Cap.26 A realidade

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Tudo naquele castelo era para Obal uma novidade arrepiante. Todos os corredores eram escuros e quase mal-assombrados. As glândulas sudoríparas dos ogros não funcionavam bem, e de certa forma, agradecia por aquilo. Do contrário estaria suando como nunca antes, seja pelo cansaço, seja pela apreensão. Uma porta lhe foi aberta, os metais rangendo, denunciando a idade avançada de todo o lugar. Mas era limpo. Todo o lugar estava impressionante limpo, sem uma teia de aranha à vista em qualquer canto que a sutil luz tocava, quase não se via poeira, mesmo nos cantos mais afastados. A limpeza talvez se devesse ao vazio absurdo do lugar. Ocasionalmente, raras e silenciosas figuras encapuzadas perambulavam pelos corredores, seus passos pouco mais barulhentos que o cair de uma gota em uma poça, o farfalhar de suas túnicas nada mais que um sussurro ao se arrastar no chão.

Lá dentro, duas mulheres conversavam em voz baixa. Uma tinha cabelos vermelhos, olhos azuis sedutores, voz doce e agradável. A segunda tinha cabelos longos, lisos e negros. Seu olhar era frio e implacável por detrás de suas íris negras e, apesar de bonita, era ameaçadora, gerando certo desconforto em tê-la por perto.

A aparência das duas enganava a qualquer um. Suas idades estavam muito além do que aparentavam, e a força, o poder que possuíam, extravasava o de qualquer outro ser mágico que Obal conhecia, exceto talvez por Quetzalcóatl. A idade de Raamá era incerta, estava viva bem antes que se começasse a contar, quando se tornou conhecida em todas as terras. Já Fane era comprovadamente mais velha, pelo menos quinze anos mais velha que Raamá.

A diferença de idades entre Fane e Raamá demonstrava apenas o poder da última. Era mais nova, mas a que comandava, a mulher que detinha o poder real. As mulheres sussurravam algo inaudível.

— Raamá, a bruxa do Pântano Sangrento. Eu, Obal, venho lhe entregar esta joia, como foi solicitado.

As duas continuam sua conversa inaudível para Obal.

— Eu não compreendo praticamente nada do que esta coisa fala... - Fane comenta.

Lembrando-se que não havia um idioma comum falado por todos os povos. A compreensão de Felipe sobre tantos idiomas não se aplica ao resto.

— São pequenos e se parecem com macacos, mas não os menospreze, eles tem grandes capacidades. - Diz Raamá. Apesar do aparente tom divertido, seu comentário foi frio e distante. Para ela, aquele não era um momento para diversão ou brincadeiras.

O ogro se sente desconfortável, sabe que estão conversando sobre sua pessoa.

— Mostre-me a joia. - Raamá solicita, estendendo a mão e falando em ogrune com um sotaque acentuado.

O ogro se prontifica para entregá-la, mas a joia simplesmente flutua até a mão de Raamá, onde paira centímetros acima de sua palma.

— Verdadeira, e de ótima qualidade. - Fane já analisou cada centímetro da pedra com seus olhos imparáveis. 

— De fato. Muito bem, ogro Obal, me trouxe uma joia energizada em perfeito estado. Seus serviços são de grande utilidade, e mesmo que suas intenções não sejam nobres, tem nos ajudado mais do que julguei possível, por isso peço que me perdoe, isso é necessário.

— Apenas fiz o que qualquer líder faria, me esforcei para ajudar meu povo. - O ogro começou com um dos estranhos sorrisos, que logo desapareceu.- Perdoá-la pelo quê?

Sem tempo para perceber o que se passava, Obal sente como se uma parede invisível se moldasse sobre o seu corpo, prendendo-o ali, e nem o maior esforço fazia com que conseguisse se mover. Raamá mantém uma mão estendida, usando uma fração insignificante de seu poder. Fane se aproxima do ogro, e quando já o tem seguro em suas mãos, a bruxa cessa o poder que prendia o ogro no lugar.

Nas Ruínas AntigasOnde histórias criam vida. Descubra agora