Seis

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Julia narrando

Ao voltar pra sala, pude ver Jéssica ainda pegando sua bolsa, prestes a sair. Acompanhei ela até a porta, para ter certeza que ninguém nos ouviria.

Tá tudo bem?

— Sim, não se preocupe. – Respondeu sem me olhar.

Tem certeza?

— Julia, o Gustavo não é um monstro, se é isso o que você tá pensando. Ele só é um pouco explosivo e estressado as vezes, mas nada demais. É a personalidade dele.

—Desde quando tratar alguem mal é traço de personalidade? Levantei as sobrancelhas, surpresa.

— Ele só estava irritado.

— Jéssica, você não precisa se submeter a isso. Existem formas de se demonstrar que ama alguém, mas gritar não é uma delas. – Pude ver que ela parecia pensar no que eu disse. – Cara, você tem que reagir.

— Isso não é da sua conta. – Pôs a mão na maçaneta da porta. – Olha, é melhor pra você não ficar se metendo em nada que envolva o meu namorado, ou vai ter problemas. Não tô falando como uma ameaça, e sim como um aviso.

Logo depois ela abriu a porta e saiu, sem nem se despedir.

Ah, vai se foder sua burra, tava tentando ajudar.

Ao voltar pra sala, ninguém estava mais animado, então fomos dormir. Ficamos eu, Alê e Samira no quarto de hóspedes. Camila dormiu com o Thiago e Tulio foi pro quarto do Gustavo. Dormi na cama de solteiro com Alexandre e Samira ficou no colchão que vinha embaixo da cama. Abracei o travesseiro e não demorei pra dormir, já estava bastante tarde.

Alexandre narrando

Suspirei ao rolar desconfortável na cama. Julia é espaçosa pra caralho, ela não conseguia parar quieta. Bufei e lhe empurrei, fazendo com que ela rolasse na cama e quase caísse em cima da Samira.

Eu estava numa posição ótima pra dormir e já sentia minhas pálpebras pesarem, mas olhei para debaixo da porta e vi um raio de luz. Resolvi deixar pra lá, deveriam ser os pais do Thiago. Mas eu tenho um problema que toda vez que estou quase dormindo, qualquer pequeno acontecimento se torna extremamente interessante e eu não consigo adormecer com isso na cabeça. Grunhi frustrado e me levantei com cuidado pra não acordar as meninas, logo saí do quarto.

A luz que estava acesa era do corredor, caminhei até as escadas e vi que a da cozinha também. Desci com cuidado pra não chamar atenção e, ao chegar lá, espiei por cima do balcão, estranhando não ver ninguém.

— O que cê tá fazendo aqui? – Saltei no lugar e olhei para trás, vendo que Tulio sorria divertido.

— Que porra, você me assustou.

— Desculpa.

— Achei que ninguém tinha me visto descendo as escadas.

— Eu sou bandido. – Revirou os olhos, num tom de brincadeira, indo até o outro lado do balcão e voltando a fazer o que quer que estivesse fazendo antes de eu interromper. – Sabia que tinha alguém vindo desde o momento que você abriu a porta do quarto.

— Você não estuda? – Perguntei me sentando.

— Parei no segundo ano do ensino médio. Foi bem quando comecei a vender droga com o Gustavo. – Fingiu limpar uma lágrima enquanto preparava seu misto.

— Você parou de estudar pra entrar pro crime?! – Arregalei os olhos, um pouco indignado.

— Não é assim. – Encolheu os ombros um pouco sem jeito. – Meu pai é policial, e esse também era o meu sonho antes, mas uma vez fui no trabalho dele e fiquei puto quando vi tanta hipocrisia. A polícia pune pessoas por cometerem atos criminosos, mas na verdade estão fazendo o mesmo. Então eu percebi que, no mundo que a gente vive hoje, não faz muita diferença ser bandido ou policial.

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