Distorcendo imagens.

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Aviso de conteúdo sensível.

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— Me furaram, senhora. — Heloísa fez beicinho olhando para a câmera e mostrando a picada da agulha, tão pequena que mal dava para ver.

Aurora pendeu a cabeça para o lado, comovida, em seus profundos pensamentos dizia o quanto a menina era inocente.

Havia entrado no mundo das drogas muito cedo, com a promessa de que teria uma boa vida caso fosse vendedora, após se encontrar com a realidade de que nem comida conseguia com o dinheiro que ganhava e ainda com o pouco senso de perigo que tinha, notava que os homens tocavam seu corpo de uma forma que não a agradava, largou essa vida, mas já era tarde demais, pois havia ficado viciada no produto que vendia.

Heloísa passou pouco tempo na escola, a ponto de não terminar nem o ensino fundamental, mal conhecia as letras e as palavras, porém desenrolava do jeito dela. Visto que seria jurada de morte pelos traficantes que eram seus chefes, por causa do medo de que ela explanasse-os, a menina que era inteligente, deixou a antiga cidade que morava. Pediu dinheiro até conseguir comprar uma passagem de ônibus para o mais longe que aquela rodoviária podia levá-la e acabou parando em Olinda, município pequeno de Pernambuco... Mas logo o seu vício a atacou, a necessidade de ter a droga em seu corpo a enlouquecia, a menina chorava gritando em algum canto, cravava as unhas no próprio corpo tentando se impedir de usar de novo e de procurar aquela vida novamente, mas era apenas uma criança, acabou cedendo outra vez.

E foi assim que sua vida na nova cidade começou, dormindo pelos cantos com medo de ser agredida ou aliciada, usada, aos poucos aprendia a como lidar com as situações que o seu cotidiano trazia e também aprendia a se proteger. Seguia com a vida de usuária de drogas, mas não mais como vendedora, e aos poucos ainda que fosse difícil, reduzia o consumo daquela substância no intuito de algum dia parar de vez.

Claramente Aurora não apoiava que a menina seguisse usando, mas chantageá-la e negar comida a moça dizendo que só voltaria a cuidá-la quando ela largasse o vício de vez, só piorava a situação, internar quem não queria ser internado era apenas um gasto de trabalho.
Ainda estava preparando o terreno aos poucos, trazia às vezes o assunto, mas não apertava muito a mente da garota, estava sendo ardilosa e calculista, visto que iria aproveitar da vontade da jovem de largar aquela vida, pois já via que Heloísa começava a tocar naquele assunto sozinha, de pouquinho em pouquinho.
A morena estava esperando para dar a cartada final, para que a menina pedisse que ela a internasse ou a tirasse daquela vida, e então Aurora correría atrás de fazer o que fosse possível ao seu alcance para salvá-la.

— Ô meu anjo, e doeu muito? — Perguntou com a mão no coração pelo carinho que sentia, era absurdo.

— Doeu, mas muito não. — Foi sincera deixando um sorriso, mostrando que estava fazendo um pouco de drama.

— E você se comportou direitinho não é? — Questionou a moça que ficava ainda mais ingênua quando se tratava de situações perigosas. — Não teve chororô, deixou as moças fazerem o trabalho delas, não foi?

— Eu chorei. — Admitiu pensativa. — Mas eu fui obediente, ela colocou a agulha no braço e tirou sangue, muito sangue. Ai depois eu ainda fiquei numa máquina zoadenta sem poder mexer.

— Foi a primeira vez em que fez? — Questionou curiosa, pois Heloísa falava como se tudo fosse novidade, muito surpresa.

— Foi. — Assentiu frenéticamente.

— Então estou orgulhosa de você, obrigada por ter confiado na gente... Você sabe que eu só quero o seu bem. — A menina sorriu outra vez ao saber que estava dando orgulho, era muito bom ter uma figura em que se espelhar, era muito bom ter em quem se confiar e a quem orgulhar, era uma motivação. — Só porque você foi assim... Obediente demais! — Disse pensativa. — Você vai ganhar sobremesa hoje, tá bom? Tu vai dizer pra Juju que eu mandei você escolher qualquer uma das que tem lá no restaurante. — Observou rindo a comemoração da jovem. — E como vão as suas dores?

Bilhetes para Aurora - Lésbico. (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora