Cap.32 Thunderbird

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As encostas da cadeia de morros diminuíram por trás de suas costas, enquanto Felipe tropeçava na escuridão atenuada por uma estranha e fraca coloração azul . O céu do planeta, Vidon, se pudesse confiar no que Hakuja dissera, era iluminado por Virme, o que consequentemente significava pouca luz disponível. Amélia, que nesse momento seria de grande ajuda, havia saltado abaixo do horizonte no momento mais necessário. 

O cavalo fazia tremenda falta, mesmo que fosse um péssimo montador. Mas não poderia torturar o animal com o Laço. A partir do momento que saíram, estavam por conta das capacidades de suas pernas. Sua mente viajava através da passagem, sua imaginação projetava o que estaria se passando no outro mundo onde uma lua negra dominava os céus. Quetzalcóatl teria mordido a isca e abandonado Parvapo à procura de seus inimigos? 

Calebo parece adivinhar os pensamentos de Felipe.

— A serpente maligna virá. Se não morreu, em algum momento surgirá em nossa perseguição. - Disse em completa falta de ar.

Prosseguiram durante algumas horas em um ritmo constante. Não haveria água disponível até que alcançassem o Grande Rio, e Felipe sentia como se um poderoso punho apertasse sua garganta, fazendo de tudo para que o ar não chegasse aos pulmões. Poderia dizer que os mapas mentiam quanto a distância real entre a Cadeia de Morros e o Grande Rio. Os picos que se elevavam acima de trezentos metros já pareciam coisas minúsculas que se arrastavam de forma lânguida até o horizonte quando finalmente puderam distinguir uma súbita e constante interrupção do campo de capim alto que se estendia na região até onde a vista podia alcançar.

Estendendo o olhar de um horizonte ao outro, aquela linha seguia inabalável de leste a oeste. Distraído como estava, tropeçou e caiu. Sua queda ergueu uma lufada de ar como se o próprio  Quetzalcóatl aterrizasse ali. Quando se levantou, tudo estava tão absolutamente escuro que seus pés congelaram. Calebo parou, apreensivo com o súbito silêncio onde antes havia sons de corrida.

— Mestre Felipe? - Perguntou em sussurro. Sequer ousava erguer a voz.

— Tudo escureceu de repente. Eu conseguia ver a linha do rio cortando o campo com aquela iluminação tênue, porém não vejo mais. - O sussurro de Felipe é ainda mais sutil.

— Jamais houve qualquer iluminação tênue, Mestre! Na verdade, me perguntava como conseguia saber o caminho que deveria percorrer. - Estendo os braços e tateando, Calebo encontra a mão de Felipe, e sem qualquer cerimônia se agarra à  ela. Toda luz que o ogro via, provinha de Virme, as estrelas, os vaga-lumes e a vila dos anões, distante no horizonte.

— Tudo bem, tudo bem... Vamos seguir na mesma direção, não há erro. O rio domina de um horizonte ao outro.

Seguiram então como nada houvesse mudado, exceto pelo ritmo que havia diminuído até se transformar em uma caminhada apressada. Caso esperassem, veriam o capim ao redor de onde Felipe caíra murchar rapidamente, dobrar-se sobre si mesmo e afinar, cozido de dentro para fora por uma energia que havia se infiltrado pelo solo.

A alvorada os pegou de surpresa, rasgando o horizonte livre de nuvens em poucos minutos, e logo um sol vermelho e deslumbrante surgiu acima do horizonte. A forte luz acordou O ogro em um instante, mas Felipe continuava dormindo, imerso em um sono tão pesado que o ogro se compadeceu, decidindo aguardar mais uma hora ou duas. As horas matinais ainda não contavam seis, poderiam prosseguir quando contassem oito horas. Os olhos do garoto se moviam por trás das pálpebras, e seus lábios se moviam freneticamente, sem emitir som. 

Levantando-se, chutou as últimas brasas da fogueira que havia feito para ferver a água do rio, na noite anterior. Após alguns instantes com o cenho franzido, jogou um palmo de lama em cima dos carvões, finalmente satisfeito com as finas linhas de fumaça. Agarrou o grande cantil que Felipe surpreendentemente arranjou. Era de couro da melhor qualidade, revestido internamente por metal delicado. Quando o garoto o abriu na noite anterior, Calebo percebeu que estava cheio de uma bebida energética. O que mais o garoto escondia em seu anel interespacial, podia apenas conjecturar, mas logo uma cunha de metal surgiu em sua mão, com restos de alguma carne. Bebeu avidamente até que metade do conteúdo havia desaparecido. O conteúdo nesse momento era puramente água. Com nítida tristeza nos olhos, Felipe sacrificou seus preciosos dois litros de bebida. Observou com pesar a água fervendo na cunha, enquanto sua cabeça ocasionalmente pendia para os lados.

Nas Ruínas AntigasOnde histórias criam vida. Descubra agora