados construíam suas moradias, onde todos residiriam.

Era tocante o amor que Dom Iglesias devotava ao neto, um amor que o jovem nunca recebera, mas isso não o incomodava, pois seu pai via na criança o primogênito morto.

Lembrar-se de Manoel o fazia fervilhar de ódio, pois ainda não conseguira se vingar de Jamal, o comandante que traíra o pai de Jamila e depois assassinara seu irmão em um combate na fronteira entre os reinos.

A extinção da Ordem dos Cavaleiros de Compostela também o incomodava, ele desejava ter continuado servindo-a, mas o rei Afonso fora categórico em ordenar sua extinção. Irmão Rodrigo viajara em peregrinação à Jerusalém e depois à Roma e não enviara notícias.

Juan podia antipatizar com o monarca pelo que ele fizera com a Ordem, mas tinha que admitir que o sonho do rei em reconquistar todos os territórios que se encontravam nas mãos dos muçulmanos era digno de sua dedicação e espada, por isso acabara aceitando o convite para se juntar ao exército real.

O amor que sentia por Jamila não diminuíra, mas pelo bem de sua própria alma ele estava disposto a esquecê-la, por isso de dedicava à nova família e ao cargo de oficial do exército real. Ouvira alguns cavaleiros comentando que uma embaixada comandada pelo rebelde Mahmud se encontrara com o rei nos dias em que ele estivera fora treinando os rapazes, mas preferiu não se inteirar do assunto, estava decidido a esquecer do grande amor de sua vida.

Enquanto divagava em seus pensamentos, observando os jovens fidalgos trocando golpes com espadas sem fio, um mensageiro chegou procurando-o.

— Juan Iglesias Martinez Cervantes? – perguntou o homem.

— Sim...

— Trago uma mensagem do padre Paulus – disse estendendo um pergaminho enrolado.

Juan recebeu-o quebrando o lacre de cera, imediatamente reconheceu a letra de seu antigo mentor.

"Juan, meu filho". Queria estar te enviando boas novas, mas temo que essa mensagem só lhe traga dor. A peste34 assolou Luco de Ástures, não poupando homem, mulher ou criança, rico ou pobre, religioso ou pagão. Muitos acreditam que a doença se originou dos vikings que seu pai trouxe de Oviedo como escravos, em todo o caso eles foram os primeiros a morrer. Os sintomas são dores na cabeça e corpo, vômitos, diarreias e uma febre que faz o corpo arder e a vítima delirar, que após alguns dias pode levar a morte.