Julia narrando
Minhas férias começaram e eu tava morrendo de tédio. Meus pais trabalhavam o dia todo e eu ficava sozinha em casa, coisa que eu odeio (principalmente porque tô de tpm), então não pensei 2 vezes antes de pegar um Uber e ir pra casa da minha avó. Ela é a melhor companhia possível, mas, quando cheguei, estava de saída. Vovó foi no centro resolver alguns problemas com documentos e toda essa coisa da vida adulta. Eu já devo ter xeretado a casa dela inteira, mas não achei nada interessante, também fiquei desanimada ao encontrar algumas fotos do meu avô. Mandei mensagem pro Thiago me fazer companhia e ele teve a cara de pau de dizer que tava na casa da Camila.
Cansada da solidão e do abandono, calcei meus chinelos e fui andar por aí. No meu primeiro dia aqui, Thiago me mostrou o morro inteiro, e eu tenho boa memória então sabia os melhores lugares pra comprar comida gostosa e os lugares que eu não posso ir. Parecia que todos me conheciam há anos, já que me cumprimentavam e sorriam para mim por onde eu passava. Adoro gente educada e simpática, o que é bem raro no meu condomínio.
Fui direto comprar um açaí, Thiago me disse que era o melhor. Era self service e eu fiz um completíssimo, com leite em pó, leite condensado, paçoca, gotas de chocolate e banana. As moças no caixa cochichavam sobre algo, quando me aproximei, se calaram. Ela pesou meu açaí.
— Nove reais e cinquenta centavos. – Tirei o dinheiro do bolso e lhe entreguei uma nota de 10.
— Tu é neta do Cobra, né? – Perguntou a garota que lhe acompanhava. Custei a lembrar que esse era o vulgo do meu avô por aqui. Logo assenti e dei um breve sorriso.
— Ele era muito amado por aqui. – Disse a moça que me atendeu, me dando os 50 centavos de troco. – Qualquer um da sua família é bem vindo. — Sorriu simpática.
- Obrigada... qual o seu nome?
— Fabiana. Essa curiosa é minha irmã mais nova, Luciana. – Respondeu, a outra sorriu envergonhada e deu um aceno.
— Então, muito prazer. Meu nome é Julia. – Provei do açaí. – Isso aqui é ótimo, pode me esperar voltar mais vezes.
— Vai levar só um? – Riu.
— Sim. – Pensei um pouco. – Na verdade, me dá um pra viagem.
Ela pegou um daqueles do freezer, me deu uma colher, paguei e fui embora, me despedindo das duas. Subi o morro tomando o meu açaí e olhando ao redor pra não me perder em tanto beco. Como última opção, fui pra boca. Os caras que estavam lá na frente me cumprimentaram (e um deles me chamou de princesa, tô me achando). Respondi com um sorriso fechado e a boca cheia de açaí, então entrei mais no beco, vendo uma porta pequena. Entrei sem bater e me deparei com o Gustavo segurando uma arma enorme e mexendo em algo que eu nem queria saber o que era. Ele só notou a minha presença quando fechei a porta atrás de mim. Olhou pra mim rapidamente, depois voltou os olhos pra arma.
— O que você quer? – Perguntou. Observei a salinha, enquanto caminhava até uma cadeira na sua frente.
— Trouxe açaí pra você. – Coloquei a sacola em cima da mesa. Ele me olhou desconfiado. Tirou a tampa do copo, olhou o açaí por cima e cheirou. – Deixa de ser ingrato. Não coloquei nada.
— Aham, sei. – Franziu as sobrancelhas. – E que milagre te fez me dar alguma coisa?
— Eu quis fazer uma caridade, já que você está ocupado com alguma coisa que eu não sei o que é. – Ironizei e continuei comendo meu açaí.
— Porque não é da sua conta. – Falou, mas sem tom de grosseria, apenas sinceridade. – Obrigada, agora vai embora. Boca não é lugar de mulher. – Voltou sua atenção para a arma.

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Marginal
Fiksi Remaja[+16] Julia nasceu em berço de ouro. Literalmente. Filha de um cardiologista e uma nutricionista, nunca precisou chorar por não ter algo. Seu pai, ao contrário, passou anos lutando para ter a fortuna que conseguiu construir. Marcelo nasceu na favela...