Capítulo 57 - Eu vou voltar por você

76 8 3
                                    

   "Ave atque vale -- Saudações e adeus."  - Cidade dos Ossos, Cassandra Clare.


  Amo você.

    Essas duas simples palavras martelaram a mente de Kota, e ele xingou o fato de não ter insistido em levar Amélia consigo quando as luzes se pagaram. Ele parou abruptamente, os dedos de apertando mais ao redor do braço da garota ao seu lado.
    Kota ficara extremamente confuso na hora em que Amélia empurrou a menina na direção dele e deu a ela o frasco com o antídoto -- aquele pequeno frasco que Kota sofrera para conseguir, aquela coisa que era sua salvação --, pedindo-lhe que bebesse. A menina parecera assustada o suficiente e concordou sem hesitar, e talvez tenha sido a força de vontade nos olhos opacos de Amélia que o fez concordar também.
    Agora ele estava amargamente arrependido.
    Devon cumpriu o que prometera. Vinte minutos exatos pareceram moleza para Kota, cuja simples tarefa era encontrar a pessoa que ele conhecia tão bem e levá-la de volta aos túneis. Ele só não contava que teria que se desviar de um monte de guardas, entrar furtivamente no salão de baile para que não fosse anunciado ao público e então procurar por Amélia, ao mesmo tempo em que evitava os olhares curiosos dos nobres, que provavelmente o reconheceriam se dessem uma segunda olhada.
    Quando ele finalmente encontrou Amélia encostada em uma coluna afastada, observando as pessoas dançando... Ele precisou de um tempo para se recuperar. Apesar da esperança, a probabilidade de que eles se vissem pessoalmente de novo era tão pequena que ele se esquecera de se preparar para aquele momento. Até mesmo se esquecera do quanto aquela mulher o desestabilizava.
    Ela estava linda, perfeita, estupenda... Mas tão vazia. Kota conseguira ver isso pela inclinação dos ombros, a falsa arrogância no queixo erguido. Aquela não era a sua Gisele. A vontade dele era correr até ela e pegá-la nos braços, mas ao mesmo tempo o corpo dele parecia inerte, os pés recusando-se a mover. Então ele ficara ali, observando-a, até o momento em que arrumou coragem para finalmente chegar até ela.
    E então ele tinha a abandonado de novo.
    Kota grunhiu, tentado a pegar o antídoto das mãos da moça e correr de volta para a princesa.
    Mas você fez uma promessa.
    Xingando novamente, ele levou a mão livre para o cós da calça e sacou a arma. Ele nunca tinha atirado antes, e duvidava que conseguisse fazer algum estrago com o breu tampando a sua visão.
    Por que Velásquez tinha que cortar a porcaria da luz?
    Kota grunhiu e seguiu em frente, trombando em corpos que começavam a ficar desesperados e soltavam exclamações indignadas. Mas a escuridão não durou muito. As luzes voltaram, tênues a princípio, e um forte cheiro se lançou no ar quando pequenas esferas de metal espalhadas por todo o chão começaram a se despedaçar.
    Kota puxou a garota para o lado e para baixo, agachando-se de modo que pudesse protegê-la do que quer que fosse aquilo. Mas as esferas em si eram inofensivas, e o problema, ele percebeu, era o cheiro que se tornou ainda mais insuportável. A garota ao seu lado começou a tossir.
    -- Não consigo ver -- ela sussurrou.
    Kota também não estava tendo muito sucesso. Uma névoa pairou acima deles, impedindo que enxergassem pelo menos dois metros à frente. O homem fez um mapa mental. Se a memória não falhava, teriam que percorrer mais dois corredores até chegar à passagem secreta. Uma parte dele pensou em permanecer ali até a névoa desaparecer, mas ele sabia que só aumentaria as chances de serem pegos.
    Um raio de luz vermelha cortou a névoa e atravessou logo acima da cabeça deles. Kota se encolheu mais um pouco. E então, para aumentar a sorte deles, o raio de luz se tornou cada vez mais forte à medida que um homem se materializou no meio da névoa. A máscara de gás e a grande arma com mira a laser o faziam parecer um personagem de filme de terror, e Kota sentiu Eleonora encolher ao seu lado. Assim que os viu, o homem apontou para trás de si.       -- Tudo bem -- Kota suspirou -- estamos seguros.
    Mas então o soldado ergueu a arma e atirou. Eleonora gritou e escondeu o rosto no ombro de Kota. Quando abriu os olhos, o homem mascarado já não estava mais lá. Kota puxou o braço da garota para que levantasse rápido, e agradeceu a névoa que escondia o corpo caído atrás deles.
    Eles seguiram pelo caminho indicado, mantendo-se perto da parede. A névoa se dissipava à medida em que avançavam, desaparecendo por completo logo que viraram o último corredor. Kota apurou os ouvidos para escutar algo, mas os gritos e os tiros estavam longe deles. Então eles correram o mais depressa que puderam, e o homem tateou a parede até encontrar a porta da passagem.
    -- Siga o túnel até o final -- Ele disse, já empurrando a garota. -- Você vai sair em uma casa abandonada no Centro da cidade.
    Ele não esperou por uma resposta. Já estava fechando a porta quando Eleonora o interrompeu.
    -- O que é isso? -- Perguntou. Na palma da mão aberta estava o pequeno frasco.
    -- O antídoto para o veneno. -- Nesse meio tempo em que estavam tentando chegar à passagem Kota chegou à única conclusão possível para aquela situação bizarra: Eleonora também fora envenenada e Amélia decidira por salvá-la ao invés de si mesma. Ah, aquela garota altruísta! -- Ela quer que você beba.
    Eleonora balançou a cabeça enquanto olhava fixamente para o frasco. E então ela abriu um pequeno sorriso e o estendeu a Kota.
    -- Posso me virar sozinha. Ela precisa disso, ou irá morrer, Príncipe.
    O interior de Kota se contorceu em tristeza.
    -- Eu sei.

EncontradaOnde histórias criam vida. Descubra agora