Capítulo 31 - Doce, doce mundo cruel

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Quinze dias depois...

Eu piscava lentamente, sentindo as pálpebras pesarem. Travei uma batalha com a minha mente, lutando para permanecer acordada. Era como se eu cérebro tivesse sido anestesiado, a minha consciência apagando lentamente. A posição desconfortável em que estava já não me incomodava mais, e a única coisa que denunciava o funcionamento dos meus músculos era a leve dormência que os atingia ao menor movimento.

Acorde.

Um som parecido com um ganido chegou aos meus ouvidos de maneira ensurdecedora, e eu encolhi meus ombros na tentativa de tampá-los. O meu campo visual registrou um borrão, a imagem formando-se como um vulto e, como um bom pregador de peças, o meu cérebro captou o que pareciam ser cabelos avermelhados rebeldes.

Eu estava delirando.

Um toque gélido na minha bochecha fez com que eu estremecesse, e abri meus olhos novamente, encontrando grandes círculos azuis em meio à fraca luz, que me analisavam.

-- Kota... -- tentei dizer. Todavia o que saiu da minha boca foi apenas um sussurro, resultado do frio e o longo tempo sem exercitar as cordas vocais. Ele mexeu nas correntes acima da minha cabeça, me libertando, e logo senti-o me erguer em seus braços. A minha cabeça cai em seu ombro forte em um conforto bem-vindo, e eu respiro o aroma do seu perfume. -- Como me encontrou?

Ele subiu as escadas comigo em seus braços calmamente. Talvez calmo até demais. Olhou para mim apenas por um segundo, tempo em que pude ver seu rosto sério, uma expressão vazia, antes de voltar a prestar atenção no caminho. Antes que pudéssemos deixar as o salão principal do grande castelo e finalmente encontrar a luz, eu fui enviada de volta para a escuridão.

☆☆☆

Acordei com um sobressalto, imediatamente fechando os olhos quando a claridade incidiu fortemente sobre eles. Estava dificil e respirar, eu sentia como se tivesse sido jogada de um lugar muito alto, o impacto tirando todo o ar dos meus pulmões. Quando meus olhos abriram novamente, eu preferi que eles tivessem permanecido fechados.

Focalizei o lugar em que estava, surpreendendo-me quando percebi que era um quarto. A decoração tinha um tom rosa e era repleta de detalhes dourados, familiares para mim, e as memórias voltaram como bombas em minha mente: imprevisíveis e destruidoras. Qualquer que fosse o lugar em que olhava, a lembrança se instalava como se eu estivesse revivendo o momento. Eu me vi em pé na mesa da escrivaninha enquanto o meu irmão estava sentado na beira na enorme cama, a sua risada mal contida abafando os sons da minha interpretação de uma Ópera. James. Na sacada, eu estava sentada no parapeito de mármore ouvi do atentamente as histórias de James, revirando os olhos vez e outra, para depois oferecer um sorriso acolhedor quando ele confessou que não se sentia preparado para governar o país. No pequeno divã do outro lado do quarto, eu ficava deitada de bruços com as pernas balançando no ar, franzindo o cenho ao tentar resolver um problema de analítica.

Fiquei atônita, sem poder fazer qualquer outra coisa que não fosse observar mais uma vez o lugar com os olhos arregalados. Aquele era o meu quarto. Todas as coisas estavam no mesmo lugar em que eu me lembrava, como se eles quisessem preservar a minha memória, ou então apenas o prepararam para a minha volta. De qualquer maneira, Velásquez sabia que eu estaria ali, e ele pretendia me derrubar de várias maneiras possíveis. Estava conseguindo. Como eu havia chegado ali? Estava no calabouço há dias e...

Então eu me lembrei dos seus cabelos avermelhados. Kota esteve lá, por mim. Ele me resgatou, e de alguma forma eu vim parar novamente para as mãos de Velásquez. Estranhei a atitude de Kota, ele estava tão frio, tão distante, como se não fosse realmente ele. Sacudi a cabeça. Ela vinha pregando peças em mim mesma ultimamente, tão reais que poderiam ser verdade. Aquela deveria ser apenas mais uma. Kota nunca me faria algum mal. Esperava que Velásquez não estivesse fazendo isso com ele. É a minha luta. Não dele. Kota não tem que sofrer por isso.

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