Deixei meu corpo desabar na cama, enquanto olhava vertiginosamente para o lustre do teto. Os cristais brilhavam com a luz que infiltrava pela janela do quarto e,ali, bem embaixo dele, me pareceu tão frágil, sustentado apenas por um fio. Uma linha tênue entre permanecer no alto, glorioso ao modo em que foi projetado, e cair, se transformando em pedaços ao chão irrecuperáveis. Esse era o nosso plano, e as probabilidades estavam quase todas contra nós.
Adam se jogou ao meu lado, fazendo-me dar pequenos pulos no colchão.
-- O que está fazendo?
-- Observando o lustre -- respondi sem olhá-lo.
-- Acho que o lustre não vai nos dizer como entrar no palácio sem morrermos antes -- ele riu forçadamente.
-- Isso está se tornando mais complicado do que eu esperava. -- resmunguei.
-- Você sabia que não seria fácil -- após ver que eu me manteria em silêncio, ele continuou. -- Bom, o que temos até agora? Vamos pegar um avião comum que vá para a Espanha, assim se torna mais difícil de saberem onde estamos exatamente, já que eu sei que estão monitorando o espaço aéreo de aviões de pequeno porte. Depois vamos falar com a população e...
-- Não, Adam, isso não vai dar certo.
Ele franziu a testa.
-- A ideia foi sua.
-- Estou me referindo ao fato de falar com a população. -- suspirei -- Velásquez tem as armas. E nós teremos apenas o sentimento de revolta do povo. Vai ser um massacre, e eu não quero que nenhuma vida seja perdida em vão.
Adam se virou para mim, apoiando-se no cotovelo.
-- Não será em vão. Se trata de libertar um povo que passou oito anos sofrendo nas mãos de um ditador!
Balancei a cabeça, vendo minhas esperanças escaparem por entre meus dedos.
-- Temos que dar um jeito de entrar no palácio sem que ninguém perceba. Se ao menos eu me lembrasse! Poderia conseguir uma maneira de nos colocar lá.
-- Mia, a culpa não é sua se você perdeu a memória!
-- Se eu não a tivesse perdido já teria arranjado uma solução. -- imitei a sua posição. -- Eu poderia me lembrar de tudo. -- aninhei seu rosto em minha mão -- Eu me lembraria de você...
-- Mia... -- seus olhos brilharam.
-- Fico me perguntando o que aconteceu... Para eu estar assim. -- fechei meus olhos, tentando imaginar o palácio que eu tanto amei quando criança -- Me lembro de algumas coisas... Outras são automáticas, como o idioma. Eu simplesmente sei. Mas o resto é tudo uma névoa. Em todos esses anos eu nunca me importei com o fato de não lembrar de nada até os meus doze anos, e agora me pego pensando em como é o rosto dos meus pais... O som de suas vozes... Não posso acreditar em como aceitei tudo por esse tempo todo.
-- Eu sinto muito.
-- Eles estão mortos, não estão? -- olhei para ele, e vi em seu olhar tudo o que menos queria. Pena. Adam respirou fundo, e aquilo foi o suficiente para eu saber a resposta.
Eu deveria chorar por eles. Porém as minhas lágrimas se recusavam a descer por quem eu mal me lembrava o nome. Eram apenas sombras sem rosto que um dia fizeram parte da minha vida. Percebi naquele momento que Adam era o único que restara da minha família. Apenas ele conhecia os meus segredos tão bem, talvez até mais do que eu. Eu não era mais a Amélia de oito anos atrás, mas também sabia que a Gisele não era uma fachada completamente diferente. Estava me tornando em uma junção das duas, ou então elas eram apenas partes de mim que se mostraram em épocas diferentes, sem terem consciência uma da outra.
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Encontrada
Fanfic"Os livros são tudo o que tenho. É como se, todos os dias, me perguntassem com suas capas brilhantes: 'quem você quer ser hoje? Que mundo quer explorar? '. Os livros me traziam batalhas, romances proibidos, o limite do ser humano. Era muito fácil f...