Sessenta

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Gustavo narrando

O mau humor não me largava desde a minha última conversa com a Julia, e eu não fazia muita questão de mudar isso. Já foi, a gente virou passado. Cansei de ficar bancando o Romeu, fazendo papel de bonzinho, pra tomar no cu depois. Tô tentando voltar pra minha vida antiga, preciso curtir, recuperar o tempo perdido.

Durante a semana, prometi a mim mesmo que não passaria uma noite sequer em casa, e nem acordaria na minha própria cama. Só falhei na segunda feira, ainda tava meio pra baixo, mas os outros dias passaram como um vulto. Sabrina, Luana, Vitória, Viviane e Beatriz ocuparam as minhas noites. Não foi bom, não parecia certo, mas era a única coisa que me trazia um sentimento de minha-vida-antes-da-Julia, então acho que com o tempo vai melhorar.

No baile de sábado, senti falta do meu pai, do Thiago, da minha família. Mas aquela era minha nova casa e, apesar de tudo, eu tava gostando. Pra aturar o almoço de domingo em família na casa da minha avó, virei a noite bebendo, só saí 6h da manhã e parti pra casa da Mariana. Ela me dava moral, ficou na minha cola demais, era bonita, até me levou uma marmita outro dia, e eu também não tinha nenhuma opção pra me distrair naquele momento, então transamos. Voltei pra casa umas 8h, tomei um banho gelado e fui fazer café bem forte pra recuperar as forças.

Bebi quase um litro de café, meu corpo pediu arrego. A ressaca tava afim de me matar. Comi um misto quente e me esforcei pra ficar acordado até o horário do almoço. Joguei FIFA até cansar, lá pras 11h30min, tomei outro banho gelado e vesti a primeira roupa que encontrei. Sacudi a cabeça pra tirar o excesso de água do cabelo e sequei com a toalha, mas não tava com muita paciência pra arrumar, então só coloquei um boné. Pequei minha corrente, relógio, celular, carteira, revólver, chave e parti pra Pedreira.

Na esquina reconheci o carro do Marcelo, meu tio, possível ex sogro (?), parado na porta da casa da minha avó. Dei um suspiro e decidi enrolar um pouco, comprei um energético no mercado e bebi lentamente enquanto conversava com os crias da boca. Quando a bebida acabou, pensei se deveria comprar outra, mas resolvi que já tinha demorado demais, então fui encarar esse bendito almoço.

Quando abri o portão da minha avó, já pude ouvir as vozes da família barulhenta dentro de casa. Thiago foi o primeiro a me notar, pude ouvi-lo gritar "FINALMENTE" da sala. Ao entrar, soube que todo mundo estava ali, mas não encarei ninguém específico, só dei um boa tarde pra geral. Meus olhos queriam procurar a Júlia pelo cômodo, eu sabia que ela estava ali, e sabia que era ela exalando aquele cheiro de baunilha, mas me contentei em sentar no sofá e conversar com o meu irmão.

— Que cara de defunto é essa, dormiu de noite não? – Ele perguntou.

— Vai encher o saco por isso também?

— Pelo humor, a resposta é não, né?! – Revirou os olhos. – Pensava que sua fase revoltadinho já tinha passado.

Bufei, sem querer mais conversar com ele. Levantei e fui até a cozinha, ouvindo sua risada de deboche. Entrei silenciosamente e toquei de leve o pescoço, da minha avó, fazendo com que ela se assustasse e começasse a me bater com o pano de prato. Dei risada, indo pra geladeira a procura de uma jarra de água.

— No dia que eu infartar com essas brincadeiras você vai se sentir culpado pelo resto da vida! – Reclamou.

— Que isso, vozinha. – Enchi um copo com água. – Só um sustinho de leve não faz mal.

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