Capítulo 39

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Mavi❤️‍🔥

Alguns meses se passaram desde que eu voltei, desde que meu pai e eu discutimos e toda confusão aconteceu. Em meio a tantos ocorridos algumas coisas foram deixadas de lado e uma delas foi o paradeiro da família do Luiz.

É estranho pensar que uma criança, por mais assustada que fosse, não fala nada sobre a família, sobre a mãe ou nome de algum parente ou até mesmo um lugar conhecido próximo da própria casa.

Crianças são observadoras, falantes as vezes. O Luiz era calado, minha mãe fala muito sobre quando ele chegou aqui, quando ela trouxe ele. Mas a adaptação dele foi rápida, ele não é uma criança introvertida ou que se intimida, pelo contrário...Luiz é falante, animado e a vergonha dele só dura até os vinte minutos do primeiro tempo.

Meu pai procurou saber, fuçou até onde deu, mas sinceramente...o que tem pra se descobrir sobre uma criança de onze anos que não tem nem identidade ?

— fala tu, Mavi, tô gato ou não tô ? — olhei pro Luiz que fazia uma pose em frente ao espelho da loja provando um óculos de sol.

Já que não sabíamos muito sobre ele apenas nos conformamos em continuar cuidando dele com amor e carinho. Hoje viemos ao shopping comprar algumas coisas pra ele...eu, ele, minha mãe e Bárbara.

— tá muito metido, isso sim — dei um sorriso pra ele que confirmou.

— AK diz que eu sou o rei delas, menor LZ — soltei uma gargalhada acompanhada dele, em tão pouco tempo já arrumaram até vulgo pra criança.

— Luiz — ouvi minha mãe chamando por ele e desviei o olhar.

Ela segurava uma sacola das lojas de departamento cheia de blusas, calças e bermudas. Bárbara estava mais no fundo na seção infantil olhando mil e um bodys neutros já que não descobrimos o sexo ainda.

— eu preciso que você prove essas camisas, e uma ou duas bermudas de tamanhos diferentes e me diga qual fica melhor pra pegar outros modelos, firmeza ? — ele assentiu e bateu na mão dela assim que ela estendeu a mão pra ele e foi até o provador.

Eu fico feliz por ela e meu pai se darem tão bem com o Luiz, a real é que eles sempre quiseram mais um filho e infelizmente ainda não tiveram. Meu pai fica besta com ele, empina pipa nas lajes e ensina ele a jogar videogame como se a vida dele dependesse daquilo.

— seu pai acha que ele está mentindo sobre o nome — ergui minha cabeça ouvindo sua voz e olhando em seus olhos — não queria, mas me sinto levemente decepcionada — porra...

— mãe, temos que ser pacientes. Luiz ou seja lá qual for o nome, não muda a criança que ele é...não sabemos pelo que ele passou ou pelo que passava, mas ele tá tentando sobreviver e ele só tem onze anos.

— eu sei, mas queria que ele se abrisse...conversasse um pouco, faz poucos meses mas eu já me acostumei tanto com ele por perto — ouvi sua voz vacilar, o olhar marejando — e se ele tiver que ir embora ? — levantei do puf acolchoado da loja e me aproximei rodeando seu pescoço, minha mãe era poucos centímetros mais baixa que eu.

Não posso usar palavras que confortem ela porque ele pode realmente ir embora a qualquer momento, não sabemos se os pais estão procurando por ele...mas e se estiverem ? Não podemos bater o pé e dizer que ele vai ficar.

— por que a tia tá chorando ? — ouvi a voz chorosa da Bárbara ao nosso lado e dei um breve sorriso...hormônios.

......

Sacolas, sacolas e mais sacolas...esse é o resultado de uma tarde no shopping com três mulheres. Luiz estava bobo com tanta coisa, sempre muito envergonhado quando descobria que era algo pra ele, mas também muito agradecido e todas as vezes abraçava minha mãe dizendo um "obrigada, tia Celinha". Eu via os olhos dela brilhar e isso mexia comigo, tinha medo dela se apegar de maneira que não conseguisse deixá-lo ir depois.

— sente o bit — ele disse no banco de trás enquanto balançava os ombros.

— meu Deus, o que aqueles homens fizeram com você — Bárbara riu no banco de trás encarando a dancinha do Luiz.

Vi a expressão do Luiz mudar quando nos aproximamos do semáforo, ele parecia preocupado e desesperado. Esse lugar, pelas descrições da minha mãe, foi onde ela encontrou o Luiz.

— tia Celinha, por que parou aqui ? — ele perguntou pra minha mãe que estava atenta ao farol.

— o sinal tá vermelho, tá vendo lá ? — perguntou apontando pra luz vermelha — a tia já te explicou, verde anda, amarelo diminui e vermelho para — ela explicou com toda a calma do mundo.

Segui o olhar do Luiz até um casal parado na calçada do outro lado da rua, seus olhos gritavam pedindo socorro. Rapidamente peguei meu celular e bati uma foto do casal, tem algo errado com o Luiz.

O casal brigava, o homem apontando o dedo na cara dela e ela acuada, totalmente vulnerável e menor do que ele. Luiz grudou na janela observando a discussão e quando o homem levantou a mão desferindo um tapa no rosto da mulher ele fechou os olhos deixando algumas lágrimas caírem do seu rosto, ele tampou a boca e acredito que tentava evitar o choro.

Minha mãe olhou pelo retrovisor assim que o primeiro soluço saiu dos seus lábios atraindo tanto seu olhar como da Bárbara.

Entre A Paz E O Perigo [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora