Quarenta e quatro

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Gustavo narrando

Quando a Julia saiu eu nem tive tempo de me levantar do sofá, pois o meu pai veio para a sala louco de raiva. Alexa veio logo depois, me olhando como se pedisse desculpas.

— Você é um irresponsável do caralho! – Ele gritou. – Eu sabia que tinha alguma coisa estranha entre vocês dois, sabia desde quando estávamos em Cabo Frio!

— Adriano, para de gritar. – Alexa repreendeu. – Isso não vai ajudar ou resolver nada.

— Eu tô estressado, Alexa, como eu deveria reagir?! – Se justificou. – Para de defender ele!

— Você sabe que ele não é tão errado assim na história! – Ela rebateu.

— Não tô dizendo que ele tá errado, tô dizendo que ele faz péssimas escolhas! – Esclareceu e se voltou para mim. – Você vai ficar longe da Julia, bem longe. Pode cortar o contato e terminar o que quer que seja o relacionamento de vocês.

— Acho que tu tá pedindo demais, né? – Ironizei.

— Não vem com gracinha, eu sou sei pai e tô dizendo o que é melhor.

— O cuzão do presidente também dizia que queria o melhor pros outros.

— O que o presidente tem a ver, porra?! – Dei de ombros. – Gustavo, eu não tô com paciência pra palhaçada. Eu sei que é difícil pra você, mas tenta ficar longe de problema, só dessa vez.

— A Julia é a parte menos problemática da minha vida, pai.

— ERA a parte menos problemática da sua vida. – Enfatizou. – Vocês já são bem crescidos, vão superar rápido. Adolescente é assim, toda semana se apaixona por alguém diferente.

— Mas com ela não é assim! – Neguei com a cabeça.

— E desde quando você faz questão de mulher? – Cruzou os braços. – Eu quero que esse assunto seja encerrado aqui e agora. – Falou autoritário, para logo depois subir até o seu quarto.

— Por que ele pensa que tem o direito de mandar na vida dos outros?! – Levantei do sofá puto.

— Gustavo, tenta entender. Eu não queria que fosse assim e muito menos o seu pai.

— Então por que tá sendo assim?

— Porque é o que o pai da Julia prefere. Fim de história.

— Ah, pronto, então só importa a opinião daquele arrombado?

— Para de ser incompreensivo! Eu não posso simplesmente ir contra ele e seus conceitos porque vocês querem ficar juntos!

— E já parou pra pensar quais são esses conceitos? – Ela suspirou, com a mão na cintura. – Eu te digo: por que ele deixaria que sua filhinha, com um futuro brilhante, se envolva com um favelado da Pedreira?!

— Não é assim que ele pensa, Gustavo. O Marcelo também cresceu aqui.

— Ah sim, com certeza. Paga de humilde quando quer fazer a média, depois enfia a modéstia no cu.

Revirei os olhos e fui pro meu quarto, mesmo ouvindo ela me chamar. Tirei a roupa e tomei um banho gelado e demorado, pra tirar aquela tensão do corpo. Saí do banho com os cabelos pingando, vesti uma cueca e tentei tirar o excesso de água com a toalha. Peguei meu celular pra falar com o Tulio e vi pela barra de notificação uma mensagem da Julia, mas não tava com cabeça pra falar sobre aquele assunto, então bloqueei a tela e fui vestir uma roupa. Passei desodorante, perfume, peguei dinheiro, chave, celular, e meti o pé pro baile.

Encostei com uns cria que trampa comigo, já encheram o meu copo. Tava tocando um funk estourado nas caixa de som, tinha umas mina loucona dançando perto da gente.

— Que cara de enterro é essa, GC? – O Mineiro abraçou o meu ombro. – Tu tá no baile, porra, curte! – Neguei com a cabeça, sorrindo.

— Sai daí, carai, eu já sei qual é o problema dele! – Junin empurrou o Mineiro e entrou na conversa. – Olha, tamo no harém, escolhe uma e vai pro beco! – Falou apontando pras meninas dançando.

— Que porra de beco?! – Revirei os olhos.

— Você que sabe! – Gritou por cima da música.

Meu pai chegou com a Alexa do lado e o Thiago logo atrás. Virei a cara e vi um cria cheirando loló com a lata na mão, peguei, sacudi, e inalei também. Devolvi pra ele e a gente ficou dividindo, continuei até me sentir mais relaxado. Nesse meio tempo, bebi pra caralho, fumei, misturei os bagulho tudo, mas ainda não conseguia me sentir confortável lá. Não conseguia nem curtir o baile.

Bufei e saí de lá trocando os pés. Olhei para os lados e me meti num beco vazio, só tinha lixo lá e até uma camisinha usada. Sentei no chão, apoiei a cabeça na parede e suspirei. Olhei para o céu, esperando as paredes ao meu redor pararem de girar pra eu poder ir pra casa. Peguei meu celular no bolso e liguei pra minha avó, ela não atendeu de primeira, então tentei de novo.

— Gustavo, tá tudo bem?

— Oi, vó. – Falei com lentidão. – Tá tudo bem sim.

— Aconteceu alguma coisa?

— Não, a senhora tá preocupada por quê?

— Porque são três e meia da manhã, Gustavo. – Suspirou. – Cadê o seu pai?

— Eu sei lá. – Dei risada.

— Ah, que bonito, o que você usou?

— Nada, vó, sou homem de respeito!

— Você tá me preocupando. Vou ligar pro Adriano.

— Não desliga, por favor. – Sussurrei. – Eu bebi. Acho que mais alguma coisa também. Não lembro.

— Tá doido, Gustavo? Perdeu o pouco juízo que tinha, né? Agora eu, de longe, tenho que ficar cuidando de tu.

— Vó! – Choraminguei. – Se eu parar de usar droga vou poder ficar com ela?

— Ela quem, meu filho?

— A Julia! Aquele arrombado fica querendo controlar os outros e... aí depois... tem que se fuder mesmo!

— Gustavo, você tá falando tudo embolado, eu não consigo entender quase nada. Você quer ficar com a Julia?

— É.

— Tá chorando, garoto? – Riu. – Onde você tá?

— Eu não ia machucar ela. – Murmurei. – Você precisa dizer isso pra ele. Eu não ia colocar ela em perigo.

— Eu sei, meu amor.

— Então fala pra ele! Aquele doutorzinho do caralho quer tirar minha morena de mim!

— Tudo bem, eu vou falar com ele, prometo. Mas agora me diz, onde você tá?

— Num beco.

— Que beco?

— Perto do baile. Na frente da farmácia.

— Certo, eu vou mandar alguém ir te buscar, tá?

— Tá bom. – Suspirei.

—  Não sai daí, por favor.

— Tá bom. – Engoli em seco. – Vó, eu não quero ficar sem ela.


e é isso que temos pra hoje.

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