Julia narrando
Acordei às nove horas com minha mãe esmurrando a porta. Grunhi e fui abrir pra ela, que me olhou com as mãos na cintura.
— Que droga, Julia, você tinha que atrasar? Anda, vai tomar banho enquanto eu pego algumas roupas suas, vai que a gente resolve dormir por lá...
— Meu pai tá como em relação a isso? – Me dirigi ao banheiro.
— Ah, eu fiz ele aceitar, depois de um pouco de drama. Ele ligou pro seu avô, pediu desculpas, mesmo a contragosto, e disse que não precisava vir nos buscar.
Ri e entrei debaixo do chuveiro frio. RJ tá um calor absurdo, não sei como tô aguentando. Ao sair do banho, escovei os dentes e voltei pro quarto. Tinha uma mochila em cima da minha cama com algumas roupas e peças íntimas. Abri o guarda roupa e peguei um short curto e um cropped preto. Depois de vestida, passei perfume e soltei o cabelo, jogando pro lado. É, não estava tão feia.
Passei base, pó, corretivo, rímel e um gloss rosa bem claro. Não sabia o que calçar, então pus um chinelo simples e coloquei no pulso uma pulseira. Dei mais uma olhada no espelho, ajeitei os cabelos, peguei meu celular e a mochila então saí do quarto. Meu pai já esperava na sala e minha mãe vinha da cozinha com um pedaço de abacaxi pra mim. Comi rápido e fui pro carro com eles.
Demorou um bom tempo pra chegar lá, nossa, meu pai queria se afastar tanto assim?
Não havia nada luxuoso, era mais humilde, e lindo. Havia uma "barreira" e alguns homens com armas que estavam ali reconheceram imediatamente o meu pai e ficaram felizes ao ver ele. O carro foi estacionado na frente de uma casa enorme e chique até demais comparada as demais ali. Desci do carro e acompanhei meus pais até a campanhia. Minha avó veio nos atender com um sorrisão e me abraçou, fiquei toda boba observando tudo com cara de besta. Os moradores dali pareciam tão felizes – e curiosos também, vieram logo olhar pra gente.
Entramos na casa e meu avô estava na sala com um homem alto, musculoso e tatuado. Ele e meu pai se pareciam demais! Os dois foram correndo se abraçar.
— Ju, esse é Adriano, meu irmão. – Meu pai disse. Eu sorri largamente e o abracei.
— Meu nome é Julia. – Falei.
— É ótimo finalmente conhecer a cria do meu irmão. – Ele disse. – Fez uma guria linda hein Marcelo, carai.
Ele tinha um jeito engraçado de falar. Era cheio de palavrões, mas eu gostei. Era igual o...
— O senhor é pai do Thiago? – Não consegui segurar a língua, tive que perguntar.
— Sou. – Respondeu confuso.
— Ela conheceu seu filho no colégio, Adriano. São grudados igual carne e unha. – Minha mãe disse.
— Que coincidência! Vou ligar pra esse moleque agora, ele vai amar saber que tu tá aqui.
Realmente, eu me sentiria bem melhor com o Thiago por perto. Em minutos ele chegou, o abracei brevemente e ficamos sentados na sala ouvindo nossos parentes falando sobre o passado. Eles estavam relembrando cada coisa, meu pai parecia tão feliz, até gíria ele falou, o que é muito raro de se ver.
Depois do almoço, saí com o Thiago pra conhecer a comunidade. Todo mundo ali aparentemente já me conhecia – fofoca, meus amigos, ela tem poder.
Ele me mostrou a boca, o campinho de futebol, o postinho, as escolas, me mostrou o escritório e até sua casa. Todos eram tão educados, eu estava gostando de tudo. Nem o cheiro de cigarro me incomodava.
Thiago me puxou para trás quando um rapaz desgovernado de moto quase me atropelava. Ele era alto e tatuado, tinha olhos... lindos. Muito bonito pra quem quase me matou do coração.
— Foi mal, não te vi. – Sorriu sarcástico pro Thi.
— E esse... é o meu irmão. – Thiago suspirou e sorriu, indo abraçar o outro.
E eu ainda tentando superar o quase atropelamento.
— Quem é essa aí? – Perguntou.
— Essa aí tem nome. – Respondi, levemente ofendida pelo tom dele.
— Calma, foi só modo de dizer. – Revirou os olhos.
— Gustavo, Julia. Julia, Gustavo. – Thiago disse apontando para cada um de nós. – Ah, aliás, ela é nossa prima.
— A patricinha saiu de onde? – Levantou uma sobrancelha me analisando.
Escroto.
— Pra sua informação, eu não sou patricinha nenhuma, acho que não é surdo, pôde ouvir bem seu irmão dizer que meu nome é Julia. – Cruzei os braços irritada.
— Meio marrenta, né. – Ele riu.
— É filha do tio Marcelo, aquele que tava sumido.
— Ah. – Ele voltou a me olhar. – Bonitinha até.
— An?! – Enruguei a testa.
— A gente se vê mais tarde. – Disse e ligou a moto, saindo depressa como um louco.
— Que escroto. – Falei enquanto o via se afastar.
— Ele só é meio brincalhão... quer sorvete? – O Thiago mudou de assunto.
Dei de ombros e seguimos para a sorveteria do outro lado da rua. Pedi de baunilha e ele de morango. Ficamos conversando com a dona da sorveteria, o apelido dela é Su (de Suellen).
Um tempo depois fomos pra casa do meu avô, lá só estava minha mãe e minha avó na cozinha conversando com uma mulher alta, de cabelos negros e longos (ELA ERA MUITO LINDA!!!).
— Aí está ela. Julia, essa é a Alexa, esposa do Adriano. – Minha mãe nos apresentou. Apertei sua mão em forma de cumprimento.
— É um prazer em te conhecer. – Ela disse, abrindo um sorriso.
Ela não é mãe do Thi, é madrasta, mas pelo que eu sei ele a tem como mãe.
— Vocês vão embora amanhã? Mas já? Nem dá pra aproveitar nada. – Alexa falou.
— A Julia tem aula na segunda. – Mamãe disse.
— Que que tem? Só pegar as coisas dela e trazer pra cá. Se ela quiser pode até dormir lá em casa, já que tem amizade com o Thiago, e o Gustavo é meio complicado mas eu sei que vai gostar dela...
— Aquele mal educado? – Soltei repentinamente.
— É, notei que já o conheceu. – Riu.
— Ele quase me atropelou. – Murmurei.
— Ele só tava brincando, pra te dar um susto porque você estava comigo. – Thiago defendeu, dando risada.
Eu estava pronta para revidar e culpá-lo novamente, mas meu celular começou a vibrar, logo pedi licença e fui até a sala para atender.
∆
espero que estejam gostando 💖

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Marginal
Teen Fiction[+16] Julia nasceu em berço de ouro. Literalmente. Filha de um cardiologista e uma nutricionista, nunca precisou chorar por não ter algo. Seu pai, ao contrário, passou anos lutando para ter a fortuna que conseguiu construir. Marcelo nasceu na favela...