Capítulo 40 - Uma atitude inesperada

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Kota

Eu vi.

E preferi nunca ter ligado a televisão naquele momento.

A simples ideia de uma bomba no Centro Comercial de Madrid já é algo capaz de me fazer vacilar, minha mente viajando momentaneamente para as pessoas que estariam no local. Mas saber que ela era um dos alvos fez com que eu fosse apunhalado cem vezes com uma faca de lâmina afiada e grossa, em lugares diferentes para causar mais dor e impacto. Saber disso me destruiu.

Algum ser desprezível, em vez de tentar ajudar, se deu o trabalho de filmar cada segundo, atentando aos detalhes. A filmagem foi feita de um lugar alto, que imaginei ser um prédio, e foi ao ar em um dos jornais poucas horas depois do atentado. Apesar da confusão, não foi difícil distinguir o carro Oficial, com uma montanha de seguranças protegendo um pequeno corpo que eu conhecia tão bem. O suspiro de alívio ficara preso na minha garganta, queimando enquanto era substituído por outro de puro terror, quando vi Gisele sair do carro e correr na direção do restaurante, tentando alcançar alguma coisa. Logo depois disso, a bomba explodira.

E, desde então, não tenho sequer uma notícia ou palavra vindas dela. Já tentei visitá-la no hospital, mas Velásquez soubera bem como fazer a segurança daquele lugar, de forma que não consegui passar da recepção do primeiro andar. Estava virando um mestre na arte da meditação, inspirando e expirando profundamente quando sentia vontade de bater em alguém por me deixar no escuro. Antes, eu poderia recorrer ao Adam, e ele usaria todo o seu poderio de Príncipe de Portugal para conseguir o que queria. Mas agora...

Um beijo estalou contra a minha bochecha, fazendo- me remexer na cadeira para não denunciar que tinha me assustado com aquilo. Apoiei o tablet na mesa e ergui o olhar para Violet, que começara a preparar o seu café da manhã, pegando um pouco de cada coisa deliciosa disposta em cima da mesa.

-- Bom dia, meu amor -- Um sorriso amável surgiu em seu rosto, antes de ela voltar a se concentrar no que estava fazendo. Se não tivesse dito nada, eu provavelmente continuaria as minhas buscas na internet, completamente alheio a sua presença. Nesse momento, uma diferença chamou minha atenção. Analisei o seu corpo de modelo de cima a baixo, reparando que ela não usava as roupas sociais de grife costumeiras, trocando a calça e blusa de seda por um vestido cor de rosa, simples e delicado. As joias exuberantes deram lugar a uma pulseira de ouro e os anéis em sua mão esquerda, solitários. A constatação me fez franzir o cenho.

-- Não vai para a agência? -- questionei.

-- Bobagem. Eles precisam mais de mim do que eu deles. Sou da nobreza, não preciso trabalhar, faço isso apenas por amor à profissão. Além disso, -- ela interrompeu a sua fala para dar uma mordida na melancia. -- Pensei em passar o dia com você. Faz tempo que não temos um momento a sós, nem parece que somos casados.

A risada amarga foi contida a tempo.

-- Não somos casados.

Violet soltou um suspiro, e inclinou-se na minha direção. Suas mãos seguraram a minha em cima da mesa, e seu dedo contornou suavemente a linha ao redor da aliança no meu dedo.

-- Isso significa que você me pertence. -- Ela ergueu a própria mão, mostrando as alianças, uma de casamento, e a outra de noivado. -- E estas aqui servem para lembrar que eu pertenço a você.

Eu observei-a por um bom tempo, sem dizer uma palavra. Aos poucos, a postura de Violet foi esvaindo, e ela curvou um pouco os ombros. Ainda sob o meu olhar, Violet desviou os olhos e tirou uma mecha do cabelo de trás da orelha, tentando esconder o rubor que ardeu em sua face antes que eu pudesse ver. Mas eu vi. E aquela foi a primeira vez que vi Violet Lavinsk ficar envergonhada. Meus pensamentos voaram para Gisele, o modo como ela sempre enrubescia quando eu recitava um poema para ela, ou falava sobre arte. Ela tinha um sorriso incrível, que esticava os seus lábios mesmo quando ela insistia em tentar não fazê-lo.

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