Que destrói o filho

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Por pouco, os criminosos que ocupavam a reserva não nos flagraram fazendo curativos em nós mesmos. Renie foi rápido e eficiente ao refazer os feitiços de proteção e ocultamento ao nosso redor, numa área minúscula atrás das árvores, do lado de fora do grande muro de pedras.

Um domo protetor circundava a reserva, impedindo que entrássemos nela e alcançássemos as profecias. Renie não tinha nenhum feitiço novo em seus livros que nos ajudasse com isso.

Sentamos dentro da barraca para analisar os mapas e os livros, tentando bolar estratégias de como entrar. A única ideia que me parecia viável era conversar com um deles, dar algo em troca das profecias, mas Renie não achava boa ideia porque toda a Bulgária desse lado do portal pertencia a eles. Eles podiam ter o que quisessem.

Os dias começaram a passar, a preocupação foi nos sufocando aos poucos. Imaginei que seria uma boa ideia nos distrair do problema até estarmos calmos o bastante para pensar numa solução. Então, ficamos bastante tempo nas formas de animagos, praticando a comunicação pela mente. E não, não era simples.

Renie tinha os pensamentos barulhentos e misturados demais, quase coléricos o tempo todo. Precisamos aprender a concentrar nossa mente em pensamentos prioritários, e não podíamos divagar sobre a saudade de um momento íntimo com Draco ou Astlyn sem que o outro soubesse, então esses foram os primeiros tópicos a abandonarem os nossos pensamentos enquanto estávamos perto um do outro.

No dia vinte e um de agosto, Renie entrou na barraca com um cupcake meio rachado nas mãos. Havia metade de uma vela de número 7 enfiada na fenda e apenas o número 1 bruxuelava uma pequena chama. Foi uma comemoração simples, mas me fez muito feliz. Era muito mais do que esperara ter. Tinha passado pela minha cabeça, várias vezes, que talvez eu nem vivesse até os dezessete anos.

Livre do meu rastreador, desfrutei da minha magia tirando as olheiras do meu rosto, dando mais brilho ao meu cabelo. Pintei minhas unhas de verde cintilante e Renie até me paparicou dizendo que a cor ficava muito bem em mim.

Nesse dia, por cima do meu ombro, vi-o deitado com as mãos cruzadas atrás da cabeça, os olhos fechados, a respiração profunda. Ele quase não dormia durante a noite, quando havia silêncio o bastante para as preocupações e a ansiedade gritarem. Eu sabia porque eu enfrentava o mesmo.

Na única vez em que ele tentou adormecer, acordou de madrugada, gritando sobre sereianos e água congelante. Suas cobertas estavam jogadas no chão, seus lábios não tinham cor e o rosto estava verde como o de um doente.

Preparei o mesmo chá que ele fizera para mim, mas usando casca de salgueiro em vez de abrunho, já que sua varinha era feita dessa árvore.

— Tô bem — ele disse e fez um aceno de dispensa quando estendi o copo.

Ele estava abraçado aos joelhos, uma posição de fraqueza em que jamais o tinha visto, e na qual ele nunca teria ficado na frente de alguém. Suas mãos se apertavam uma na outra para conter a tremedeira. Segurei uma delas com um aperto quente. Nossos dedos escorregaram no suor. Ele fechou os olhos e respirou fundo, aceitando o chá. A gola de sua camisa estava molhada. Eu me lembrei que estávamos a apenas alguns quilômetros do Mar Negro, onde ficava Studobrich.

— O que aconteceu com você lá? Na prisão — perguntei.

Depois que falei isso, Renie de repente ficou muito interessado em ocupar sua boca com o chá. Ele afastou o cabelo molhado da testa, encolhendo contra os travesseiros.

— É uma construção de pedra bem grande, no fundo do mar — ele disse para o copo. — Os aurores disseram que um oficial do Ministério ia passar pra me ver na cela e me explicar as acusações, mas... Nunca aconteceu.

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