Semente

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Os olhos de Levi abriram vagarosamente ao sentir uma luz incomoda se chocar contra eles.

Tentando mover-se para cobrir aquela claridade incomoda o meio demônio notou bandagens em suas mãos e braços e não só isso, pois ao baixar os olhos vislumbrou diversos curativos por todo o seu corpo, ou ao menos a parte visível dele já que a maior parte estava coberta por uma manda bastante quente feita de pelo de carneiro:

- O que...? - Questionou confuso olhando ao redor para tentar recordar algo da noite anterior, notando que a luz que tanto o incomodava pertencia aos raios solares que transpassavam uma janela de madeira aberta a alguns metros de si.

- Está acordado? –uma voz levemente  familiar questionou fazendo-o sobressaltar-se e se por em posição defensiva- Ei... Acalme-se, se fosse fazer-te mal já o teria feito antes. Estiveste bastante vulnerável no chão da minha casa durante toda a noite, percebes? –o jovem riu colocando uma tigela com neve sobre o fogo da lareira e só então a criatura notou o quão agasalhado o menino estava, indicando que acabara de retornar para dentro da pequena cabana- Alias, perdoe-me, mas tu és pesado demais! Não pude carrega-lo para um local mais adequado para o descanso então apenas o rolei para cima deste lençol, o cobri com uma de minhas mantas mais quentes e deixei a lareira arder para ti. Espero que não tenha passado frio, o inverno está bem rigoroso esse ano.

- Minhas roupas... – pronunciou um tanto confuso ao notar que a calça de tecido escuro que normalmente usava não estava em seu corpo, deixando toda a sua intimidade à mostra, protegida de olhos alheios apenas pela manta que ainda o cobria.

- Secando na lareira –apontou o menino de olhos verdes jogando algumas folhas dentro da tigela onde antes havia neve que agora já estava derretida e fumegante- Estavam ensopadas de sangue então as lavei para ti, podes usar uma muda do meu pai enquanto espera que seque... –murmurou concentrado em amassar aquelas ervas junto da agua quente e então deixou a tigela de lado para seguir até um pequeno móvel onde haviam diversos tecidos guardados- aqui está! Vou arrumar-te umas botas – estendeu as peças ao hibrido que aceitou-as receoso.

Uma calça aparentemente quente de tecido escuro e uma camisa clara de tecido mais fino acompanhada de um grosso casaco tão escuro quanto a calça:

- É quente... –Levi murmurou acariciando o tecido antes de vestir- Diferente.

- Não costuma ter roupas quentes? – o jovem questionou estendendo-lhe um par de botas de couro um tanto maior do que seus pés realmente eram.

- Não costumo ter roupas – corrigiu o hibrido.

- Eh?! – os olhos verdes se arregalaram um tanto surpresos- Andavas nu por aí mesmo no inverno?

- Eu não sinto frio ou calor como tu a pesar de conseguir identificar temperaturas, também não costumo ficar próximo de civilizações então não há necessidade de cobrir-me por pudor ou coisa assim – explicou diante da curiosidade do moreno.

- Então qual o motivo das calças?

- Um presente... – disse simples para evitar que o assunto se estendesse. Não queria pensar muito sobre o tema pelas memórias dolorosas que lhe trazia.

A peça havia lhe sido dada por Isabel. A menina havia furtado o objeto para ele dentre os poucos bens do padre que coordenava o orfanato onde ela e Farlan viviam. Segundo ela, deus a perdoaria por esse pequeno delito por haver por trás dele uma boa e legitima causa: Cobrir as genitálias de seu amigo anjo nu e despudorado.

Levi admitia não entender o motivo ou a necessidade da menina e até mesmo Farlan em insistir que se cobrisse, mas acabou tomando por costume manter-se vestido da cintura para baixo, apenas para os deixar mais confortáveis em sua presença. Agora, depois da morte dos dois, a peça que ganhara da pequena ruiva servia-lhe como uma lembrança querida daqueles a quem um dia ousou chamar de amigos e cujo as vidas foram ceifadas cedo demais:

The boy and the demonOnde histórias criam vida. Descubra agora